“Na hora da intubação vamos de mãos dadas com eles, mas geralmente voltamos sozinhos”, diz fisioterapeuta
O texto com maior repercussão da fisioterapeuta Leandra Alainz foi sobre o desprazer da covid-19. Em linhas do Instagram, a profissional de apenas 23 anos, que atua na UTI do Hospital São Leopoldo, contou detalhes de pacientes que perderam a vida para a doença. Um dos personagens principais é um torcedor do Internacional, de aproximadamente 50 anos e que não tinha comorbidades.
O cara que foi intubado e não chorou
“Este cara era colorado, e a gente estava tentando. Ele entrou na internação saturando mal, mas com um prognóstico bom porque ele era um cara novo. A gente conversava, batia papo, sempre aquela coisa de ‘não desiste, estamos aqui, vai dar tudo certo’”,
começou a contar a história, Leandra.
Entretanto, a situação do paciente que tinha tudo para sair ileso do hospital complicou. “Quando veio o exame de mau prognóstico e estava tudo muito difícil, com muita falta de ar, eu levei um choque muito grande. Eu falei ‘não, mas estamos lutando, ele está conseguindo’. Aí o médico olhou para mim e disse ‘Se você disser pra mim que não quer intubar ele, nós não vamos intubar, porque eu também não quero intubar’. Mas aí eu olhei para ele, olhamos o exame e não tinha o que fazer, precisávamos intubar”, lembrou Leandra.
O paciente já era amigo da fisioterapeuta, torcedores do Colorado, os dois compartilhavam a expectativa do Inter conquistar o Brasileirão. Mas, antes da partida decisiva, a profissional precisou levar a triste notícia da intubação.
“Quando eu cheguei perto do leito dele, ele olhou pra mim, e como somos colorados ele falou ‘então tá, eu te vejo daqui uma semana e o Inter vai ganhar o campeonato’. Eu respondi confiante que sim, que o Inter ganharia o campeonato e eu estaria ali cuidando dele. Na hora que eu o intubei ele, eu fiz aquilo chorando”,
recorda a fisioterapeuta.
Na publicação do Instagram, Leandra transcreveu desta maneira o momento da intubação deste paciente: “É um soco no estômago quando nos 5 minutos antes da intubação, eles falam vão te ver em uma semana. Quando nos últimos segundos conscientes, não choram”.
O paciente não resistiu a luta e faleceu dias depois.
“Não tinha como, estava muito comprometido. E a gente sofre porque acabamos levando para eles uma certeza que não temos, que é a certeza que eles vão sair. A mulher dele foi lá e deram a notícia. Foi um dos piores momentos para mim”,
comentou Leandra.
Na mesma publicação, Leandra citou um idoso que se questionava porque Deus fez aquilo com ele, e uma grávida que comoveu um hospital inteiro. Oito dias após dar à luz, a mulher de 37 anos partiu antes mesmo de ver o rostinho do filho. A morte da mulher comoveu todos os profissionais, naquele dia, o choro estava em todos os corredores do Hospital Centenário.
Confira o texto na íntegra:
A COVID é um desprazer;
É um desprazer ter que tentar acalmar um paciente de 30 anos, sem comorbidades que vai ser intubado porque já não consegue respirar sozinho.
É um desprazer ver idosos perguntando porque Deus fez aquilo com eles;
É um desprazer olhar um histórico de uma paciente e ver que ela é mãe a 8 dias, 37 anos e não conhece seu bebê e bem provavelmente não vai conseguir ver seu rostinho, nem uma única vez.
A COVID é um soco no estômago
Quando a gente tem que conversar com um paciente e ele pergunta se ele vai morrer e a gente não pode dizer que não, porque ele tem mais de 80% do pulmão comprometido.
É um soco no estômago quando quem percebe que vai ser intubado pede segurando na tua mão para ir pra casa. Para falar com a família, para ficar perto.
Só que não temos tempo, já é tarde.
É um soco no estômago quando nos 5 minutos antes da intubação eles falam que vão te ver em uma semana.
Quando eles nos últimos segundos consciente não choram.
Eu nem tenho como explicar a sensação de começar a reanimar uma pessoa que a 2 dias estava bem e agora simplesmente parou.
Eles morrem sozinhos, os familiares não tem nem a chance de segurar as suas mãos.
Por favor fiquem em casa, não se aglomeram, nos estamos lotados, sem leitos e sem ventilador não é a mídia dizendo, somos nós.
Eu não quero ter que intubar ou reanimar alguém da sua família.