Da Redação
Nos próximos dias, os envolvidos no “Caso Evandro” também irão receber cópias do relatório e cartas formais com pedido de perdão pelos erros cometidos no passado pelo Estado. Na prática, os documentos poderão servir para os advogados dos torturados nos pedidos de anulação do julgamento e para os pais das crianças acionarem o Estado na esfera cível pedindo indenizações pela sequência de danos sofridos.
As crianças Evandro Ramos Caetano e Leandro Bossi desapareceram nos anos 90 na cidade de Guaratuba, no litoral do Paraná. Celina Abagge e Beatriz Abagge, mãe e filha, foram acusadas pelo desaparecimento e morte de Evandro e sofreram tortura para confessar o crime.
Após assistir a série documental sobre o caso exibida pela Globo Play, ler o relatório, tomar conhecimento dos depoimentos espontâneos e ouvir os áudios da tortura, o secretário de Justiça, Família e Trabalho do Paraná, Ney Leprevost, teve a convicção de que os acusados foram vítimas de gravíssimas violências físicas e resolveu pedir perdão também a eles pelos crimes de tortura cometidos no passado pelo Estado.
Para Beatriz Abagge, a decisão de formalizar também os pedidos de perdão aos envolvidos e torturados é muito significante para a família Abagge. “Na semana passada, ao saber do pedido de perdão apenas para as famílias das crianças ficamos revoltadas, pois consideramos uma contradição não estender a todos os envolvidos. Mas hoje estamos felizes. Sabemos que esta decisão não tem força de lei, mas é um recohecimento significante de uma Secretaria de Justiça”, disse.
“Utilizar a máquina estatal para cometer tortura é crime. Neste caso vemos muitas vítimas: as crianças, seus pais, os acusados que foram torturados, pessoas que tiveram a vida profissional destruída, as instituições públicas que foram induzidas a erro, o município de Guaratuba que ficou anos e anos sendo discriminado e até o contribuinte paranaense que pagou por tudo isto. É a teoria de São Tomás de Aquino, tão ensinada nas faculdades de Direito, aplicada na prática: uma maçã podre fez toda investigação apodrecer”, afirma o secretário de Justiça, Família e Trabalho do Paraná Ney Leprevost.
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Abaixo texto da carta que será enviada para senhora Celina Abagge, que tem 82 anos de idade e foi vítima de tortura.
“A senhora Celina Abagge
Venho por meio deste informá-la que o relatório coordenado pelo Departamento de Direitos Fundamentais deste órgão e elaborado pelo Grupo de Trabalho “Caso Evandro-Apontamentos para o Futuro” está concluído e será de grande utilidade para a proteção dos direitos humanos e a prevenção de crimes contra as crianças.
Tal documento será disponibilizado para a senhora e para os demais condenados pelo crime para que, se for de interesse de seus advogados, possa ser anexado ao pedido de anulação do julgamento.
Ressalto que o Grupo de Trabalho funcionou de forma independente e multidisciplinar com objetivo claro de aprender com os graves erros do passado para iluminar os caminhos que serão percorridos no futuro.
Faço questão de publicizar que após assistir a série Caso Evandro, ouvir os áudios, tomar conhecimento dos relatos espontâneos e ler o relatório elaborado pelo Grupo, do qual não fui parte integrante, formei convicção de que a senhora e os outros condenados pelo crime foram vítimas de torturas gravíssimas. Tal prática configura-se crime e é totalmente inaceitável.
Cabe salientar que não tenho prerrogativa legal para declará-la inocente e nem mesmo para anular seu julgamento. Sendo que tal medida só poderá ser adotada, na forma da Lei, pelo próprio poder Judiciário, ao qual encaminharei cópia desta carta e do relatório.
No entanto, na condição de secretário de Justiça, Família e Trabalho, expresso meu veemente repúdio ao uso da máquina estatal para prática de violência contra seres humanos para obtenção de confissões e “peço, em nome do Estado, perdão pelas sevícias indesculpáveis cometidas no passado contra a senhora.”
Pedido de perdão este também, simbolicamente, extensivo a toda e qualquer outra pessoa que por ventura tenha um dia sofrido tortura estatal em território paranaense.
Também informo que será enviado um pedido veemente de perdão aos pais dos meninos desaparecidos. Pois, na época dos fatos, o grupo de questionável legalidade designado pelo Estado para desvendar quem cometeu os horríveis e covardes crimes contra estas crianças, não só foi incapaz de fazê-lo assim como gerou uma série de danos.
Na firme esperança de que “mesmo escapando da justiça dos homens, os maus jamais conseguirão fugir da justiça de Deus”, assino desejando-lhe um Ano Novo com saúde, justiça e paz!”
Ney Leprevost
Secretário de Justiça, Família e Trabalho do Paraná
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