Crítica: Enola Holmes

por TOMMO
Publicado em 28 set 2020, às 23h53.

Desde as primeiras manchetes aventadas sobre uma adaptação das aventuras de Enola Holmes da obra original de Nancy Springer, muitas expectativas foram criadas não somente por se tratar de um inédito protagonismo da irmã caçula do maior detetive da literatura, mas também por trazer um renomado elenco para dar vida aos clássicos personagens. Millie Bobby Brown, a queridinha Eleven de Stranger Things, e Henry Cavill, o atual Superman do universo cinematográfico da DC. Eles são os chamarizes do filme que mescla história de origem, investigação e debate sobre questões sociais de séculos atrás, ainda  imprescindíveis para a evolução do nosso tempo.

Em meados de 1884 na Inglaterra, Enola vive pacificamente com a sua mãe, que é uma mulher inteligente, empoderada e extremamente habilidosa. Tudo transcorria bem até que na manhã do aniversário de 16 anos da adolescente, Eudoria Holmes desaparece enigmaticamente, cabendo aos irmãos mais velhos ficarem com a sua guarda por tempo indeterminado. Sherlock e Mycroft Holmes decidem enviar Enola para uma escola de boas maneiras, o que não acontece: ela foge em busca de sua mãe, e aí temos nossa aventura sob a direção de Harry Bradbeer, premiado diretor de Fleabag e Killing Eve, e roteiro de Jack Thorne, o mesmo de His Dark Materials, ambos focados em dar grande destaque à evolução e os trejeitos da aprendiz de detetive.

A Enola de Bobby Brown é um show de carisma durante toda a rodagem. Não somente é prazeroso assistir seu desenvolvimento, seu texto perspicaz e a sua versatilidade dramática, mas a adolescente literalmente conversa com o espectador quebrando a quarta parede (prato cheio para o fandom). Funciona até dado momento, caindo sobre desgaste após uma utilização desenfreada do recurso. Quem espera por algum tipo de complexidade temática, talvez tenha que aguardar uma continuação, pois é nítido que optou-se por abordar questões como o machismo e o movimento sufragista, por exemplo, de modo que ficasse em segundo plano, a fim de preservar o tom aventuresco e “family friendly” vendido desde os primeiros dias de marketing.

Já aos entusiastas do tradicional clima investigativo do Sherlock clássico, que convida o espectador a raciocinar junto com ele, aqui vão encontrar conclusões e desfechos repletos de conveniências  e superficialidades, reforçando que não é um longa para torrar neurônios, e sim deixar se levar pela diversão.

Ainda que se trate de uma experiência com holofotes para Millie Bobby Brown, o elenco de suporte dispõe de muito espaço para brilhar. Imediatamente é possível citar a versão charmosa de Sherlock Holmes vivida por Henry Cavill, que transmite fraternidade, apreço e contracena muito bem com Enola, enquanto Mycroft, interpretado por Sam Claflin, é antagônica e representa todo o conservadorismo da época. Ainda sobre química, o interesse amoroso de Louis Partridge também é interessante e o seu personagem torna-se um paralelo satisfatório, podendo até mesmo despertar algum shipp. Já Helena Bonham Carter pouco dá as caras, mas sua presença é forte e impõe a bagagem dos Holmes. A girl power/ badass que sempre foi marca registrada da veterana.

Enola Holmes é divertido, agradável e rebuscado do ponto de vista estético. Não instiga debates super complexos, apesar de pavimentá-los bem, tampouco evoca as grandes investigações de Sherlock Holmes, diluídas pelas conveniências da narrativa, mas ainda sim é um excelente passatempo dentro do catálogo da Netflix e não há sombra de dúvidas que pode amadurecer em uma eventual sequência, que com certeza será bem-vinda por grande parte da audiência do serviço de streaming.