A preocupação sobre a evolução dessas áreas aumentou ainda mais com o sucesso da série Black Mirror, da Netflix. (Foto: Divulgação)

Especialistas analisam desenvolvimento de inteligência artificial e robótica na atualidade e explicam o que já é realidade

*Do R7

Quando a Revolução Industrial mudou completamente os processos de manufatura com máquinas e automação da produção, o mundo temia que os homens fossem substituídos pelas máquinas e perdessem espaço no mercado de trabalho.

O mesmo receio surgiu quando os computadores passaram a se popularizar em escritórios e no ambiente doméstico no fim dos anos 70.

Algumas profissões sumiram, mas outras oportunidades apareceram como alternativa, só que aplicadas a fins tecnológicos. E isso ocorre agora novamente em relação à inteligência artificial, impressoras 3D e robótica.

E a preocupação sobre a evolução dessas áreas aumentou ainda mais com o sucesso da série Black Mirror, da Netflix. Afinal, quão próximos estamos do futuro proposto pelos episódios?

A série exercita, de forma criativa, o risco de como as tecnologias, se levadas ao extremo, poderiam se tornar perigosas para as pessoas.  

A preocupação é legítima, mas talvez um pouco exagerada no curto prazo. Em uma conferência sobre o tema realizada pela ONU em 2017, o secretário-geral da Anistia Internacional, Salil Shetty, pediu um marco ético para garantir que a tecnologia seja usada para o bem.

Segundo Cassio Bobsin, CEO da Zenvia, a reflexão é importante, pois gera discussões regulatórias, mas não deve frear a evolução tecnológica como um todo.

— A tecnologia vem evoluindo tão rapidamente que, muitas vezes, é difícil acompanhar o ritmo. As melhores são aquelas que pessoas adotam em suas vidas para resolver problemas ou ter experiências legais.

Hoje, a inteligência artificial está presente no cotidiano de todos, mesmo que de forma imperceptível. Segundo Fernando Teixeira, da Adobe, a personalização na navegação na internet, chatbots (robôs usados para atendimento) e formação de algorítimos são as mais comuns no cotidiano. A tecnologia cada vez mais humanizada permite que os assistentes virtuais apoiem clientes nos processos de vendas, cobranças, suporte técnico, educação e recursos humanos.

— Automação de processos ajudam na previsibilidade de comportamento e isso vai gerar economia no futuro. Tecnologia cria valor e mão de obra qualificada. Iremos sobreviver à inteligência artificial como superamos a revolução industrial.

Uma obsessão histórica

A ideia de que os computadores poderiam servir de interlocutores em conversas com seres humanos não é nova. Foi concebida há mais de 50 anos, pelo matemático britânico Alan Turing (1912-1954).  

Naquela época, a tecnologia disponível impediu que essa ponto de vista se concretizasse.

Entretanto, agora que os assistentes virtuais inteligentes, ou AVIs, estão disponíveis no mercado, a vivacidade e a inteligência contida nos diálogos e nas expressões desses programas de computadores não deixam de causar assombro.

Os assistentes virtuais inteligentes são o resultado de avanços em diversas áreas da ciência da computação, que ocorreram nestas ultimas décadas e que se combinaram ao longo do tempo. Marildo Matta, diretor de inteligência artifical da Plusoft, diz que isso causa apreensão apenas em quem desconhece o assunto.

— Certamente a arte inspira a tecnologia, assim como a tecnologia inspira a arte. De maneira geral, somos grandes entusiastas do consumo de novas tecnologias. Entretanto, com a popularização cada vez maior da inteligência artificial, algumas pessoas ficam apreensivas porque as máquinas que eram receptivas em suas funções tornam-se ativas para nos orientar, ou mesmo nos substituir em determinadas funções. O impacto do uso da inteligência artificial nos postos de trabalho já é uma realidade, potencializando a capacidade de trabalho das pessoas ou mesmo criando novos cargos e funções, inexistentes há alguns anos.

Iremos mais longe?

