Para quem ainda não escolheu seu espetáculo da Mostra 2015, Silêncio! – ainda hoje no Teatro da Reitoria, às 21 horas – tem minha recomendação. Principalmente para grande parte do público curitibano, desacostumado a ver nas produções locais espetáculos realistas a partir de enredos lineares à base de bom texto e de boa interpretação.
Explico: nosso teatro, quase sempre admirado quando excursiona por outras capitais, geralmente opta por textos originais do grupo ou da direção (quando não, adaptados) e uma concepção cênica bastante presente e que dialoga com o discurso textual – muitas vezes não linear – utilizando-se, quase sempre, de investigações estéticas de cenário, iluminação, sonoplastia… Em Silêncio!, a direção e a concepção cênica pouco aparecem, estando a serviço do texto e da atuação.
O excelente texto de Renata Mizrahi (que o dirige com Priscila Vidca) mostra uma família judaica. A convite de uma das filhas, Débora, todos vem celebrar os 50 anos de sua mãe – Regina – em dia deShabat. Débora vai aproveitar e apresentar aos avós seu namorado. Outro assunto com que todos estão curiosos é um livro que o avô, David, resolveu escrever depois de velho, ajudado pela neta Clara – tida pela avó como “ovelha negra”. Para a jovem Débora, tudo transcorrerá de forma especial porque éShabat – dia sagrado de recolhimento e paz.
A partir do diálogo leve e bem humorado entre avó dominadora bem-falante e neta educada, vão aos poucos se revelando os conflitos familiares, à chegada de cada um dos convidados. A irmã deslocada, o pai hipócrita e egoísta e a mãe depressiva. As relações são tensas e as alianças, delicadas. De conflito a conflito, revela-se ora um personagem ora outro até, num súbito, o até então calado e alcoolizado avô David gritar seu segredo, quase ao final. Aqui, a obra explode, se abre, se revela universal: o segredo, o preconceito, o silêncio. E a destruição causada pela revelação; e a afirmação da vida, e todo o mais.
O leitor não deve estar entendendo muita coisa. Mas não posso contar o segredo de David, me perdoe.
Usando de cenário simples e sintético, de iluminação realista que pontua momentos cômicos e dramáticos, abrindo mão de recursos de sonoplastia, a direção está a serviço do texto e da atuação naturalista para revelar as sutilezas dos personagens e de suas relações. Aparece em poucos momentos, como na cena (em recorte quase cinematográfico) quando a mãe aniversariante, de costas para a plateia, prova um chapéu: a reação dos familiares, todos de frente para o público, é reveladora. Aparece, também, no momento final da peça: um corte seco, preciso, marcante.
As atuações precisas são resultado de estudo minucioso, desde a caracterização física. As composições e movimentações mais “teatrais” (na falta de melhor termo) do pai e da filha “rebelde” destoam do conjunto, causando um leve estranhamento. Embora haja um equilíbrio nas interpretações, não há como não destacar Suzana Faini no papel da avó.
Pode-se questionar a presença de Silêncio! em um Festival que, em princípio e pelo seu histórico, deveria apresentar temáticas e tendências estéticas inovadoras. Mas é um exemplo de espetáculo sensível, inteligente e, sobretudo, popular.
Por hoje é isso. Se tem dúvidas e curiosidades sobre Teatro, atuação ao vivo e para câmera, clown, expressão, locução, oratória e bichos semelhantes, falem comigo. Se não souber, indico quem saiba. Me procurem no Facebook!