Laurinha, de apenas 4 anos de idade, cresce sorridente entre uma travessura e outra com o pai, Dudu Braga. A relação de amor entre ambos fica evidente nas redes sociais. Na página oficial do músico no Instagram, a garota tenta explicar para o pai, que é cego, a dinâmica da brincadeira. Um dia, aprontando todas com água na garagem de casa enquanto Dudu gravava tudo pelo celular, Laurinha parou, respirou fundo e exclamou: “Pai, sente eu!”. Ela pega a mão do pai e a coloca na cabeça. Emocionado, Dudu fala: “Meu Deus, Lala, você está encharcada”.
O simples momento entre eles fez com que o músico sentisse que Laura começava a perceber que o pai não enxergava. Porém, Dudu acredita que ela não faz uma conexão com a deficiência. “É engraçado como ela não faz a ligação da deficiência com a cegueira. Para ela, a cegueira não é deficiência, é um detalhe meu, uma característica. Consegui perceber isso. Ela sabe que eu não enxergo muito bem. Tudo o que ela me mostra é com a mão. De vez em quando ela fala: papai, olha aqui. Às vezes, no celular, algum vídeo, por exemplo. A gente não nasce preconceituoso, a gente vai se tornando preconceituoso, né? E a Laurinha vê como se fosse normal ter um pai cego”, afirma o filho de Roberto Carlos.
E a deficiência visual não impediu Dudu Braga de exercer a paternidade ativa desde o início. Assim que Laura nasceu, Valeska Sostenes Silva Braga, mulher dele, teve receio em dar o primeiro banho. “O primeiro banho quem deu fui eu, porque a Valeska tinha medo por causa do cordão umbilical. Como deficiente, claro que não dá para fazer tudo, mas não quer dizer que você não poder fazer nada. Você pode fazer bastante coisa. Eu que botava ela para nanar, eu que dava o banho. E todo esse processo de conhecimento, de resgate dessa inocência da criança veio muito com a Lala para mim”, conta. Dudu tem dois filhos de um casamento anterior, Giovanna e Gianpietro.
Isolados por causa da pandemia do novo coronavírus, Dudu e a filha brincam, entre uma aula e outra da pequena. A gincana predileta do momento é a torta na cara.
Filho do primeiro casamento de Roberto Carlos com Nice Rossi, Dudu nasceu com glaucoma congênito, em 1968. Como não havia tratamento no Brasil na época, o cantor levou o filho para a Holanda. Lá, ele passou por sete cirurgias quando estava com apenas 15 dias de vida.
“Quem quiser depois ouvir aquela música do meu pai, As Flores do Jardim da Nossa Casa, na verdade, eram as flores do hospital em que estava sendo operado com 15 dias. Essa música já mostra a dor de um pai em relação ao problema do filho. Ele compôs na Holanda. Se com uma gripe dos nossos filhos a gente já fica desesperado, imagina você ter um filho com algum tipo de deficiência, né? Ninguém está preparado para isso, por mais que a gente fale. Nenhum pai e nenhuma mãe estão preparados para ter um filho com deficiência. A gente vai aprendendo a ser pai, a ser mãe, com o crescimento dos nossos filhos e a gente sempre espera o melhor. Fui criado em um lar de muito afeto. Essa relação com meu pai sempre foi de amizade, de muito amor”, declara.
O músico conseguiu enxergar até os 23 anos de idade, quando teve um descolamento de retina enquanto dirigia voltando da praia. Ele passou por diversas cirurgias no Texas, nos Estados Unidos, mas não conseguiu recuperar a visão: “A adaptação foi meio complicada. Inclusive, existem questões emocionais que são difíceis. Surfei por muito tempo e durante 10 anos não pude mais. Eu estava com 23 anos e era uma coisa que eu amava. E sinto falta de dirigir, que é uma questão que te dá liberdade”.
Dudu Braga afirma que o pai sempre o protegeu demais e, em determinada fase da vida, isso o incomodou. “Minha relação com o meu pai sempre foi emocional. Ele é um cara muito emocional, não é à toa que é um cantor que fala de amor. E eu fui criado dessa forma, pela minha mãe também. Minha mãe já é falecida há mais de 30 anos. Mas tudo o que eu queria eu tinha. Só que isso começou a me incomodar. Sempre trabalhei desde os 17 anos e senti que estava tudo muito fácil. Chamei meu pai para conversar e disse: Pai, sei que você me ama e eu te amo também, mas vou precisar aprender sozinho as coisas. Preciso saber, como deficiente visual, até onde posso chegar. A gente chorou pra caramba nesse dia no telefone, mas ele topou e falou para eu seguir em frente”, lembra.
Durante a entrevista ao Estadão, Dudu se lembrou de outras situações em que Roberto Carlos o protegia na infância. “A gente estava pescando no lago com aquela varinha de bambu, pescando lambari, bem no finalzinho de tarde, mas eu não estava pescando nada e comecei a ficar meio frustrado com isso. Aí, meu pai passou a vara de pesca dele, só que percebi que já tinha um peixe dele ali, sabe?”, relembra. Dudu tinha 4 anos de idade na época e só teve coragem de contar sua versão da história para o pai quatro décadas depois.
“Demorei 40 anos para contar para o meu pai que eu sabia que tinha me dado a vara com o peixe. Falei: Pai, amigo é amigo. Você não queria me frustrar, porque eu não estava conseguindo pescar e eu não queria te frustrar, porque você estava querendo me ajudar a pescar. Essa figura mostra a minha relação com o meu pai, que é de muito afeto. Com 25 anos, ele tentou repetir a mesma ação quando eu já não enxergava”, conta.
Dudu herdou do pai o dom musical. Hoje, ele toca bateria na banda RC na Veia, grupo que faz releitura das principais canções do rei Roberto Carlos. Neste domingo, 9, eles farão uma live na internet para homenagear do Dia dos Pais. “Sempre digo que felizes daqueles que podem ter o pai como ídolo. É muito bom ter seu pai como referência”, diz.
Perguntado se repete algum comportamento que aprendeu com o pai na criação da filha, Dudu Braga confessa: “Proteção (risos)! De vez em quando, tenho uns papos com a Valeska: Preciso parar de proteger a Lala. Ela precisa tomar uns nãozinhos, sabe? Confesso que preciso dizer mais não para ela. Eu digo que levei muitos nãos do meu pai, e isso foi muito importante para a minha criação. A gente ensina com o não, mas o sim é muito mais fácil de dizer. O sim você fala uma vez só. O não a gente tem que ficar repetindo”, brinca.
Na relação familiar, não só os filhos aprendem com os pais, mas o contrário também é verdadeiro. “Posso dizer que foi a Laurinha que me ensinou a ser pai. Não saberia ser pai sem ela. Laurinha que me ensina o que eu tenho que fazer, que faz eu refletir, pensar e repensar. Que faz eu pensar no futuro. Que faz eu entender que a vida sozinho não vale nada. Acho que essa é a lição maior. A paternidade é isso, poder estar junto sempre, mesmo quando não precisam da gente, sem sufocar”, conclui. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.