Em Black Mirror, um dos episódios mais parecidos com a realidade é Nosedive (Queda Livre), da terceira temporada (2016), onde a personagem tenta melhor sua avaliação nas redes sociais através da aceitação de seus atos e posts. No entanto, quanto mais ela se esforça, pior o desempenho e suas notas caem. Apesar de o Facebook e o Instagram não terem área para avaliação do comportamento do usuário, a popularidade do perfil na rede já é uma régua que mede isso.

No episódio Be Right Back (Volto Logo), da segunda temporada (2013), um casal espera pelo primeiro filho, quando o marido morre. Com base em seu perfil nas redes sociais e outros materiais audiovisuais, um aplicativo usa uma nova tecnologia capaz de simular a voz e a personalidade dele e, na sequência, o transfere para um corpo sintético. Outros capítulos exploram a mesma premissa, como Black Museum, da última temporada, onde um prisioneiro é ressuscitado em holograma para ser exposto em um museu de criminologia.

Essa, no entanto, já é uma realidade viável. Aplicativos e startups desenvolvem mecanismos nos quais familiares e amigos possam se comunicar com seus entes queridos após a morte. Eter9, criado pelo desenvolvedor de software português Henrique Jorge, é uma rede social que funciona dessa maneira.

Outra ferramenta é Eterni.me, fundada por Marius Ursache. O serviço ainda não foi lançado, mas o plano é permitir que as pessoas interajam com seus conhecidos mortos através dos aplicativos móveis.

Marildo Matta comenta que também teremos essa presença da inteligência artificial em carros e até entregas de produtos e alimentos.

— Existem muitas tecnologias que vão se popularizar e facilitar as nossas vidas nos próximos anos. Um exemplo disso são as impressoras 3D. Assim que tivermos as questões regulatórias resolvidas, veremos drones sobrevoando nossas casas e fazendo entregas das nossas encomendas, comida ou qualquer outro objeto. Em adição, veremos que os automóveis estarão cada vez mais equipados com tecnologias autônomas até chegarem a ser 100% autônomos. A internet das coisas (IoT) estará cada vez mais presente em nossas vidas, assim como mecanismos de automação inteligentes.

Seres humanos conectados

Cassio Bobsin, por outro lado, acredita que em termos de evolução, os próximos anos serão favoráveis para o desenvolvimento dessas tecnologias em educação e saúde também. Em Black Mirror, a área hospitalar é explorada também no episódio Black Museum, onde um doutor implanta um chip para conseguir sentir os sintomas dos pacientes e aumentar a capacidade de cura.

— Outra tecnologia relevante são as terapias genéticas, que usam suas próprias células para curar doenças, sem risco de rejeição. As pesquisas estão avançando e os primeiros tratamentos devem ser aprovados nos EUA agora em 2018. Os custos ainda são proibitivos, devido à baixa escala, mas o potencial é gigantesco e pode ajudar a curar doenças impossíveis de tratar com os medicamentos atuais.

O magnata Elon Musk, através da empresa Neuralink, procura uma maneira para humanos continuarem competitivos diante da inteligência artificial. E para isso ele propõe um melhor desempenho no uso da tecnologia para o desenvolvimento humano. A ideia é ligar diretamente o cérebro humano com dispositivos tecnológicos, algo que povoa a ficção científica há décadas, e está presente nos episódios Arkangel, USS Callister e White Chrstimas. E isso pode ser realidade em breve.

Inicialmente, o projeto será dedicado a pessoas com deficiências e limitações. Porém, em oito a dez anos, a tecnologia poderia estar disponível para qualquer pessoa.

O objetivo é transformar a inteligência artificial em nuvem numa extensão do cérebro humano. O processo se daria por meio de implantes de pequenos elétrodos no cérebro que poderiam fazer o download dos nossos pensamentos. “Faremos uma fusão mais próxima entre a inteligência biológica e a inteligência artificial. Trata-se de impulsionar a velocidade de conexão entre o cérebro e a versão digital de nós mesmos”, contou confiante para o público da World Government Summit, em Dubai, em 2013.

— Se, por um lado, podemos considerar a tecnologia como algo que substitui os seres humanos, por outro, podemos também considerar que aumenta nossa capacidade de fazer o que precisamos. Pode ser que em futuro distante o ser humano não precise mais trabalhar, mas até lá temos muito trabalho pela frente.

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