Litoral do Paraná vive sob a violência imposta por facções criminosas
Quem pensa em praia, logo imagina o descanso, a areia, o mar e a tranquilidade, mas esse é um cenário bem diferente para quem trabalha ou mora na maioria das cidades do litoral paranaense. O sossego e a segurança foram embora assim que começou uma disputa feroz entre facções criminosas pelo controle do tráfico de drogas na região. Desde o início de 2021, já foram registradas mais de 40 execuções. Família inteiras foram dizimadas devido a briga das gangues rivais.
O comerciante Nicolau Aparecido, que costumava vender churros nas praias, conta que com o aumento da violência e da criminalidade foi obrigado a mudar os horários e locais de trabalho, mesmo que isso tenha feito seus lucros diminuírem. “Trabalhar perto de uma viatura, polícia, guarda municipal, que daí dá um reforço para a gente. Sozinho dá medo”, conta.
O medo de Aparecido tem motivos concretos, até crianças já foram vítimas da guerra que tomou conta dos municípios litorâneos. No final de 2020, Fábio Nogueira da Silva Júnior foi assassinado dentro de casa, no bairro Monções, em Pontal do Paraná. Dois homens se identificaram como policiais, entraram na residência, renderam os moradores e efetuaram diversos disparos de arma de fogo. Fábio, sua sobrinha de 7 anos e uma mulher foram baleados. A menina levou um tiro na coluna.
A marginalidade é tanta, que as pessoas têm receio de sair de casa. José Carlos Pazini prefere não sair de casa e quando precisa, prefere fazer no começo da manhã ou no meio da tarde, quando o movimento é um pouco maior
“Eu quase não tenho saído de casa, só saio quando necessário. A gente está sempre inseguro”, relata Pazini.
A apreensão dos residentes é justificada pelas estatísticas. De acordo com a Polícia Militar (PM), no primeiro trimestre foram registradas 144 ocorrências de furto e roubo nos comércios das sete cidades de abrangência do batalhão que fica em Paranaguá. Além disso, foram 422 ocorrências desses mesmos crimes em residências.
“A gente elenca alguns pontos vermelhos de ocorrências para lançar o policiamento ali. Atrelado a isso, o batalhão também tem uma seção específica, que é a seção de estatística e que faz esse levantamento para o lançamento do policiamento. Nós tivemos sim um acréscimo, mas a Polícia Militar, detectando isso, já atua para que os índices voltem ao normal”, explica o major Stocco, do 9º Batalhão de Polícia Militar.
De acordo com o delegado Nilson Dinis, da Polícia Civil, a violência imposta pelas facções criminosas criou uma lei do silêncio, onde as pessoas têm medo de contar o que viram por temerem por suas próprias vidas.
“São homicídios que dificilmente nós vamos ter aquela testemunha espontânea, que deseja passar o que viu. A Polícia Civil tem que trabalhar muito mais com o que a gente chama de investigação tecnológica para poder trazer aos autos esses elementos que vão possibilitar a responsabilização desses autores”, pontua Dinis.
Existe ainda a dificuldade de se chegar aos líderes das facções no litoral, já que desvios de conduta ou delações por parte dos integrantes são punidas com a morte, em uma espécie de tribunal do crime.
“Nós identificamos várias células de determinada organização criminosa aqui no nosso município, que delegavam a determinados integrantes a função de disciplina da organização. Que tinha como função verificar os desvios de conduta e ali, eles decidiam qual era a sanção que cabia ao transgressor. Nós realizamos a prisão de aproximadamente 15 integrantes dessa organização, que ao longo de um ano sentenciaram pelo menos cinco pessoas a morte”, completa o delegado.
A Polícia Civil garante que quase 90% dos homicídios ocorridos no litoral do Paraná, que envolvem as facções criminosas, já foram solucionados pelo menos com a identificação dos autores desses assassinatos. Mesmo assim, a preocupação com o aumento da criminalidade ainda está longe de um final.
Assista à reportagem completa:
Veja também a primeira reportagem da série ‘Guerra de facções no litoral paranaense’.