O inciso XIV do artigo 6º da Lei nº 7.713/1988 consagra o direito à isenção do Imposto de Renda aos contribuintes acometidos pela síndrome da imunodeficiência adquirida — AIDS (Acquired Immunodeficiency Syndrome) sobre proventos de aposentadoria ou pensão por morte. Trata-se de medida de proteção ao cidadão diagnosticado com moléstia grave, em consonância com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.

Homem preocupado
Mesmo na fase assintomática, o portador do HIV tem direito à isenção do Imposto de Renda. A dignidade da pessoa humana deve prevalecer sobre interpretações restritivas da legislação. (Imagem: Freepik)

A infecção pelo vírus HIV, seja do tipo 1 ou 2, marca o início de uma trajetória que pode incluir sintomas agudos, uma fase prolongada de latência assintomática e, em estágios mais avançados, a manifestação clínica da AIDS propriamente dita. É comum a classificação dessa evolução em diferentes categorias, conforme a gravidade e a presença de sintomas.

Apesar disso, muitas fontes pagadoras — notadamente entes públicos das esferas federal, estadual e municipal — recusam administrativamente o reconhecimento da isenção de imposto de renda enquanto o contribuinte se encontra na fase assintomática, sob o argumento de que soropositividade não se equipara à doença efetivamente declarada.

Tal interpretação, porém, ignora o contexto histórico da norma. Em 1988, quando editada a Lei 7.713, a distinção técnica entre HIV e AIDS ainda não era amplamente consolidada, e os diversos termos então utilizados — HIV, AIDS, SIDA, HTLV-III, entre outros — eram empregados de forma quase intercambiável. Apenas com o avanço da medicina é que se passou a diferenciar com maior rigor a infecção do vírus e o quadro clínico instalado.

Mais do que uma distinção terminológica, importa reconhecer que o diagnóstico de HIV impacta intensamente a vida do indivíduo. Desde o início, impõe-se uma rotina de uso contínuo de medicamentos potentes, acompanhamento médico especializado, adoção de medidas preventivas e enfrentamento de barreiras emocionais, sociais e laborais. A ausência de sintomas visíveis não significa ausência de sofrimento — nem tampouco de risco.

O Superior Tribunal de Justiça, sensível a essa realidade, tem reiterado que a presença da doença grave, e não apenas a manifestação sintomática, é suficiente para ensejar a isenção tributária. Tal entendimento já se consolidou em relação à neoplasia maligna, à cardiopatia e nefropatia graves, e deve ser igualmente aplicado aos portadores do HIV.

Nas palavras do STJ:

“Não obstante o recorrido não apresente mais os sintomas por doença constante no rol do art. 6º, inc. XIV da Lei 7.713/88, tem direito à isenção do imposto de renda, eis que a enfermidade que o acometeu — HIV — é passível de recidiva, não sendo possível afirmar sua cura definitiva.”
(REsp 1.852.474/RS, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 19.02.2020)

Ainda que a jurisprudência superior esteja firmada em sentido favorável ao contribuinte, é prudente alertar que tribunais de segunda instância — tanto regionais quanto estaduais — por vezes adotam posicionamentos mais restritivos, especialmente quando ausentes sintomas aparentes. Por esse motivo, recomenda-se evitar os Juizados Especiais, cuja via recursal é limitada, e optar pela Justiça Federal comum, permitindo o acesso às instâncias superiores.

O debate ultrapassa a frieza dos critérios médicos ou fiscais: trata-se, em última análise, de reconhecer a vulnerabilidade de quem já carrega o peso de um diagnóstico grave e irreversível. O direito à isenção, nesse contexto, é uma expressão de justiça material e de respeito à dignidade humana.

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