Curitiba - Uma história que não cabe em arquibancadas abandonadas e em um gramado transformado em matagal. O gigante de concreto sonolento desde 2007 guarda, por trás de suas paredes e muros pichados e castigados pelo tempo, histórias emblemáticas e áureas de um tempo distante do futebol paranaense. Os contos de um estádio que, atualmente, se mantém vivo pelo imaginário do povo: o Pinheirão.

Planejado em 1948 por Moysés Lupion, à época governador do Paraná, mas inaugurado apenas em 1985, o Pinheirão foi a casa dos três grandes clubes da capital: Athletico, Coritiba e Paraná Clube. Também teve a honra de receber partidas da seleção brasileira. Entre amistosos e Eliminatórias, o time canarinho atuou no estádio em quatro oportunidades.
Em 22 anos recebendo jogos oficiais, o Pinheirão viu títulos e marcos históricos do futebol paranaense. Dos três times curitibanos, foram o Furacão, mas especialmente o Tricolor que mais tiveram glórias no local. Ainda sim, o Coxa também conquistou uma taça marcante no Pinheirão: a do Paranaense de 1999.

Entre relatos, causos e memórias, a reportagem do RIC.com.br conversou com personagens que ajudaram a escrever as páginas do Pinheirão que, no próximo dia 15 de junho, completa 40 anos de história.
Pinheirão e o Paraná Clube: o primeiro casamento de sucesso
O então recém fundado Paraná Clube foi o primeiro time a ter uma relação de amor com o Pinheirão. Mesmo que tivesse a figura da Vila Capanema, o Tricolor utilizou o estádio em inúmeras oportunidades. Dos cinco títulos estaduais conquistados na década de 1990, dois foram no Pinheirão (1994 e 1995).
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A conquista de 1995, aliás, tem sabor especial para um dos jogadores daquele elenco. O zagueiro Ageu afirma que aquela decisão de torneio contra o Coritiba foi o jogo mais marcante que fez pelo local.
“A maior partida foi no tricampeonato paranaense. Vencemos o Coritiba por 1×0, com um gol do Denílson. Era um dos grandes grupos da história do Paraná e foi especial porque esse jogo foi no domingo e eu me casei no sábado. Então comemorei em dobro (risos)”, recordou ele.
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Ageu foi direto ao ser questionado sobre o que diferenciava o Pinheirão de outros estádios. Para ele, a atmosfera, que permitia uma maior força das arquibancadas, marcou uma geração de paranistas.

“Quando a gente ia lá, especialmente depois da inauguração, havia um grito maior por parte das arquibancadas. Dentro da passagem pelo Pinheirão, sempre tivemos um retrospecto positivo. Ficou marcado na história do clube”, finalizou.
Todavia, nos anos 2000, o Tricolor também fez grandes partidas no local. Goleadas sobre Flamengo e Fluminense, bem como o título estadual de 2006, contra a ADAP, findaram um casamento quase perfeito.
Da Baixada ao Pinheirão: a casa do Athletico antes da Arena
Era difícil, nos anos 1990, imaginar o Athletico atuando por outro local que não fosse o estádio da Baixada. Batizada de Arena apenas em 1999, o Furacão, porém, precisou encontrar um palco para mandar suas partidas durante a histórica reforma encabeçada pelo presidente Mario Celso Petraglia.
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Em uma década difícil, com direito a rebaixamento para a Série B do Brasileirão, o Rubro-Negro enfrentava também um jejum de oito anos sem títulos estaduais. O peso, acumulado desde 1990 (ano da última taça), bateu forte em 1998. Sob o comando do técnico Abel Braga, o Athletico disputou a decisão contra o Coritiba.
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A série de três jogos contra o arquirrival é lembrada com carinho por Paulo Miranda, ex-jogador e diretor do Furacão. Após empate em 1×1 no Couto Pereira e uma goleada por 4 x 1 no Pinheirão, o terceiro jogo reservava ingredientes especiais. Alguns deles, históricos.

“Aquela final teve tudo que um grande clássico precisava, emoção, superação e atuações memoráveis. O Nélio marcou um gol olímpico, Luizinho Netto fez um golaço de falta, eu mesmo joguei machucado e entrei disposto a dar o meu máximo. O Pinheirão foi palco e por tudo que aconteceu naquele dia, ele se tornou ainda mais marcante na minha história. Sempre digo que aquele time de 1998 foi um divisor de águas”, afirmou ele.
Fim de jejum e consagração de ídolos imortais: Coritiba tem título especial no Pinheirão
O Coritiba também tem a sua história de sucesso com o Pinheirão. Ainda que sempre tivesse o Couto Pereira à sua disposição, o Coxa utilizou o local em diversas oportunidades. Em 1999, uma taça especial foi conquistada no local: a de campeão paranaense.
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Carrasco em 1998 pelo Athletico, o técnico Abel Braga, agora, trabalhava no Alviverde. Naquele ano, o Coxa chegou na decisão contra o Paraná Clube embalado por tirar justamente o Furacão nas semifinais. Em uma série de três partidas, o Coxa contou com o brilho dos falecidos Cléber e Reginaldo Araújo para bater o Tricolor e ser campeão.

