Quase 84 anos se passaram desde a fria tarde em que o Brasil entrou em campo pela primeira vez para disputar uma partida de Copa do Mundo. Nesta segunda, em Brasília, contra Camarões, a seleção brasileira escreverá o seu 100.º capítulo na competição. Único país a participar de todas as 20 edições dos Mundiais, o Brasil encantou torcedores por onde passou, colecionou taças e conquistou a hegemonia no torneio. Ao longo de mais de oito décadas, a história brasileira se misturou à trajetória da própria Copa do Mundo.

A seleção deu o pontapé inicial na competição no dia 14 de julho de 1930, em Montevidéu. Na ocasião, Brasil e Iugoslávia disputavam apenas o terceiro jogo do torneio. No acanhado Parque Central, sob os olhares de 24.059 espectadores, o Brasil acabou derrotado por 2 a 1 e viu as chances de classificação acabarem. Preguinho, atacante do Fluminense, teve a honra de marcar o primeiro dos 213 gols brasileiros em Copas. A primeira vitória viria três dias depois da estreia, diante da Bolívia, no Centenário (4 a 0).

A curta passagem da seleção no Uruguai tornou-se ainda mais rápida na Itália em 1934. Um jogo, uma derrota e retorno para casa de um time dividido pela rixa entre paulistas e cariocas. Sem nenhum entrave, o Brasil, liderado por Leônidas, chegou à semifinal do Mundial de 1938. Em uma batalha duríssima contra os italianos, a seleção foi eliminada após perder por 2 a 1. Restou, então, a conquista do terceiro lugar, diante da Suécia.

O Brasil precisou esperar 12 anos por uma nova chance, que ocorreria em solo brasileiro. O sonho do título em casa, entretanto, precisou ser adiado depois que Ghiggia calou os brasileiros presentes ou não no Maracanã. “Foi a primeira vez que eu vi meu pai chorar e foi por essa derrota. Eu tinha nove ou dez anos e lembro de vê-lo junto ao rádio. Eu o vi chorando e perguntei: por que chora papai? E ele me respondeu: o Brasil perdeu o Mundial. Essa é a imagem que tenho gravada de 50″, conta Pelé.

A derrota para o Uruguai deixou marcas profundas. O uniforme branco, por exemplo, nunca mais foi usado. No Mundial de 1954, de amarelo, o Brasil passou por outro revés até que Pelé cumprisse o que prometeu ao pai logo após a derrota de 1950. “Disse: não chore papai, eu vou ganhar esse Mundial para você. Disse simplesmente por dizer, mas, oito anos mais tarde, fui convocado para a seleção e ganhamos o título”, lembrou o Rei do Futebol em entrevista concedida pouco antes da abertura da Copa 2014.

O técnico responsável pela convocação do craque foi Vicente Feola. Conhecido pelo estilo paternal, o comandante é apontado por Zagallo como o introdutor de um novo esquema tático na seleção. “O Feola introduziu uma mudança tática no futebol brasileiro, transformando o 4-2-4 num 4-3-3″, disse ao Estado em agosto de 2011.

Zagallo, que disputava posição com Pepe e Canhoteiro, jogou a Copa como titular. Pelé, por sua vez, começou na reserva. Fora do time, assistiu à vitória do Brasil sobre a Áustria e ao empate sem gols com a Inglaterra. Precisando da vitória, Feola lançou Pelé e Garrincha no time, nos lugares de Joel e Mazzola, respectivamente. A mudança deu certo: o time bateu a União Soviética por 2 a 0 e conseguiu uma vaga nas quartas de final.

Contra o País de Gales, a genialidade de Pelé apareceu pela primeira vez. O craque fez o único gol do jogo a 17 minutos do fim e levou o Brasil às semifinais. A vitória sobre a França (5 a 2) tornou a seleção favorita ao título. Diante da Suécia, entretanto, seria preciso jogar com os uniformes azuis. Com as camisas compradas às pressas e com o distintivo costurado à mão momentos antes do jogo, o Brasil sofreu o primeiro gol, mas conseguiu virar para 5 a 2, com gols de Vavá (dois), Pelé (dois) e Zagallo.

MESMA BASE – Dos 11 titulares contra a Suécia, nove entraram em campo na primeira partida da Copa de 1962, no Chile. A campanha do bi, porém, sofreria um revés na partida seguinte, quando Pelé sentiu uma contusão na virilha esquerda. O Brasil empatou sem gols com a Checoslováquia e perdeu o craque. Depois, diante da Espanha, vitória decisiva com dois gols de Amarildo, o substituto do Rei. Mas seria o craque Garrincha que assumiria o papel de protagonista, marcando quatro gols contra Inglaterra (3 a 1) e Chile (4 a 2). Na decisão, virada após gol sofrido no começo do jogo e título com a marca de Amarildo, Zito e Vavá.

Segundo Pelé, em 1958, aos 17 anos, ele apenas “sonhava” em integrar a equipe. Em 1970, 12 anos depois, no auge da maturidade, o craque tinha “mais responsabilidade”. Àquela altura era preciso apagar o fiasco da Copa de 1966, quando o Brasil foi eliminado ainda na primeira fase. Com um time recheado de craques (eram quatro camisas 10: Gérson, Tostão, Pelé e Rivellino), a seleção venceu os seis jogos e encantou o mundo ao bater a Itália por 4 a 1 no Estádio Azteca.

Com a hegemonia na competição e o tri no México, a seleção ficou com a posse definitiva da Jules Rimet. Levantar a nova taça, porém, tornou-se um desafio. Em cinco edições, o Brasil colecionou fracassos e viu uma geração de craques ser eliminada em duas oportunidades. Se o time de Zico, Sócrates e Falcão não conseguiu ser campeão, a equipe pragmática de Carlos Alberto Parreira colocaria ponto final no jejum de 24 anos. Em 1994, o Brasil, liderado por Romário, conquistou mais um título sobre a Itália. Sem o brilho de 1970, a seleção sagrou-se campeã nos pênaltis, após um empate sem gols.

Nas duas Copas seguintes, duas finais. A primeira, na França, traz más lembranças. Contra a seleção da casa, Brasil conheceu a sua pior derrota: 3 a 0. Quatro jogadores continuaram no time para a disputa do Mundial 2002: Cafu, Roberto Carlos, Rivaldo e Ronaldo. No campo, o penta foi conquistado após os 2 a 0 na Alemanha. Antes de a Copa voltar a ser disputada no Brasil, a seleção fracassou duas vezes na tentativa de aumentar a sua hegemonia. Nas últimas duas edições, acabou eliminada nas quartas de final, contra a França e a Holanda, respectivamente. Agora, em casa, a seleção, dona de uma história centenária, poderá encontrá-los na busca pelo hexacampeonato mundial.