A Organização Mundial da Saúde (OMS) projeta que, até 2050, metade da população mundial pode ser afetada pela miopia, distúrbio visual que cria dificuldade para enxergar a distância. Nos Estados Unidos, o problema chega a atingir 50% da população; em países asiáticos, esse índice chega a 80%. Com a necessidade de isolamento social devido à pandemia do novo coronavírus, o problema pode se agravar. Um estudo realizado na China com mais de 120 mil crianças revelou aumento de 400% em casos de miopia em crianças de seis anos nos cinco primeiros meses de lockdown no ano passado, se comparado aos anos anteriores. Já entre os pequenos na casa dos sete anos, o aumento foi de 200%; entre os de 8, o acréscimo foi de 40%. 

Publicada em janeiro deste ano na revista científica Jama Ophthalmology, considerada a mais influente no meio oftalmológico, a pesquisa vem sendo realizada desde 2015 com crianças entre 6 e 13 anos de idade. A falta de atividades ao ar livre e a subsequente diminuição de acesso à luz solar e as horas gastas com os olhos fixados em uma tela de tablet ou celular podem estar diretamente relacionadas ao aumento de casos identificados pelo estudo. 

Em casos mais severos, a miopia pode levar a problemas como descolamento de retina, catarata ou glaucoma, que pode levar à cegueira. Soluções para o problema? Maior exposição à luz solar e diagnósticos cada vez mais precoces, na infância. 

A orientação é do dr. Valentim Claret, oftalmologista do Hospital IPO. O especialista alerta para os perigos da redução das atividades ao ar livre, sobretudo para as crianças, que nesse período pandêmico, por necessidade, se viram obrigadas a realizar atividades “in door”, muitas vezes com o uso de tablets, celulares e computador. 

“Quando a criança aumenta o recebimento de luz e a sensibilidade ao contraste [entre claro e escuro], o organismo produz dopamina e, com isso, reduz a miopia”, explica. A luz natural fomenta a atividade da dopamina na retina, o que reduz o ritmo de crescimento do globo ocular. 

Uso exagerado de tablets e aulas online

O uso intenso de aparelhos eletrônicos próximos aos olhos contribui para o esforço excessivo de acomodação ocular, já que obriga o músculo dos olhos, espécie de zoom natural do órgão, realizar a aproximação de modo repetitivo. A ação frequente pode também levar à miopia. Assim, o ideal, no caso das crianças que estão tendo aulas online, é manter a tela a uma distância segura dos olhos. a Norma Regulamentadora 17 (NR-17), para trabalhadores que realizam atividades profissionais em um computador, estabelece que a distância segura dos olhos para a tela varia de 45cm a 70cm.

Dr. Valentim lembra que em alguns países asiáticos, a miopia chega a atingir até 70% das crianças. Países como Taiwan e Coreia do Sul chegam a registrar até 90% de crianças com a condição. O que tem levado escolas a aumentar atividades ao ar livre para aumentar a incidência da luz solar sobre elas. Estudos apontam também que os casos de miopia são menores em áreas rurais na comparação com as urbanas, e quanto mais desenvolvido o país, maiores os números de pacientes com o problema.

É preciso manter uma distância segura durante as aulas online. (Foto: Pixabay)

Outro fator significativo no desenvolvimento da miopia é o genético. Embora não seja uma regra, há grandes chances de filhos de pais míopes também apresentarem a condição. 

Prevenção e tratamento

Somado à necessidade de incidência da luz solar na ativação da dopamina, ao cuidado com o uso excessivo de aparelhos eletrônicos e ao diagnóstico precoce, os exames oftalmológicos são fundamentais para determinar a extensão do problema. A partir dos resultados, o oftalmologista vai determinar os procedimentos a serem tomados. O uso de lentes corretivas e até uma eventual cirurgia refrativa, que remodela a curvatura da córnea, estão entre as possibilidades de tratamento para o paciente com miopia.

O diagnóstico precoce é fundamental para determinar a extensão do problema. (Foto: Divulgação)

Outra maneira de impedir a progressão da miopia, sobretudo em crianças, é o tratamento a partir da atropina. A partir do diagnóstico correto e da prescrição de um oftalmologista, o tratamento pode ser farmacológico, com colírio de atropina. Pesquisas realizadas com crianças asiáticas em idade escolar apontaram que o tratamento com o colírio em baixas concentrações (0,01%, 0,05% e 0,025%) se revelou eficaz no controle da progressão da miopia. A redução média chegou a 60%. Os estudos informaram que o uso da atropina deve ser diário por dois a três anos,  e que nem todos os pacientes respondem ao tratamento. Lentes de contato multifocais e óculos com lentes bifocais e multifocais também podem ser empregados no controle da progressão da miopia.