Violent Femmes retoma a mistura de folk, punk e letras humoradas em novo disco

Publicado em 2 ago 2019, às 00h00.

Cotação: ★★★½

Beirando os 40 anos de carreira, o Violent Femmes é o típico caso de banda cult que quase deu certo. Descoberto pelo baixista original do Pretenders, o trio saiu da cidadezinha de Milwaukee, no estado de Wisconsin, para gravar um poderoso álbum de estreia por um selo especializado em bandas com raízes punk, cravou um hit para toda a eternidade do rock alternativo (o folkabilly “Blister In The Sun”) e seguiu uma carreira errática, marcada por constantes desentendimentos entre seus membros fundadores e uma série de discos menos potentes e marcados por alguns hiatos de inatividade e trocas de bateristas.

Hoje transformado em quarteto, o Violent Femmes acaba de soltar seu décimo primeiro álbum de estúdio. Hotel Last Resort ainda trilha pelas características principais do grupo: a promoção de um diálogo constante entre folk e punk com as letras quase sempre carregadas de bom humor e ironia. A timbragem acústica dos vilões ainda permanece forte, embora neste trabalho divida mais espaço com as guitarras – preste bastante atenção, na faixa-título, na luxuosa textura das seis cordas impressa pelo convidado especial Tom Verlaine, o mítico fundador da banda punk nova-iorquina Television. Desde 1993 sem o baterista original Victor DeLorenzo (que reduzia seu kit a apenas baquetas de escovinha uma caixa, bumbo e uma forma metálica batizada por ele mesmo de tranceaphone), a rusticidade daquela pegada que formou uma legião de fãs durante os anos 1980, permanece quase intacta, para o bem dos fãs.

Esta nova coleção de faixas vai de flertes com a poética das crônicas urbanas dylanianas (“Hotel Last Resort”; “Not OK”; “Paris To Sleep”; “This Free Ride”) ao escracho nonsense (a capella “Sleepin’ At The Meetin’”) passando por hinos para a plateia cantar junto em uníssono (“It’s All Or Nothing”), uma versão para o inglês de uma música do cancioneiro popular grego contemporâneo (“I’m Not Gonna Cry”), afiadas críticas sociopolíticas (“I’m Nothing”; a solene regravação de “God Bless America”, composta por Irving Berlin para o filme A Epopeia do Jazz, de 1938), releituras bem particulares do livro bíblico do Gênesis (“Adam Was A Man”) e o deboche para cima daquelas músicas pop que insistem em martelar sem parar o ouvinte dos seus refrãos (“Another Chorus”).

Em tempos sombrios, em que presidentes surtados se comportam como déspotas autocratas com mentalidade equivalente a das piadas da quinta série, a presença de um Violent Femmes funciona para arejar a cabeça com humor aliado a melodias facilmente assimiláveis e arranjos de deliciosa crueza. Tudo bem que Gano e Ritchie estão beirando os 60 anos de idade e não apresentam mais toda a vitalidade e pegada dos tempos joviais de “Blister In The Sun”. Mas continuam apresentando um grande refresco musical para não levar o mundo tão a sério assim.

Hotel Last Resort. Artista: Violent Femmes. Faixas: “Another Chorus”, “I Get What I Want”, “I’m Nothing”, “Adam Was a Man”, “Not Ok”, “Hotel Last Resort”, “Everlasting You”, “It’s All Or Nothing”, “I’m Not Gonna Cry”, “This Free Ride”, “Paris To Sleep”, “Sleepin’ At The Meetin’” e “God Bless America”. Tempo total: 38:09. Gravadora: [PIAS]/ForMusic. Lançamento mundial: 26 de julho de 2019.