STJ adia julgamento sobre alcance da cobertura dos planos de saúde

por Isadora Deip
com supervisão de Giselle Ulbrich
Publicado em 23 fev 2022, às 20h38. Atualizado às 21h12.

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) adiou novamente, nesta quarta-feia (23), o julgamento que decide se os planos de saúde precisam cobrir procedimentos não inclusos na lista da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).

O objetivo era discutir se a lista de terapias definida pela agência é exemplificativa, permitindo a entrada de novos tratamentos, ou taxativa, em que só são de cobertura obrigatória os procedimentos já listados.

A suspensão aconteceu após pedido de vista coletiva, ou seja, foi solicitado mais tempo para analisar o projeto. Uma nova sessão deve acontecer em até 90 dias.

O julgamento teve início em setembro de 2021. Somente dois dos nove ministros já votaram: o relator Luiz Felipe Salomão, a favor do caráter taxativo, e Nancy Andrighi, a favor do caráter exemplificativo.

Entenda o que pode mudar

A maioria do Judiciário interpreta a lista da ANS como exemplificativa e considera que os planos de saúde devem bancar tratamentos que não estão na relação, desde que haja prescrição médica, justificativa e não sejam experimentais.

Porém, uma divergência entre turmas do STJ fez com que, agora, os ministros busquem uma interpretação definitiva para o tema.

Se o julgamento aprovar a cobertura taxativa, o Judiciário deve considerar que o que está não está na lista não deve ser coberto. Essa decisão pode impedir que diversos pacientes comecem ou deem continuidade a tratamentos com a cobertura do plano de saúde.

Protestos

Durante a sessão desta quarta (23), mais de cem mães de crianças com deficiência, como autismo e paralisia cerebral, e pessoas com doenças terminais e degenerativas, como câncer e distrofia, acorrentarem-se umas às outras na entrada do STJ, em Brasília. Os manifestantes vieram de várias partes do país e argumentam que, caso o rol taxativo seja aprovado, crianças e demais pacientes podem ficar sem tratamento. Isso porque não poderiam pagar pelos tratamentos que não constam na lista.

Em Curitiba, mães e familiares de crianças com espectro autista e de portadores de doenças raras realizaram uma manifestação em frente ao Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) contra o rol taxativo da ANS. O protesto aconteceu na manhã desta quarta.

O grupo de manifestantes foi composto por ativistas do Instituto Lagarta Vira Pupa (rede de apoio para mães, famílias e pessoas com deficiência de todo o Brasil) e outras associações de Curitiba e Região Metropolitana.

Marcos Mion e o filho autista Romeo; apresentador faz campanha em suas redes sociais para que STJ aprove o modelo “exemplificativo”. (Foto: Reprodução / Instagram)

Internet

O tema também gerou debates nas redes sociais, sobretudo com a proximidade do julgamento. O apresentador da TV Globo, Marcos Mion, pai de uma criança autista, publicou um vídeo em seu Instagram e Facebook mostrando posicionamento contrário ao rol taxativo e fazendo um apelo aos Ministros do STJ.

“Por favor, levem em conta o impacto devastador que isso pode causar na vida de milhões de brasileiros, principalmente os autistas, os PCDs (Pessoas com Deficiência), pessoas com doenças raras e até mesmo pessoas com câncer, que vão ser diretamente afetadas por isso. Uma decisão como essa não pode acontecer.”

disse o artista.

Na legenda do vídeo, Mion escreveu: “Não é possível que por trás dos ternos de Brasília não exista o mínimo de compaixão. Essa é uma causa que afeta não só a comunidade autista, mas todos os brasileiros que dependem de um plano de saúde.”

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Uma publicação compartilhada por Marcos Mion (@marcosmion)

A Agência Nacional de Saúde (ANS), se pronunciou sobre sobre o tema em questão, colocando-se contra o rol “exemplificativo”, alegando que isso pode aumentar o preço dos planos de saúde e trazer insegurança ao setor de saúde complementar. Segua na íntegra o posicionamento da Agência:

“Atualmente, o caráter do rol é taxativo por força da lei. Julgamento sobre o tema foi retomado pelo STJ nesta quarta-feira e foi adiado novamente. Em razão do julgamento do STJ a respeito de caso específico relacionado à realização de um procedimento não previsto no rol de coberturas obrigatórias dos planos de saúde, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) vem prestar alguns esclarecimentos:

1 – O Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde é a lista de consultas, exames, terapias e cirurgias que constitui a cobertura obrigatória para os planos de saúde regulamentados (contratados após 2/01/1999 ou adaptados à Lei 9.656/98). Essa lista possui mais de 3 mil itens que atendem a todas as doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde), da Organização Mundial de Saúde;

2 – Atualmente, o rol de coberturas obrigatórias elaborado pela ANS e atualizado periodicamente é taxativo por força da Lei 9.961/2000; ou seja, os procedimentos e eventos em saúde existentes nessa lista não podem ser negados pelas operadoras, sob pena de terem a comercialização de planos suspensa ou serem multadas;

3 – O caráter taxativo do rol confere a prerrogativa da ANS de estabelecer as coberturas obrigatórias a serem ofertadas pelos planos de saúde, sem que os consumidores precisem arcar com custos de coberturas adicionais. Assumir que o rol seja meramente exemplificativo significa, no limite, atribuir a cada um dos juízes do Brasil a prerrogativa de determinar a inclusão de cobertura não prevista em contrato ou no rol de cobertura mínima, o que traria o aumento da judicialização no setor de saúde e enorme insegurança ao setor de saúde suplementar, na medida em que seria impossível mensurar adequadamente quais os riscos estariam efetivamente cobertos. O que impacta na definição do preço dos produtos;

4 – Além disso, sem ter as efetivas obrigações dos planos de saúde documentadas, a ANS não teria como adotar com precisão suas ações regulatórias, como a fiscalização do atendimento das coberturas, cobrança de ressarcimento ao sus, definição das margens de solvência e liquidez das operadoras, e tantas outras ações;

5 – Importante ressaltar que a ANS vem aprimorando sistematicamente o processo de atualização do rol, tornando-o mais ágil e acessível, bem como garantindo extensa participação social e primando pela segurança dos procedimentos e eventos em saúde incorporados, com base no que há de mais moderno em ATS – avaliação de tecnologias em saúde, primando pela saúde baseada em evidências;

6 – Vale destacar ainda que, além da falta de padronização das coberturas, o caráter exemplificativo do rol – por não conferir previsibilidade quanto aos procedimentos e eventos que podem vir a ser utilizados – tenderia a elevar os valores cobrados pelas operadoras aos seus beneficiários, como forma de evitar a sustentabilidade de suas carteiras;

A ANS reitera, por fim, a plena confiança de que o Colendo STJ encontrará uma solução que promova a segurança jurídica, a estabilidade no setor de saúde suplementar, zeloso quanto a todas as garantias conquistadas pelos consumidores desde a definição do marco legal dos planos de saúde e da criação da ANS.

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