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A peça “O Jornal – The Rolling Stone” é inspirada em um periódico que, em 2010, publicou uma lista com 100 nomes de homossexuais e incitou seus leitores a matá-los

“Uma peça teatral inspirada no jornal ugandense The Rolling Stone que, em 2010, publicou uma lista com 100 nomes de homossexuais e incitou seus leitores a enforcar os mencionados”. Eis um briefing que convida o público a um exercício de profunda reflexão. Saber que este espetáculo é dirigido por Kiko Mascarenhas e por Lázaro Ramos e que o elenco é formado por seis jovens atores negros (sim, é preciso citar a etnia dos artistas pela simbologia de um elenco 100% negro em um ambiente ainda dominado por brancos) podem deixar as expectativas para este encontro artístico ainda mais elevadas. E, após assistir “O Jornal – The Rolling Stone” no Festival de Curitiba, afirmo, sem dúvidas, que as expectativas são superadas já nos primeiros diálogos. Um debate com diretores e elenco, ao fim da apresentação, deixou claro que o público estava voltando para casa emocionado com o que assistiu. Engana-se quem pensa que o tema central do texto do britânico Chris Urch, traduzido por Diego Teza, seja a homofobia, ou a homossexualidade ou a homoafetividade. O tema é muito mais abrangente: é o amor. E a potência desta montagem está em nos fazer primeiro sentir, para depois refletir. “Amar você acabou com a minha vida”, diz Dembe ao namorado Sam em um momento de medo e aflição. A fala acontece quando a pressão sobre ele chega ao limite: o Jornal prestes a publicar seu nome na lista de homossexuais, colocando em risco a integridade do jovem e de seu amado e também arriscando a dignidade de sua família diante da igreja e perante a uma sociedade preconceituosa e sedenta por uma “caça às bruxas”. A partir do tema central, o amor, se desenrolam situações que nos fazem questionar sobre o seu limite. Até quando o amor que dizemos sentir pelo próximo o beneficia? “Você é um homem branco que acha que é preto. Você não merece meu irmão”, afirma Wummie a Sam, namorado de Dembe, em uma fala racista e xenofóbica. A tentativa de salvar o irmão das dores de uma relação gay seria mesmo um ato de amor? Para aumentar a pressão familiar e social, Joe, o terceiro irmão de Dembe e Wummie, é um pastor que busca na igreja o sucesso e o sustento da família após a morte dos jovens. Na mesma casa também vivem e uma espécie de tia, chamada Mama, e a filha dela, uma menina que ficou muda após um misterioso trauma. Interpretações Impecáveis Seria injusto falar sobre as interpretações que assisti neste espetáculo sem ressaltar o trabalho da intérprete de libras Elaine da S. V. Dias. Eu não compreendo a língua de sinais, mas, para além da parte técnica, a descrição das cenas feita por Elaine me encantaram. Ela estava ali, sob um foco de luz no cantinho do palco, e brilhou como os outros seis atores. Suas expressões faciais transmitiam toda carga dramática do que era encenado na peça. Ponto para o Festival de Curitiba! Selecionado entre 75 participantes  de uma oficina de cinco mil inscritos realizada por Kiko e Lázaro na TV Globo, o elenco de “O Jornal – The Rolling Stone” é preciso nas interpretações das personagens tão complexas.  A harmonia entre os atores também é digna de elogios. Em cena, ou nas coxias (visíveis ao público), fios invisíveis parecem conectá-los. Além de concentração e técnica, o mérito de André Luiz Miranda, Danilo Ferreira, Heloísa Jorge, Indira Nascimento, Marcella Gobatti e Marcos Guian está na disponibilidade. Eles se doam sem economias. Assista ao teaser da peça “O Jornal – The Rolling Stone: [youtube https://www.youtube.com/watch?v=QKkF1xSB8lA] Leia também: