Lula diz que aborto é tema do Congresso após manifestar-se contra interrupção da gravidez
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reiterou em vídeo ser contra o aborto e disse a jornalistas nesta sexta-feira (7), após uma caminhada em Guarulhos, na Grande São Paulo, que a lei determina em quais casos a interrupção da gravidez é permitida e o tema cabe ao Congresso Nacional, não ao presidente da República.
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No material audiovisual, que também foi exibido na campanha da TV, Lula lembrou que está no terceiro casamento depois de ficar viúvo duas vezes, que é contra o aborto e que todas suas esposas também eram contrárias à prática, assim como a atual, a socióloga Rosângela da Silva, conhecida como Janja.
O petista foi casado por dois anos com Maria de Lourdes da Silva, que morreu no parto do primeiro filho do casal em 1971, e depois ficou casado por 43 anos com Marisa Letícia, morta em decorrência de um acidente vascular cerebral em 2017. Neste ano, o petista casou-se com Janja.
“Eu acho que quase todo mundo é contra o aborto. Não só porque nós somos defensores da vida, mas porque deve ser uma coisa muito desagradável e muito dolorida alguém fazer um aborto”, diz Lula no vídeo.
A manifestação explícita do petista não só sobre o aborto, mas também exaltando sua vida familiar, é um aceno à parcela mais conservadora na sociedade, e, em especial aos evangélicos, fatia do eleitorado onde o atual presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) lidera. Bolsonaro também está no terceiro casamento, mas depois de divorciar-se duas vezes.
O movimento de Lula ocorre em meio à investida do atual presidente, atrás nas pesquisas para o segundo turno, de promover uma agenda de costumes e buscar elevar a rejeição a Lula.
Bolsonaro tem dito, sem apresentar provas, que Lula é a favor do aborto e da legalização das drogas e foi às redes sociais reagir às manifestações do petista.
“Lula agora tenta dizer que é contra o aborto, enquanto é apoiado por quem defende; que é cristão, enquanto é apoiado por quem odeia igreja; que é contra as drogas, enquanto é apoiado por quem é a favor; que é contra a corrupção, enquanto ele e seu bando foram presos por isso”, escreveu o presidente.
Bolsonaro voltou ao tema em live transmitida nesta sexta-feira via redes sociais: “Ele vai dizer agora que é contra o aborto? Logo ele? Que falou com tanta convicção há poucos dias… que aborto é uma questão de saúde?”.
“As madames, ele falou, vão se operar em Paris, na Alemanha, vão fazer o seu aborto lá, e a mulher do pobre não”, seguiu Bolsonaro na transmissão ao vivo. “E falou tanta besteira, com tanta convicção, como tá pegando mal, porque o cristão de verdade não aceita isso.”
Durante caminhada em Guarulhos, Lula foi indagado sobre o assunto por jornalistas e disse tratar-se de um tema do Congresso Nacional.
“A lei existe e a lei diz como é que pode acontecer ou não o aborto. Não é um papel de um presidente da República, isso é papel do Poder Legislativo”, afirmou o petista.
Pela legislação brasileira, a interrupção da gravidez é permitida em caso de risco de morte da mãe, caso a gestação seja fruto de um estupro ou se o feto for anencéfalo, quando o cérebro é pouco desenvolvido e o crânio incompleto, o que inviabiliza a vida fora do útero.
Segundo levantamento do Datafolha divulgado em junho, 39% concordam com a manutenção da legislação atual sobre o aborto, ao passo que 32% entendem que a interrupção da gravidez deve ser proibida em todos os casos, 18% avaliam que o aborto deve ser permitido em mais situações e 8% em qualquer situação.
O tema do aborto já foi usado no passado contra o PT, que atrai o eleitorado feminista, favorável à bandeira da legalização da prática.
Em abril, antes do início formal da campanha, Lula afirmou que o aborto é uma questão de “saúde pública” e chegou a dizer que todo mundo deveria “ter direito e não ter vergonha” do procedimento, o que foi considerado um deslize por potencializar os ataques de Bolsonaro. Pouco depois do episódio, o petista enfatizou que era “pessoalmente contra o aborto”.
Nem Bolsonaro, agora na linha de frente contra a prática, escapa do escrutínio sobre suas declarações passadas. Em 2000, em uma entrevista à revista IstoÉ Gente, o então deputado Bolsonaro manifestou uma posição diferente da atual sobre o aborto.
Na ocasião, o presidente disse que a interrupção da gestação deveria ser “uma escolha do casal” e relatou que cogitou a possibilidade de interromper a gravidez que resultou no nascimento de seu quarto filho, Jair Renan Bolsonaro.
Briga com Petrobrás
Na entrevista em Guarulhos, Lula acusou Bolsonaro de estar “brigando” com a Petrobras para que a estatal segure o aumento dos preços dos combustíveis em suas refinarias até o segundo turno da eleição no dia 30 de outubro e disse que a elevação desses preços no início do ano se deu por inação do atual governo.
“Neste instante ele está brigando com a Petrobras para que a Petrobras não aumente a gasolina até o dia 30 de outubro. Ou seja, ele está utilizando a eleição para fazer tudo aquilo que ele deveria ter feito antes das eleições”, disse Lula.
“O preço da gasolina não precisava ter chegado onde chegou, o preço do diesel não precisava ter chegado onde chegou, o preço do álcool não precisava chegar onde chegou. Chegou porque a gente não tinha governo”, disparou.
Matérias veiculadas recentemente na imprensa afirmaram que o governo Bolsonaro tem pressionado a Petrobras para que a estatal segure o aumento dos combustíveis para depois do segundo turno, em meio à alta recente do barril de petróleo no mercado internacional.
Analistas ouvidos pela Reuters disseram que, com Bolsonaro no segundo turno da eleição, é provável que a Petrobras evite repassar de imediato aumentos do petróleo. Se o mercado de petróleo se fortalecer mais, pode exacerbar uma defasagem registrada nos últimos dias nos preços locais ante os valores internacionais, disseram.
A manutenção dos preços internos abaixo da média dos produtos importados tende a afastar o interesse de importadores de combustíveis, o que em tese elevaria riscos de oferta local, já que o Brasil depende de importações para atender completamente o mercado.
Por Eduardo Simões / Reuters