Doações de sangue dirigidas criam laços entre pacientes e voluntários
Conheça a rotina de solidariedade dos doadores fenotipados, fundamentais para a saúde de quem depende de transfusões de sangue regulares
De um lado, pessoas que precisam de transfusões regulares de sangue. De outro, voluntários dispostos a ajudar outras pessoas fazendo uma doação. Entre eles, o cuidado e a dedicação dos profissionais que trabalham diariamente para juntar as duas pontas em um laço de solidariedade. Essa é uma das melhores formas de descrever o trabalho dos bancos de sangue na identificação dos chamados doadores fenotipados, que fazem as suas doações para uma pessoa especifica sempre que são convocados.
Além da tipagem sanguínea mais conhecida, que classifica o sangue nos grupos A, B, AB ou O, e pelo Rh Positivo ou Negativo, a fenotipagem avalia a presença de diversos outros antígenos. O objetivo é garantir a maior compatibilidade possível entre o sangue de doador e receptor. Dessa forma, evita-se que o organismo do paciente trate o sangue recebido como uma ameaça e o “ataque” com anticorpos.
Na prática, para além da ciência, a fenotipagem cria uma ligação entre duas pessoas, que na maioria das vezes sequer se conhecem. Mas, até para estimular as doações, o Centro de Hematologia e Hemoterapia do Paraná (Hemepar) abre espaço para que os pacientes se comuniquem com os doadores que tanto os ajudam. Esse contato normalmente é feito por cartas, mas nada substitui o encontro entre duas pessoas ligadas por uma boa ação.
Encontro entre paciente e doadora é cheio de emoção
Nesses momentos, a emoção fica a flor da pele. Como aconteceu no encontro entre Eliane Aparecida dos Santos, que precisa de transfusões de sangue a cada quatro semanas, e Emanuele Amaral Gurgel da Luz, uma de suas doadoras fenotipadas.
“Eu fico até sem palavras. Porque a gente vem aqui e recebe o sangue e às vezes nem sabe de quem é, quanto tempo essa pessoa já doa pra gente. Só sei que a gente tá aqui por conta deles, com a graça de Deus, que colocou esses anjos nas nossas vidas. Eles são nossos tesouros, nossos heróis”, conta Eliane, que já havia enviado cartas para a doadora, mas não a conhecia pessoalmente.
Eliane tem talassemia, que é uma forma de anemia crônica. Assim, o seu organismo não produz a quantidade adequada de glóbulos vermelhos. Assim, ela depende de transfusões mensais, ao longo de toda a vida. No dia do encontro, ela receberia o sangue de Emanuele.
“Eu tive o prazer de conhecer a Emanuele bem no dia que vou receber o sangue que ela doou. Fico até sem palavras para agradecer. Tem alguns doadores que se prontificam em conhecer a gente e eu fico muito feliz com isso. Mas tem outros que eu não conheço, mas que considero do mesmo jeito como anjos na minha vida”, complementa.
Doadora há mais de dez anos, Emanuele destaca importância do gesto
A emoção dela é compartilhada por Emanuele, que doa sangue regularmente há mais de dez anos. “A gente fica na expectativa de conhecer quem recebe o sangue. Ela me manda cartas no dia do doador e hoje é um dia especial por conhecer a Eliane. Eu fico muito grata de poder ajudar, é muito gratificante. Eu sempre doei voluntariamente porque acho que se a gente pode ajudar, não custa nada”, conta.
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A doadora, que é auxiliar de enfermagem, explica como foi convocada para doar especificamente para a Eliane. “Eu sou a doadora há 10 anos. Na pandemia, eu fui convocada e eles olharam lá no banco de dados e viram que eu era compatível com uma paciente. E então eles me perguntaram se eu queria participar da fenotipagem. E aí, desde então, eu venho fazendo as doações sempre para a Eliane. Eu até me cuido, procuro não fazer nada que atrapalhe a doação para sempre poder doar na data certa. Porque eu sei que ela depende de mim, então é um compromisso que a gente tem, mas muito gratificante”, complementa.
Fenotipagem evita reações adversas do organismo de quem recebe o sangue
A compatibilidade sanguínea é especialmente importante para os pacientes que necessitam de transfusões rotineiras. De acordo com a farmacêutica bioquímica da divisão de Produção do Hemepar, Carolina Luise Prochaska, esses pacientes têm maior chance de criar anticorpos contra o sangue recebido.
“Além de receber sangue com muita frequência, praticamente todo mês ou até menos, eles têm doenças em que o organismo é muito inflamado. Então, a probabilidade desse paciente formar um anticorpo é muito maior do que um paciente que não tem essas patologias. Assim, para esses pacientes, a gente procura mandar um sangue muito parecido com o dele, considerando esses antígenos que a gente pesquisa de rotina”, explica.
O cuidado na identificação dos antígenos reduz significativamente o risco de reações adversas no momento da transfusão. “Eles vão receber sangue uma vida toda. Então, a gente não quer que eles rejeitem esse sangue, que eles formem anticorpo contra aquele sangue. Para o organismo, sem esse cuidado, o sangue é igual a uma bactéria, um vírus, é um organismo estranho que entrou no organismo da pessoa. Então, a gente procura um sangue muito parecido com o deles”, complementa.
Processo de fenotipagem teve início há quase duas décadas
Esse processo de fenotipagem, que detecta a presença de 37 antígenos diversos, teve início há quase 20 anos e coleciona excelentes resultados desde então. Isso porque ele permite que se encontre de maneira rápida os doadores mais recomendados para cada novo paciente que precise desse atendimento continuado.
“Esse programa nosso começou em 1996, essa fenotipagem de rotina. Desde então nós temos esse banco de fenotipados. Assim, não temos que sair correndo atrás de um doador compatível, já que temos esses dados já coletados. Além disso, a gente tem uma geladeira cheia de doadores fenotipados, então temos a possibilidade de atender com rapidez esses pacientes, não só os nossos pacientes aqui do ambulatório, mas também pacientes de hospital geral. E mesmo para um paciente que sofreu trauma ou outra situação, em que acabou formando um anticorpo”, complementa.
Para os nossos pacientes regulares, agendamos os doadores para sempre ter o sangue disponível no dia da transfusão. E numa eventualidade, se esse paciente entre numa crise e precise receber sangue fora do agendamento, a gente tem uma geladeira pronta pra atender esses pacientes.
Atualmente, 12 das 23 unidades do Hemepar já fazem a fenotipagem. São as unidades maiores, capazes de atender também várias cidades próximas. Eliane, por exemplo, mora em Quitandinha, e viaja uma vez ao mês até Curitiba para receber a transfusão. Além do tempo da viagem, o processo pode durar várias horas, dependendo da quantidade de bolsas de sangue que o paciente precisa receber.
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