Físico explica os efeitos imediatos e de longo prazo de um ataque nuclear da Coreia do Norte aos Estados Unidos da América
*Do R7
Em meio à crescente troca de ameaças e insultos entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, autoridades da Califórnia emitiram um relatório no qual pedem que a ameaça nuclear da Coreia do Norte seja levada a sério e dizem que um ataque do tipo seria catastrófico para o Estado, de acordo com informações da revista Foreign Policy.
De acordo com o relatório, “as consequências de um ataque nuclear no sul da Califórnia seriam catastróficas”, com perdas devastadoras e grandes danos à infraestrutura local.
A catástrofe, no entanto, não se restringiria aos EUA, explica Ennio Peres da Silva, pesquisador colaborador do NIPE (Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
— Uma guerra nuclear é o fim do mundo, porque uma parte desse material radioativo vai subir para a estratosfera, pegar as correntes de vento e se espalhar por vastas regiões. O acidente de Chernobyl, por exemplo, contaminou vacas na Europa e foi medida nos EUA meses depois. Aquilo vai se espalhar por todo o mundo.
“O efeito é devastador. É como um “mini sol” e as pessoas evaporam”.
Para aumentar o efeito de destruição local, normalmente, essas bombas não explodem no nível do solo, porque elas criariam uma cratera muito grande, reduzindo o efeito de destruição, diz o pesquisador.
— O efeito no local do impacto é devastador, não sobra nada. Na zona onde ela explode, a temperatura chega a milhares de graus centígrados. É como um “mini sol” ali. Então, em uma área de cerca de 10 km, não fica nada inteiro. As pessoas evaporam, por exemplo, em uma temperatura tão elevada. Já em uma área maior, de 40 km, algumas coisas conseguiriam ficar em pé e teria muitas pessoas feridas gravemente, mas que não morreriam de imediato. A explosão da bomba também cria uma onda de choque no ar, que faz com que todo o ar que está naquela região se afaste, criando um vento que se propaga por quilômetros. Depois que essa onda cessa, o ar volta com força e poder de destruição também.
Muitas das informações contidas no relatório californiano são baseadas em fatos conhecidos sobre os efeitos de uma explosão nuclear, principalmente, da radiação.
— Os efeitos são muito severos e vão se espalhando por décadas. Em doses altas, a radiação queima a pele de imediato. Em doses menores, ela vai induzir a falência de órgãos. Em doses ainda menores, vai dar náusea ou provocar vômito. Assim como na quimioterapia e radioterapia, também pode provocar infertilidade e queda de cabelo.
Um dos piores efeitos da exposição à radiação é mutação gênica, que, na maioria das vezes, são maléficas e produzem tumores cancerígenos.
— Os EUA fizeram muitos testes com bombas atômicas, durante e após a 2ª Guerra Mundial, nos desertos de Nevada e do Texas. Naquelas regiões também se rodou muitos filmes de caubói nos anos de 1950. Foi verificado que muitos desses atores morreram de câncer, com uma incidência muito acima da média. Os ventos levavam material radioativo para outras regiões.
“Caso não consiga sair da área, o ideal é se proteger em abrigos subterrâneos ou correr para uma estação de metrô”.
Em uma seção sobre “noções básicas de proteção contra radiações”, o relatório das autoridades da Califórnia oferece ainda um guia sobre o que fazer durante um ataque nuclear: “Deite de cabeça para baixo e coloque as mãos embaixo do corpo para proteger a pele exposta (…) permaneça assim até as ondas de calor e choque terem passado”.
— As pessoas que sobrevivem próximo a uma explosão nuclear o que seria mais certo é tentar sair da área imediatamente, e procurar ajuda. Após uma explosão é difícil que as casas se mantenham inteiras (vidros e janelas) e passíveis de serem fechadas adequadamente, para evitar o ar poluído. Da mesma forma, subsolos de prédios podem desabar. Então, o ideal é se proteger em abrigos subterrâneos ou, na ausência dessa possibilidade, correr para uma estação de metrô. A radiação perde intensidade na medida em que atravessa matéria, então alguns metros de terra podem ser suficientes para se blindar de alguns tipos de radiação. Se a pessoa tiver uma máscara de gás, ela deve pôr e também se cobrir o máximo possível com roupas.
O relatório também adverte sobre as dificuldades que as autoridades governamentais provavelmente encontrarão ao lidar com as consequências de uma explosão. As comunicações seriam “gravemente” impactadas, os recursos dos governos locais ficariam sobrecarregados e que a assistência federal poderia não estar em cena por 24 a 72 horas.
— Os países que têm usinas nucleares, como o Brasil, têm equipes preparadas para atender a acidentes nucleares. Eles vão estar munidos de roupas especiais e máscaras, e poderão intervir por um determinado tempo. Eles teriam de ser substituídos periodicamente para diminuir a exposição à radiação. A primeira coisa a se fazer é tirar todo mundo da região, feridos ou não. Elas têm que ser isoladas e monitoradas, e passar por um processo de desintoxicação. Pessoas que respiram o ar, por exemplo, vão ter esses elementos radioativos no pulmão.
O jornal norte-americano conseguiu uma cópia do relatório “Considerações de Resposta de Ataque Nuclear”, que teria sido emitido pelo Centro Regional de Inteligência Conjunta de Los Angeles em agosto, após um teste de míssil balístico intercontinental realizado pela Coreia do Norte no fim de julho. O míssil teria a capacidade de chegar à costa oeste dos EUA e carregar bombas até o território norte-americano.
O pesquisador da Unicamp explica que há dois tipos bombas atômicas, que fazem uso da energia dos núcleos dos átomos: a bomba A (atômica) e a bomba H (de hidrogênio). Em setembro, a Coreia do Norte declarou que havia realizado com sucesso um teste com bomba H.
— A bomba atômica foi a primeira desenvolvida e ela utiliza núcleos de elementos pesados. As duas únicas lançadas até hoje, foram as de Hiroshima (bomba de urânio) e Nagasaki (plutônio). Essas são bombas funcionam a partir da quebra dos núcleos desses átomos pesados, liberando a energia da bomba atômica. Já a bomba de hidrogênio faz o contrário, ela usa átomos leves, principalmente deutério e trítio, que são isótopos [ou variantes] do hidrogênio. O princípio da bomba é fundir esses átomos e, assim, formar elementos mais pesados, fazendo com que haja uma liberação muito maior de energia do que na bomba atômica.
Para dar início a essa fusão, é preciso uma energia muito grande, explica o pesquisador.
— É como a gasolina, que só detona dentro do tanque se tiver uma pequena faísca. Na bomba de hidrogênio, a “faísca” é uma bomba atômica, com menos potência do que as convencionais. Ou seja, dentro de toda bomba de hidrogênio, existem uma “pequena” bomba atômica.
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