Políticos sacrificam vidas por votos
Em 22 de março último, o presidente Jair Bolsonaro citou o exemplo da gripe H1N1, que tinha levado 796 brasileiros a óbito em 2019, para garantir que a covid-19 (“uma gripezinha”) não chegaria a esse número. Na quinta-feira 16 de julho de 2020, quase quatro meses depois, o consórcio dos veículos de comunicação confirmou o registro de 2.012.051 casos notificados e 76.688 mortes confirmadas, 100 vezes mais.
O impacto provocado n economia, que fechou meio milhão de empresas e encerrou 7 milhões e 800 mil empregos até o fim de maio, foi usado como pretexto para ele pregar de forma obsessiva o fim do isolamento social, tentando transferir a culpa pela recessão econômica, registrada no mundo inteiro, para governadores e prefeitos, muitos dos quais adversários prováveis nas eleições gerais de 2022.
Em momento algum, Sua Excelência dirigiu uma única palavra de apoio aos profissionais da saúde, tratados como heróis por todos os brasileiros de bom senso, mas agredidos e humilhados por seus apoiadores sem que dele se ouvisse algum tipo de repreensão.
No mundo inteiro, o capitão cloroquina é visto como o principal vilão da pandemia, superando nesse quesito até seu inspirador, Donald Trump, cujo desumano e desastrado comportamento no governo reduzirá as antigas previsões de reeleição fácil a pó.
No entanto, a dupla catastrófica tem sócios inesperados até mesmo entre os que, apesar de terem tentado adotar a quarentena como única saída científica para o contágio da covid-19, não encontraram soluções viáveis para manter cidadãos em casa. Embora tenha sido evitado, mesmo assim, o colapso do sistema público. O presidente da República adotou o negacionismo obscurantista como comportamento e dele não arredou pé. Os governadores e prefeitos passaram a ser seus alvos preferenciais.
Mas, mesmo os que mais se destacaram, como os aliados que viraram desafetos João Doria, de São Paulo, Wilson Witzel, do Rio, e Ronaldo Caiado, de Goiás, terminaram cedendo aos mesmos argumentos eleiçoeiros de empresários pouco sensíveis e metidos a espertos, e restringiram as medidas de controle com a dificuldade de adesão da população com sobrevivência ameaçada, menos pela terrível doença, mas pela única forma efetiva de evitá-la.
Bolsonaro foi além e adotou até a postura de vendedor de óleo de cobra em feira livre apregoando as virtudes curativas do dióxido de cloroquina, nunca confirmadas por cientistas sérios. Dificilmente qualquer um deles escapará do alfange punitivo do voto daqui a dois anos.
*Jornalista, poeta e escritor