O Homem Invisível chega ao século 21 ainda mais aterrorizante
Cotação: ★★★★
Do que as pessoas têm medo neste século 21? Violência? Tragédias naturais? Monstros? O maior desafio do cinema de horror atual é atualizar o conceito de medo para que os filmes não pareçam datados. Após o desastroso A Múmia, a Universal decidiu mudar o rumo dos remakes dos seus monstros clássicos. A nova adaptação de O Homem Invisível acerta em cheio ao modernizar a história clássica escrita por HG Wells em 1897.
Escrito e dirigido pelo australiano Leigh Whannell, o filme acompanha Cecilia Kass (Elisabeth Moss), uma mulher que consegue fugir de um relacionamento abusivo mas ainda sente a presença do ex-marido (Oliver Jackson-Cohen) em todos os lugares. A cena inicial que acompanha a personagem fugindo de uma casa supermonitorada é um bom startpara uma história que tira o fôlego em diversos momentos.
É certeira a proposta de trabalhar com um tema tão delicado, principalmente para o público feminino. Como a ameaça do filme não pode ser vista quem assiste a ele acaba se colocando no lugar da protagonista, sempre questionando o que vê e o que escuta. Relacionamentos abusivos são muito marcados pela manipulação da realidade e em O Homem Invisível a audiência sente o mesmo medo e confusão de Cecilia enquanto a história desenrola. A capacidade de trazer o público para dentro do filme deve-se muito à grande atuação de Elisabeth Moss, que carrega boa parte das cenas sozinha e sem problema algum. O terror nos olhos da atriz olhando para o canto do quarto ou para uma poltrona são de acelerar qualquer coração.
Juntamente de uma bela trilha sonora, que eleva os momentos de tensão, a narrativa prende a todo momento. Mesmo quando “segredos” começam a ser revelados, a qualidade e o ritmo não caem. A próxima cena sempre consegue surpreender. Whannell, já experiente no terror (Jogos Mortais, Sobrenatural), consegue equilibrar sustos e calmaria, deixando sempre uma expectativa angustiante pela próxima surpresa.
Desde que foge da casa onde costumava morar com o marido, Cecilia apresenta sinais de instabilidade, mesmo antes da real perseguição começar. Sintoma comum em vítimas do abuso sofrido por ela, esta foi uma sacada inteligente para construção da protagonista, que desde o começo passa a imagem de não estar 100% bem mentalmente para os outros personagens.
Enquanto na primeira adaptação para o cinema em 1933, o foco foi o cientista e como sua invenção o levou à loucura, em 2020 Leigh Whannell escolheu outra opção. As consequências de uma invenção que deixa alguém invisível (especialmente alguém louco) são perversas em suas vítimas. A violência do filme não é gráfica: é psicológica.Cecilia vai murchando cena após cena e quem assiste a isso sente a dor de cada de golpe. O mais cruel de todo o filme é sua semelhança com a realidade. O sociopata narcisista vivido por Oliver Jackson-Cohen está em diversos lugares; por mais que mulheres denunciem, muitos parecem não ver. Essa parece ser a verdadeira ameaça invisível.
Este O Homem Invisível é um ótimo respiro para o cinema de terror. Simples e certeiro, ele aterroriza com uma violência triste e cotidiana. O diretor é um dos seletos que entendeu que o medo não precisa ser apenas fantasioso. Fora das telas, o terror também é de tirar o sono
O Homem Invisível (The Invisble Man, Austrália/EUA, 2020). Direção e roteiro: Leigh Whannell. Com Elisabeth Moss, Oliver Jackson-Cohen, Harriet Dyer. Universal Pictures. 124 minutos. Estreia nos cinemas brasileiros: 27 de fevereiro.