Apesar de ter ajudado o Coritiba a quebrar um jejum de dez anos sem títulos paranaenses (a última conquista tinha sido em 1989), Abel Braga afirmou que é impossível escolher o maior e melhor momento que viveu no futebol paranaense.
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Com rápida passagem também pelo Paraná Clube, ele contou como um convite para treinar o Vasco inviabilizou a realização de um projeto de vida.
Qualquer título vale e, para mim, o Pinheirão sempre deu sorte. Não posso dar uma importância maior. Qualquer título vale a pena, ainda mais para um treinador jovem, como eu era na época. Para quem comanda, é extremamente importante. De forma peculiar, por exemplo, quando eu cheguei no Athletico, já não tinha mais a Baixada (obras para transformar em arena). Quando fui pro Coritiba, tinha o peso da falta de títulos. Eu amo a cidade de Curitiba. Na época, não pensava mais em morar em outra cidade. Eu sou carioca e amo frio. Eu pensei em morar aqui, mas aí houve a possibilidade de eu ir pro Vasco em 2000 e depois pro Olympique de Marselha, na França.
De luxo ao lixo: Após glórias, Pinheirão está abandonado
Em 2006 o Pinheirão viveu, com o Paraná Clube, seu último momento de glória. Foi lá que o Tricolor da Vila conquistou o seu sétimo (e, até aqui, último título de elite do futebol paranaense) após empate em 1×1 com a ADAP, de Campo Mourão. Mas, ainda em 2006, após a reforma da Vila Capanema, o Tricolor deixou o estádio localizado no bairro do Tarumã.
Contudo, as questões financeiras e estruturais minaram a vida esportiva do estádio. A vitória simples do Cianorte sobre o J.Malucelli, por 2×1, em 2007, entrou para a história como o último jogo oficial a ser disputado no local. Naquele mesmo ano, laudos técnicos alertavam para o risco de desabamento da estrutura do local. Os portões do estádio foram lacrados em maio daquele ano e jamais foram reabertos novamente.
Isolado e silenciado, o Pinheirão passou a ser alvo de disputas judiciais. Após sucessivas idas, vindas e discussões, o estádio foi, em 2012, arrematado em leilão pelo empresário João Destro. A Federação Paranaense de Futebol, então detentora legal do estádio, não conseguiu anular a decisão. O valor pelo qual o Pinheirão foi leiloado foi de R$ 57,5 milhões.

Em outubro de 2024, o governo do Paraná surpreendeu e anunciou a desapropriação do terreno onde se encontra o Pinheirão. O estádio dará lugar a um Centro de Convenções, acompanhado por um complexo hoteleiro.
De acordo com o governo estadual, o projeto será executado por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP), com investimentos previstos da iniciativa privada. Estima-se que as obras possam iniciar ainda no segundo semestre de 2025, com previsão de entrega em até três anos.
“O Poder Público tirou o Pinheirão de nós. Meu pai está desgostoso”, afirma filho de João Destro
Procurado pela reportagem, João Destro, que arrematou o Pinheirão em 2012, preferiu não se manifestar. Em seu lugar, falou o filho, João Carlos Destro. Contrariado e entristecido pela maneira com o fim que será dado ao estádio, o empresário lamentou a maneira como o Governo Estadual se apropriou do imóvel e criticou o projeto em 3D apresentado pelo governador Ratinho Júnior (PSD) no ano passado.
Para nós, aquele imóvel era uma reserva de valor para um futuro empreendimento, e nos foi “tirado” pelo Poder Público que nem sequer tem o detalhamento do que pretende fazer ali. Nós tentamos sentar com o Guto Silva (Secretário das Cidades do Estado do Paraná) para nós mesmos, na iniciativa privada, executar a necessidade desse Centro de Convenções do Governo sem precisar desembolsar essa quantia toda do cofre do contribuinte. Eles nem sequer sabem quantos metros quadrados de arena, centro de eventos ou tamanho de hotelaria que pretendem fazer ali. Só querem um 3D bonito para o governador poder apresentar.
João Carlos Destro afirmou ainda que foi difícil colocar um preço em um “unicórnio”, devido à falta de interesse dele e do pai em precificar o imóvel situado em um terreno de 124.700 m². Os valores ainda estão sendo discutidos com o governo, visto que pai e filho consideraram a primeira oferta “abaixo do valor de mercado”. Ele ainda afirmou que João Destro ficou arrasado em perder a posse do Complexo Esportivo do Pinheirão após treze anos.

“Quanto vale? O imóvel nunca esteve à venda, e para nós era um futuro que nunca quisemos precificar, nesse processo todo tivemos o difícil trabalho de colocar preço em um unicórnio. É um terreno muito grande, tem 124.700m2 e está dentro da cidade. Meu pai, que tem paixão pelo imóvel, se viu desolado pela total falta de respeito do Poder Público em nem sequer conversar sobre o tema. Foi arrasador pra nós, o Pinheirão nunca esteve à venda. Meu pai ficou desgostoso com a vida. Era o imóvel que ele mais amava, ele queria deixar isso pros filhos, para os netos… e o governo veio e tirou isso. Somos totalmente contra a desapropriação do imóvel do antigo estádio do Pinheirão”, finalizou.
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