Fuerza Bruta subverte os limites de assistir ao vivo a um espetáculo

Cotação: ★★★★

Dança, música, performance, circo, teatro, show, festa, boate, luzes, batidas, fumaça, água. São vários elementos que compõem uma única apresentação do Fuerza Bruta, grupo criado em Buenos Aires e que neste semana está em Curitiba para uma temporada que se estende até domingo com várias apresentações na Pedreira Paulo Leminski (saiba mais sobre horários e ingressos aqui). Entretanto, se você quiser apontar de fato duas palavras que resumem bem o que é experiência de assistir a um espetáculo da companhia é bom ficar com surpresa e subversão.

A proposta de oferecer algo novo e inusitado já começa pelo formato oferecido aos presentes no clássico local de apresentações musicais do bairro Pilarzinho. Com capacidade limitada a mil espectadores por sessão, o Fuerza Bruta, na montagem batizada Look Up, leva as pessoas até o palco, cuidadosamente envelopado para que atrações possam surgir de todos os cantos (daí o termo “espetáculo em 360 graus”) e a plateia possa ser subvertida em suas percepções a todo instante. Não se sabe de onde surgirá aquilo para o qual os olhos possam se voltar. Pode ser da frente, de trás, de ambos os lados, do chão ou do teto. Não raro são flagrados casos de gente confusa, sem saber direito para onde olhar, ou ainda da alguém que adora uma ação dinâmica e participativa, doida para interagir fisicamente com os artistas bastante próximos e o material cênico utilizado por eles.

A plateia também fica livre para se mover para onde quiser, não só para ter visões diferentes do que está sendo encenado como ainda ter aquela experiência de arena que poucos espetáculos cênicos costumam oferecer a quem está ali para vê-los. A ousadia chega ao ponto de alternar-se a perspectiva do olhar da audiência. Logo no início, duas bailarinas surgem penduradas com um pano brilhante ao fundo, cujo foco na iluminação avermelhada pode sugerir que elas, também de roupa vermelha, estejam se banhando em sangue. O curioso é que a plateia, olhando para cima e para o lado, parece estar acompanhando tudo acima das duas artistas, como se as estivesse observando passear para lá e para cá abaixo dela, olhando simplesmente para baixo. Outra hora, uma piscina com fundo de lona transparente se rebaixa com quatro acrobatas “nadando numa piscina” – o que faz, consequentemente, que os espectadores invertam agora de posição e se sintam em uma parte mais profunda da mesma.

Quanto às brincadeiras com os sentidos, ela já começa do lado de fora, no enorme longe pré-palco montado para receber a audiência. Ali há várias opções de comida e bebida já para preparar e aguçar o paladar de quem vai entrar logo, logo. Quando as luzes se apagam começam os sons. Sirenes, buzinas e batidas eletrônicas de uma trilha preparada especialmente para o espetáculo. Tudo começa com um technotão pesado que por várias vezes transportam quem está ali para uma típica boate da noite berlinense. Depois promove-se um flerte para os lados do samba, do reggae, do ska, mas sempre com a electronica mantendo a base. Dependendo da localização dos atores e do público, ouve-se também a intervenção dos primeiros através de berros, grunhidos e efeitos sonoros produzidos ao vivo, sempre estrategicamente colocados diante da música. De vez em quando, o uso de luzes estroboscópicas ainda permite a sensação de estar diante de algo se movendo em câmera lenta. A fumaça borrifada por cima desperta o olfato. Já ao tato são reservados os elementos cênicos feitos com papel e isopor que acabam voando sobre os espectadores que cercam os atores por todos os lados. A água também acaba sobrando para muita gente e, por isso, é sempre bom estar atento a este detalhe – sobretudo no que se refere à roupa e calçado escolhido para ir à Pedreira.

Se a experiência imersiva em 360 graus torna-se o grande fascínio do espetáculo proporcionado pelo Fuerza Bruta, a única decepção vai para o tempo utilizado na noite da última terça-feira (22 de outubro). Na estreia desta temporada o tempo não chegou aos setenta minutos previstos oficialmente, no próprio site da companhia, como média de duração de uma apresentação. A sequência dos esquetes, alguns uns tanto extensos e sem muita coesão cênica com a história sugerida desde o início, também mostrou-se um tanto confusa – talvez alguns outros não possam ter sido possibilitados de vir ou ser mostrados por questões de técnica ou logística.

No saldo geral, entretanto, vale a pena ir até a Pedreira Paulo Leminski para prestigiar a primeira passagem dos argentinos por Curitiba. Afinal não é sempre que uma opção de arte, cultura e entretenimento de grande porte vem até solo paranaense para fazer você sair da caixinha. E da casinha também.

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