Da Redação
A partir de 1º de janeiro de 2022, a Síndrome de Burnout, distúrbio provocado por condições de trabalho, passa a ser oficialmente reconhecida como doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na nova Classificação Internacional de Doença (CID). A síndrome será classificada como CID 11.
Também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional, a Síndrome de Burnout é um transtorno psíquico ocasionado pelo cansaço extremo causado pelo estado de tensão emocional e estresse decorrentes de condições de trabalho desgastantes e que afeta a pessoa em diversos setores da vida.
Na classificação em vigor até 31 de dezembro de 2021 (CID 10), existe uma correlação da síndrome com o trabalho. Ela aparece categorizada como doença mental, da família de depressões, estresses e esgotamentos. Após uma série de estudos, contudo, especialistas da OMS perceberam que o trabalho era a causa preponderante, sendo a síndrome classificada resultante do “estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso”.
A advogada especialista em gestão de empresas e de pessoas Rafaella Munhoz da Rocha, sócia-proprietária do Filla e Munhoz da Rocha Advogados Associados, explica que com a chancela da OMS, torna-se imprescindível que medidas preventivas e de monitoramento sejam constantes no ambiente de trabalho, inclusive por possíveis reflexos financeiros e jurídicos.
Para ela, o próprio novo conceito da síndrome deixa claras as razões para a preocupação. “O conceito de ‘estresse crônico de trabalho’ já vincula ao trabalho e não mais à pessoa do trabalhador. A não administração correta do trabalho implica em uma presunção de que houve uma má gestão do empregador, uma má gestão da empresa nas condições de trabalho, métodos de gestão e forma de cobrança de metas”, afirma a advogada.
Justiça e previdência
A Justiça do Trabalho promove uma série de condenações que responsabilizam o empregador por funcionários que ficaram doentes acometidos pela Síndrome de Burnout. Até agora, o que a empresa precisava provar era que não havia culpa de gestão, por cobrança de metas ou metodologia de trabalho.
Neste caso, a defesa do empregador poderia alegar uma série de outros fatores, como predisposição do trabalhador a ter depressão ou ser um funcionário que se cobra muito, segundo Rafaella. “Hoje, não”, enfatiza. Segundo a advogada, com a nova classificação, a empresa vai ter que provar na Justiça do Trabalho que o diagnóstico do trabalhador está errado e que não se trata da Síndrome de Burnout.
Por isso, o ideal é não chegar ao ponto de um eventual processo trabalhista. “As empresas e empregadores já têm o dever de preservar a saúde integral dos seus colaboradores, mas a atenção terá que redobrar”, aconselha.
O tipo de afastamento previdenciário para o colaborador de uma empresa também muda com a CID 11. A partir de 1º de janeiro, se o trabalhador tiver um atestado reconhecendo que tem a síndrome, ele passa a ter o Benefício Acidentário e não mais o Auxílio Doença, como acontece na CID 10. “O Auxílio Doença seria por estar com Covid-19, por exemplo. No Benefício Acidentário, o afastamento é por uma doença do trabalho, ou seja, presume-se a culpa da empresa ou a relação da doença com o trabalho”, diz Rafaella Munhoz da Rocha.
Também por estar enquadrado no Benefício Acidentário, finalizada a licença médica e estando de volta ao trabalho, o funcionário afastado por Síndrome de Burnout não pode ser demitido pelos próximos 12 meses. “A questão da proteção à saúde sempre existiu e já se discutia se a Síndrome de Burnout teria relação com o trabalho. Agora existe um reconhecimento, que é o que vai pautar também a análise da previdência, quando for conceder o benefício”, diz Rafaella.
Profissionais mais afetados
“Síndrome de Burnout” foi uma expressão cunhada pelo psicanalista americano Herbert Freudenberger, em 1974. O nome deriva da locução verbal inglesa to burn out (queimar por completo, consumir-se). As pessoas apresentavam um processo gradual de desgaste do humor e/ou desmotivação, com sintomas físicos e psíquicos, como um “estado de exaustão”, em resposta ao estresse emocional crônico causado por atividades no trabalho que envolviam um alto grau de contato com outras pessoas.
O distúrbio pode afetar profissionais de quaisquer áreas, mas tende a se manifestar especialmente naqueles trabalhadores cuja profissão exige envolvimento interpessoal direto e intenso. Profissionais das áreas de educação, saúde, assistência social, recursos humanos, agentes penitenciários, bombeiros, policiais e mulheres que enfrentam dupla jornada correm risco maior de serem afetados pela pane física e mental.
Uma pesquisa realizada pela International Stress Management Association (Isma) – a mais antiga associação voltada à pesquisa e ao desenvolvimento da prevenção e do tratamento de estresse no mundo – aponta que 30% dos mais de 100 milhões de trabalhadores brasileiros sofrem com o problema.
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Outro estudo, este realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), identificou altos níveis da Síndrome de Burnout e depressão em profissionais da saúde de todo o Brasil. O levantamento incluiu 17 categorias de profissionais apontadas pelo Ministério da Saúde como diretamente envolvidos nos cuidados a pacientes com Covid-19, entre os quais psicólogos, nutricionistas, biólogos, agente de saúde, entre outros.
Além destes, foram entrevistados profissionais das mesmas áreas, porém não necessariamente envolvidos na linha de frente do combate ao coronavírus. Os resultados do estudo da UFRGS são considerados preocupantes: mais da metade da mostra total apresentou alto nível de Síndrome de Burnout.
A categoria de enfermagem foi a que teve os piores resultados entre os 1.054 profissionais de saúde entrevistados. Dos 201 técnicos de enfermagem, 68,2% apresentaram sintomas de esgotamento e 68,7% depressão clinicamente significativa.
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