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A melhor maneira de ter um bom ano é viver a vida diariamente, pensando coletivamente e permitindo que os bons dias se acumulem, um por um

Alguma coisa está fora da ordem, fora da ordem mundial, como diz a música. Ou será a própria ordem mundial que entrou em colapso? Guerras, crises humanitárias, corrupção generalizada, injustiças, movimentos radicais. Não são poucas as notícias que nos fizeram tremer na base ao longo de 2017, tanto que tem gente disposta a não mais assistir ou ler o noticiário, tomar contato com a feia realidade que assola o Brasil e o mundo. Mas será que é isso mesmo? Isentando-nos de ver, ouvir e falar sobre os problemas, eles desaparecerão?

Quando a virada do calendário se aproxima, é comum fazer um balanço do ano que passou e projetar desejos para o que se inicia. “Sabemos que a medida do tempo é uma convenção. Entretanto, no caso dessa tradicional reflexão de fim de ano, a questão é que algo está por acabar. Estou por perder algo. E, com esse algo, todas as oportunidades que ele poderia ter representado e não aproveitei”, reflete a psicanalista Angela Valore, professora de pós-graduação em Psicologia Clínica da Universidade Positivo.

E quando essa perda envolve uma enorme sensação de impotência diante de um mundo que parece desconfigurado? Tempos tumultuados podem nos apresentar oportunidades inovadoras para mudar a forma como vemos o mundo e como nos inserimos nele. Para a psicóloga clínica e consultora de desenvolvimento pessoal e profissional Gisele Accioly, a condição humana sempre impôs dificuldades – em todas as épocas – e cabe a cada um encontrar um caminho que facilite sua relação com o ambiente externo. “A partir da vida familiar, dos amigos, colaboradores. Preenchendo-nos desse microcosmo, começamos a dar conta do macrocosmo, porque vamos deixando o individualismo de lado”, comenta.

Pesquisadora da mitologia de diversas culturas, Gisele lembra que a busca existencial – característica inerente ao homem – se perdeu ao longo do tempo, dando lugar à luta pelo poder, pelo materialismo e pela aparência. Para ela, é preciso que as pessoas busquem tornar-se indivíduos conscientes, que percebem a realidade e vivem de uma forma profunda e verdadeira, para modificar o mundo. “A maioria não enxerga o coletivo. Estamos egocentrados em conquistar o poder que a terra pode nos dar”, avalia. “Me preencher de mim mesmo é me sentir realizado quando o meu potencial está manifestado fora. Amor me realiza, trabalho me realiza e começo a dar conta da questão do que estou fazendo aqui. Jung dizia que a mudança só acontece no indivíduo.”

Usando a física nuclear como analogia, para se fazer uma mudança no núcleo atômico, é preciso muita temperatura e pressão. Forças sem precedentes estão reformulando a sociedade, a economia, a política e o nosso próprio planeta. Então, parece inteligente que cada um de nós nos percebamos como agentes dessa mudança.

Isso nos leva à questão inicial: não há como viver plenamente se blindando da realidade. Negar esse esgotamento do mundo é se isentar de ter de agir. Ele nos afeta diariamente. Lembremos que é por meio do processo de superação de desafios que desenvolvemos força. E que toda dificuldade que enfrentamos é uma oportunidade para atuar de maneira que nos dê orgulho. “Quanto maior a fantasia em relação ao que está acontecendo, mais superficial eu fico. A tentativa de não querer saber me protege de ter uma ação. Se eu perceber o que posso fazer, eu começo o movimento!”, afirma Gisele.

O ano que chega continuará repleto de desafios e todos sabemos que as mudanças não acontecem da noite para o dia. Seremos testados de maneiras que não podemos prever. “Cabe a nós decidir se consideraremos esse destino, de nunca realizarmos nada, de ter que suportar estar sempre relativamente insatisfeitos, de saber que isso é irremediável”, complementa Angela Valore. “Ou se vamos nos reconciliar com a dimensão de necessária incompletude, aceitar que é ela, e não a satisfação, que causa o nosso desejo. Porque é daí que recebemos a única força de impulsão capaz de nos ligar a algum futuro”.

Mudança profissional

Acostumada a atender profissionais que buscam recolocação e empresas que necessitam de uma mudança na sua cultura organizacional, a coach Elenice Brusque ajuda a levar a questão para o campo do trabalho. “Três competências são primordiais para não perdermos a motivação: capacidade de adaptação, habilidades de relacionamento e pensamento criativo”, diz. “Na área profissional, não há mais espaço para pessoas que agem de forma reativa. O mercado demanda cada vez mais pessoas que pensam e atuam proativamente.”

Na opinião da coach, o espírito cooperativo, colaborativo e de compartilhamento de recursos é uma tendência e deve ser praticado no dia a dia em todos os âmbitos. “[É essencial] pensar no grupo, no coletivo, no humano como um todo”, define. “Olhar o conjunto é uma grande sacada para aguentar as coisas da vida: o outro é parte de mim e eu sou parte dos outros.”

Estamos sempre superando o fosso entre a pessoa que somos e a pessoa que desejamos ser. Cada desafio vem com uma chance para demonstrar nossa força, paciência, tolerância e resolução. Não importa o que a vida nos reserve: que 2018 seja um ano de amor, encorajamento e perdão – dos outros e de nós mesmos. Como diz Woody Allen, “90% do sucesso se baseia simplesmente em insistir.”

Dicas para uma transformação prática e com sabedoria

  • Cultive algum meio de acesso ao autoconhecimento: espiritualidade, meditação, análise;
  • tire um tempo para você, diminua o ritmo;
  • cuide do seu corpo, coma bem, faça alguma atividade física, ame-se;
  • gaste tempo de qualidade com a família e os amigos. Comunique-se, mantenha contato, nem que seja pelo WhatsApp. Diga “eu te amo”. Diga às pessoas que você as aprecia;
  • tire um tempo ao longo do dia para se renovar. Dê uma volta, leia um poema ou um bom livro, ouça música, puxe papo com um desconhecido. Traga beleza e simplicidade para a sua vida;
  • limpe o que precisa ser limpo. Arrume o que precisa ser arrumado;
  • descarte o que é supérfluo – vale para roupas, objetos e até relações;
  • comprometa-se com um projeto que você realmente deseja fazer. Compromisso é o primeiro passo;
  • entregue-se a uma causa, seja voluntário em uma organização sem fins lucrativos, um grupo comunitário, sua igreja ou dê uma mão a um indivíduo que esteja precisando;
  • esforce-se para que o trabalho seja a expressão verdadeira do seu talento;
  • ria todos os dias;
  • não deixe de sonhar.

*Matéria escrita por Dani Brito e publicada originalmente na edição 206 da revista TOPVIEW.