In-Edit Brasil promove duas semanas de festa para quem gosta de documentários musicais

Publicado em 13 jun 2019, às 00h00.

Quem é apaixonado pelo universo da música já deve ter reparado o crescimento do mercado de documentários musicais nesta última década. Com a ajuda exponencial de novas plataformas de streaming mais a solidificação de canais culturais no mercado nacional de TV por assinatura e a facilidade tecnológica, a demanda por novos títulos vem crescendo a cada ano, apesar do gênero cinematográfico ainda não ter tanta popularidade entre o público cinéfilo. Mas certamente um dos grandes responsáveis por esta abertura é o festival In-Edit Brasil, cuja décima primeira edição começou ontem à noite em São Paulo e se estende até o próximo dia 23

Para compor o cardápio da edição 2019, foram selecionados 57 títulos nacionais e internacionais, sendo a grande maioria inédita no Brasil. Na mostra Panorama Nacional, há documentários sobre Alceu Valença, Arrigo Barnabé, Edy Star, Bixiga 70, Nação Zumbi, Zuza homem de Mello, Arnaldo Antunes e Clementina de Jesus. Entre os gêneros estão o indie rock underground verde e amarelo dos anos 1990 e 2000 (com as suas guitarras em alta e bandas que cantavam em inglês), o rap feminino e a “história secreta”do pop brasileiro dos anos 1970 e 1980, que trouxe fama a artistas como Gretchen, Dudu França e Genghis Khan. Já no Panorama Mundial são traçados os caminhos das boy bands (dos Beatles aos Backstreet Boys) e dos selos fonográficos Trojan e Blue Note (com direito a assinatura do diretor alemão Wim Wenders), além da trajetória de músicos como Miles Davis, Ryuichi Sakamoto, Joan Jett e as bandas Suede e New Order.

Michael Caine em My Generation

Marcelo Aliche, criador do In-Edit Brasil, bateu um papo com o Ric Mais sobre passado, presente e futuro do festival e mais algumas de suas atrações deste ano.

Quando surgiu a ideia de fazer uma versão brasileira deste festival de documentários sobre música?

Bom, eu morei dezessete anos na cidade de Barcelona então já conhecia e gostava do In-Edit. Mas era uma época de crise econômica na Europa. Perdi clientes e freelancers. Também já estava de saco cheio com a agência de publicidade na qual estava. O trabalho não me satisfazia tanto e voltei para São Paulo, onde abri com um sócio uma empresa especializada em música e cinema. Já conhecia o pessoal do festival da Espanha de encontrá-los em porta de shows e uma ex-namorada já havia trabalhado no In-Edit. Pensei em trazer a parada para o Brasil, afinal nós somos um país reconhecidamente supermusical. O primeiro ano da experiência foi simplesmente catastrófico. No segundo, já consegui me acertar e assim o In-Edit Brasil foi evoluindo todo ano até chegar agora à décima primeira edição.

Nos últimos anos este nicho de mercado vem aumentando consideravelmente em nosso país…

Pois é, janelas enormes vem sendo abertas para quem trabalha om isso. Na TV, no cinema, mas plataformas de streaming. Pegue só a Netflix e veja a quantidade enorme de documentários musicais oferecidos para se assistir por lá… Não sei o quanto de importância nisso tudo tivemos com o In-Edit Brasil, mas com certeza alguma ajudazinha a gente deu. Tanto que hoje há respeito com o festival, programando as estreias de documentários exibidos aqui para até mesmo uma semana depois. É interessante também ver como o mercado reage depois que os filmes são apresentados pelo festival, a recepção das críticas, a procura das distribuidoras nacionais pelo material recém-exibido.

E como são feitas a seleção do material nacional e a curadoria do interacional?

Bom, a mostra brasileira oferece um sitepara que qualquer um pessoa fazer a inscrição de sua obra. Mas também não ficamos parados esperando tudo chegar. Se tem uma ou outra produção que ficamos sabendo, corremos atrás, damos um toque em quem está fazendo a obra. Sobre o material que vem lá de fora, posso dizer que há um grande circuito de feiras e festivais que muitas das obras correm. Então, a primeira seleção vem do que é feito lá por Barcelona. A curadoria interna, depois, sou eu que faço.

Do material apresentado neste ano o que mais te interessou em relação ao seu gosto pessoal?

O documentário programado para a abertura do festival, chamado My Generation, é algo sensacional. Fala daquela geração inglesa do pós-guerra que nasceu nos anos 1940 e chegou no auge dos anos 1960 em sua juventude e fazendo arte. Então havia um mundo inteirinho para se construir novamente após a destruição da Segunda Guerra Mundial. É uma obra que enfoca uma parte importante do Século 20 para a gente entender, sem falar em toda a questão do embate entre conservadores e progressistas que parece se estender até hoje.

Destaco também Blue Note Story – It Must Schwing!, sobre o selo fonográfico Blue Note, com direção do Wim Wenders. Ele é todo baseado em um trabalho de arquivo sonoro muito bom. A carência das imagens daquela época é suprida por várias animações e sequências de fotos, recortes de jornais e capas de discos. Gostaríamos muito de, inclusive,  ter podido trazer o diretor para cá, mas nesta época do ano é quase impossível. Existem muitos festivais de verão na Europa e a agenda dele fica bastante concorrida. Tem ainda When God Sleeps, que conta a história do rapperShahin Najafi. Ele é iraniano e exilado na Alemanha depois que é condenado à morte por blasfêmia, pelos fanáticos religiosos de seu país. O filme mostra a tensão enorma diária vivida por Najafi. Seus amigos tem medo de sair à rua com ele porque o perigo de vida é constante. Gostei bastante ainda do documentário sobre o Teddy Pendergrass. Para começar, vendo esse documentario eu me dei conta de já conhecia todas as músicas do cara sem saber que era ele quem cantava. Depois a sua história de vida é algo impressionante. A maneira de como isso está contado emociona.

Fazer o In-Edit é que nem fazer um desfile de escola de samba no carnaval?  Já termina a edição do ano e no dia seguinte você já está pensando no que vem depois?

Quase isso… Só que no dia seguinte ao encerramento, em 24 de junho, vou dormir sem parar. Só no dia 25 eu começo a pensar em 2020… (risos) Se bem que tem semprecoisa boa acaba ficando no meio do caminho antes mesmo do festival, como alguns documentários que não consegui, por questões de tempo, encaixar para este ano. Então, de uma certa maneira, já planejo em jogar isso para o ano que vem.

Mais informações sobre o In-Edit Brasil 2019 – como programação, locais, horários e ingressos – você encontra no site oficial. Neste ano, o evento apresenta uma novidade para quem não está na capital paulista. Através do serviço de streaming Spcine Play, alguns dos filmes programados para este In-Edit podem ser assistidos à distância.