Aos 11 anos, enquanto brincava em uma pracinha de Porto Alegre, sua cidade natal, Daiane dos Santos foi parada por uma pessoa sugerindo que ela começasse a treinar ginástica. Aquele momento tão simples foi o exato instante em que vida da gaúcha tomou outro rumo: foi o primeiro passo — ou salto, com o perdão do trocadilho — para sua carreira tão consolidada e premiada na ginástica artística brasileira.
Aos 12 anos, já era uma atleta de alto rendimento e participava de campeonatos estaduais e brasileiros. Aos 13 entrou para o elenco da seleção brasileira. “Minha carreira foi diferente da convencional, não tinha essa ambição no início e comecei tarde”, analisa. “Foi realmente muito rápido, em sete anos eu era campeã do mundo.”
Aos 20, no Campeonato Mundial realizado em Anaheim, na Califórnia, chegou à final do solo e chocou o país ao realizar o duplo twist carpado — um salto inédito que, após a competição, foi batizado pela federação internacional em sua homenagem: o “Dos Santos”. “Como comecei mais tarde, não tinha muito tempo. Teve que ser tudo compacto (risos).”
“O esporte é para quem ama, para quem quer praticar, independente da região que nasceu, da cor da pele, da renda.” — Daiane dos Santos
Nem sempre seu talento foi respeitado. Voltando alguns anos, quando começou a treinar em um clube alemão do Rio Grande do Sul, deparou-se com o racismo. “Negro ainda sofre preconceito. A gente aprende isso muito novinho, na escola, em alguns locais onde a gente não se sente querido”, relembra.
Em sua casa, o diálogo sempre foi aberto. Desde cedo, discutia todas as questões com seus pais, que ainda reforçavam a autoestima e confiança para enfrentar as dificuldades. “Eles diziam que éramos lindas, que nosso cabelo era lindo”, conta Daiane. “Essas conversas precisam acontecer com os jovens para preparar eles para o futuro, para que elas compreendam que o mundo lá fora nem sempre é tão bonito quanto é na nossa casa.”
Brasileirinhos
A música que a levou a ser a primeira brasileira campeã mundial no esporte batiza outro evento importante em sua trajetória: o projeto Brasileirinhos. Idealizado pela ginasta, o projeto possibilita, desde 2016, o contato de crianças com condições financeiras limitadas com a ginástica artística. O polo oficial fica na comunidade de Paraisópolis, na capital paulista. “O esporte é para quem ama, para quem quer praticar, independente da região que nasceu, da cor da pele, da renda”, defende Daiane.
Estar na posição de influenciadora e modelo para tantas outras meninas que sonham com a ginástica é uma das alegrias de Daiane: “é como se fosse um legado”. “A ideia é abrir esse caminho para crianças que têm talento, mas não têm oportunidade de entrar em grandes clubes.” Aí está a grande atuação dos projetos sociais: “diminuir esse buraco que ficou de inserção”.
Além de Daiane dos Santos, conheça os outros personagens da matéria de capa “O despertar do século”:
- Introdução: o despertar do século: como o racismo nasceu e se perpetuou por tantos séculos
- O império Tuttan: Luciana Tavares e Rodrigo Nick, personagens da capa
- Música, costura e negritude: Marcos Neguers
- Na luta, com amor: Cassia Damasceno
*Matéria originalmente publicada na edição 227 da revista TOPVIEW.
O post Um salto para a transformação: conheça a história de Daiane dos Santos apareceu primeiro em TOPVIEW.
