'Turma da Mônica - Laços' conheça o live action que pode tirar zica de Maurício de Sousa

Publicado em 24 jun 2019, às 00h00.

Cotação: ★★★★

Sucesso editorial entre o público infantil que consumia as revistas em quadrinhos da Editora Abril nos anos 1970, a Turma da Mônica sempre foi bastante esperada pelos fãs em extensões para o cinema. Só que este novo passo transmídia era muito difícil de ser dado no começo, por causa dos custos e da falta de profissionais especializados em desenhos animados no Brasil até então. Em 1976, foi produzido um especial de cinco minutos para a televisão, com uma história de Natal, que a Globo exibia anualmente em sua programação de fim de ano. E mais nada.

Turma da Mônica é veterana nas telonas dos cinemas

Em 1982, Mauricio de Sousa conseguiu levar para a grande tela seu projeto. Primeira animação em longa-metragem produzida no país em dez anos, As Aventuras da Turma da Mônica adaptava, em 75 minutos, quatro histórias dos gibis para a linguagem cinematográfica. A distribuição, inicialmente, ficou centrada no eixo Rio-São Paulo e, embora não existam fontes que assegurem a arrecadação de bilheteria da época, sua recepção efusiva entre pais e filhos garantiu a produção de uma segunda obra logo na sequência.

Com uma hora e meia de duração e roteiro baseado em uma única longa trama, A Princesa e o Robô foi produzido em 1983, pegando carona no sucesso da trilogia Star Wars, de George Lucas. Lançado nas férias de janeiro do ano seguinte, o filme esbarrou na realidade da economia brasileira da época, quando a inflação superava os 100% por mês e a ida aos cinemas diminuiu consideravelmente no país. Resultado: A Princesa e o Robô teve bem menos espectadores do que a produção anterior e a empresa de Maurício decidiu dar um tempo nos caros investimentos cinematográficos.

Em 2007, já com a evolução tecnológica e as facilidades trazidas pelo cinema digital à sétima arte, aconteceu a retomada dos longa-metragens com uma nova animação, em Turma da Mônica – Uma Aventura no Tempo. Desta vez, porém, quatro pequenas histórias recheavam uma única trama, com os personagens da turminha sendo enviados por Franjinha a uma era específica em tempo e espaço. Apesar da parceria com a Disney para a distribuição, o desenho obteve recepção morna.

Corta para 2019. Depois de emplacar séries de episódios na Globo, Discovery Kids, Cartoon Network e na internet, a Maurício de Sousa Produções também colhe os frutos de novos experimentos editoriais empreendidos durante a década, já em parceria com uma terceira editora brasileira, a Panini, que adotou o universo dos quadrinhos aos poucos abandonado pela Abril e pela Globo. Flertando com a linguagem do mangá, a Turma da Mônica Jovem explode em vendagens nas bacas diante de um publico adolescente/jovem, que cresceu lendo as revistinhas e comprou a ideia da evolução temporal dos personagens. Paralelamente, a série de graphic novels desenhadas e roteirizadas por artistas independentes de todo o país, convidados especialmente para cada projeto, deu novo gás à Turma da Mônica diante dos adultos e fãs ferrenhos do universo das HQs, modificando os traços e características que marcaram os quadrinhos dos anos 1970 para cá. Foi o suficiente para fazer Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali de volta às telonas.

Estreia de Laços, o live action da Turma da Mônica, acontecerá no final de junho de 2019

Na próxima quinta-feira chegará às salas de projeção de todo o país Turma da Mônica – Laços. O novo longa-metragem do carro-chefe dos quadrinhos de Maurício de Sousa traz mais uma sintonia com a sua época: a tentativa de transformar animação em uma história live action. No lugar dos traços desenhados por especialistas em estúdios, um filme convencional com atores entrando na pele de cada personagem. A Disney anda fazendo isso há alguns anos e vem obtendo efusivas bilheterias em suas constantes novas produções. Por que não, então, tirar Mônica e seus amigos daquele formato do “cabeção” e dar vida e alma a todos eles?

A direção vem assinada por Daniel Rezende, um dos maiores montadores do cinema nacional contemporâneo e que estreou no novo cargo com o divertido Bingo: O Rei das Manhãs (que contava a história de ascensão e queda pessoal/profissional de um dos atores que interpretava o palhaço Bozo nas manhãs da programação diária do SBT nos anos 1980). E é justamente tal detalhe se transforma em um grande trunfo para este longa-metragem. Como fizera na obra anterior, Rezende mostra ter o timing certo da edição de sequências importantes para rodar as cenas com seus atores. Neste caso, em especial, leva para o movimento contínuo todo o dinamismo dos quadrinhos divididos pelos espaços em branco impressos entre eles nas páginas de livros e revistas. O diálogo entre enquadramentos, ritmo e humor dá a leveza necessária aos 97 minutos de duração de Laços.

A história vem de uma das graphic novels de maior sucesso em vendas desde o início do projeto, em 2013. Laços é a primeira produção da trilogia desenvolvida pelo casal de irmãos quadrinistas mineiros Vitor e Lu Cafaggi. A adaptação da trama para o roteiro cinematográfico também é bem sucedida. Suprimiu os períodos de flashback que estão no livro e focou a trama somente na narrativa presente, quando o quarteto foge de casa para investigar quem roubou o cãozinho verde de Cebolinha e tentar resgatar e trazer Floquinho são e salvo de volta para casa. Durante este período de alguns dias, a turma do Limoeiro – de modo mais do que natural – aproveita para estreitar ainda mais os laços de amizade que a une.

Outro ponto positivo é a ausência de elementos que determinem a contextualização das cenas assistidas em um período atual de tempo e espaço. As crianças correm soltas pelas ruas, sem a menor preocupação dos pais. As grades das casas, quando existem, são bem baixinhas. Não são usados celulares. Parece que tudo ocorre ainda dentro de toda a inocência e ingenuidades da infância vivia nos anos 1970, época em que os quadrinhos de Maurício de Sousa tornaram-se febre nacional.

Por fim há a interpretação convincente das quatro crianças que fazem Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali. Especialmente a de Giulia Benite, que incorpora o espírito da “dona da rua” dos quadrinhos e vira um Mônica plena nas telas, toda de vermelho, cheia de si e sem largar sua arma letal, o coelhinho de pelúcia azul Sansão. Completam o elenco ótimos atores em boas participações, como Rodrigo Santoro (como Louco, aquele que volta e meia aparece para atormentar o menino dos cabelos espetados), Monica Iozzi (a mãe da Mônica), Paulo Vilhena (Seu Cebola), Fafá Rennó (Dona Cebola) e Ravel Cabral (o vilão da trama).

Com tudo isso, Laços chega para tirar a zica de Maurício de Sousa nos cinemas e promete emplacar uma série de longas-metragens baseados nos clássicos personagens desenvolvidos por ele para os quadrinhos. A memória afetiva de gerações de adultos que cresceram lendo os gibis agradece. As crianças de hoje também.

Trailer oficial de Laços, o live action da Turma da Mônica

  • Turma da Mônica – Laços  (Brasil, 2019).
  • Direção: Daniel Rezende.
  • Roteiro: Thiago Dottori. Com Giulia Benite, Kevin Vechiatto, Gabriel Moreira, Laura Raseo, Rodrigo Santoro, Mônica Iozzi, Paulo Vilhena, Fafá Rennó e Ravel Cabral.
  • Paris Filmes/Downtown Filmes.
  • Duração: 97 minutos.
  • Estreia nos cinemas brasileiros: 27 de junho.