
Operação que investiga caso de homicídios em Tamarana (PR) também indica que suspeito contava com ajuda de amante
*Do R7
O delegado responsável por investigar uma série de assassinatos e tentativas de execuções na cidade de Tamarana, norte do Paraná, disse ao R7 que o suspeito, Marcelo Bonfim Ledo, seria bancado por comerciantes da cidade.
“Sabemos que ele é financiado por empresários e fazendeiros”, disse Ricardo Jorge, da Delegacia de Homicídios de Londrina. Ledo é investigado por 14 homicídios e oito tentativas.
A onda de assassinatos acontece há pelo menos seis anos na cidade de 15 mil habitantes. “Muitas vítimas mencionam que ele teria uma forte cobertura da Polícia Militar na cidade”, diz o delegado.
O município de Tamarana não possui uma delegacia de Polícia Civil — há apenas a cobertura da Polícia Militar. “No Paraná, apenas cidades-sede de Comarcas possuem delegado”, informou por meio de nota a Polícia Civil do Paraná.
Ledo, o suspeito, pediu licença da Polícia Militar em 2012, alegando problemas de sanidade mental de forma continuada. A reportagem do R7 procurou a defesa de Ledo desde a manhã desta segunda (29), mas ainda não obteve resposta.
De acordo com a Polícia Civil, são 22 inquéritos a serem apurados. A investigação chegou a esse número e aos detalhes dos crimes por meio de informações obtidas por um dos parceiros do policial, ouvido em esquema de colaboração premiada, realizada no dia 11 de janeiro. “Muitas vítimas fugiram da cidade e nunca compareceram à delegacia para prestar depoimento”, diz Jorge.
Uma das teses da Polícia Civil é que Ledo atuava como pistoleiro: caso alguma pessoa invadisse uma casa ou roubasse um comércio, o policial era acionado para matar o suposto criminoso. “Ele era contratado para eliminar pequenos criminosos”, diz Jorge.
A Associação Comercial e Industrial de Tamarana nega qualquer tipo de envolvimento entre o policial militar investigado e empresários da cidade. “Nunca houve nenhum tipo de relação com ele por parte dos comerciantes”, afirma a presidente da instituição que prefere não se identificar. Porém, segundo comerciantes locais que também pediram para não serem identificados, “muitos moradores da cidade ficavam aliviados quando uma dessas pessoas morria”.
A principal linha de investigação da polícia é de que Ledo atuaria como uma espécie de justiceiro na cidade, mas outras possibilidades como a disputa de território pelo tráfico de drogas também estão sendo apuradas. Isso porque, segundo a polícia, o suspeito de atuar em parceria com policial militar é um traficante local assumido. “A winchester 22 que nós apreendemos era produto de furto”, diz Jorge.
Parceria com a amante
Além do depoimento do suposto parceiro, a polícia investiga também a participação de uma amante de Ledo. “Ela será intimada para averiguar de que forma ela teria participado dos crimes”, diz o delegado.
Depoimentos indicam que a amante do policial militar fazia o trajeto de carro com ele até o local das execuções. “Uma testemunha afirma que em um dos casos ela teria efetuado o disparo”, diz Jorge. “Foi a amante que levou as armas para o empresário esconder. Ela foi indiciada por transportar armas de fogo.”
Segundo as investigações, a amante e suposta parceira de Ledo seria irmã da primeira vítima de homicídio. “João Maconha, um suposto traficante, foi a primeira vítima de Ledo e ele não permitia que a irmã tivesse um relacionamento amoroso extraconjugal com um policial militar”, afirmou Jorge. “Por isso, João Maconha teria batido nela, com o caso registrado em boletim de ocorrência, e como consequência Ledo teria matado João Maconha.”
Como tudo começou
Depoimentos revelam que ele costumava se aproximar das vítimas em um carro da marca Gol, branco e atirar com um rifle. Uma das mortes que mais chocou moradores da cidade ocorreu na praça central, em frente à prefeitura de Tamarana, em março do ano passado, às 11 horas e 20 minutos.
Segundo o inquérito policial ao qual o R7 teve acesso, a vítima foi Everson Gomes, reconhecido minutos depois pela esposa. Ela afirma que Ledo teria saído do veículo, retirado o capacete de Gomes, já caído no chão, e disparado mais três vezes.
Segundo as investigações, o rifle utilizado era um winchester calibre 22, armamento para caça, cuja bala é pequena e se deforma rapidamente ao atingir o alvo. Essas características dificultam a realização dos exames balísticos. A primeira vítima com essa arma foi Gabriel Gonçalves dos Santos, de 14 anos. “Testemunhas relatam que Ledo ganhou a arma de um fazendeiro e foi testar contra Gabriel”, diz o delegado.
De acordo com o delegado Jorge, assim que assumiu a delegacia de homicídios de Londrina, em junho do ano passado, muitas pessoas o procuraram para relatar uma sequência de mortes em Tamarana. Em setembro, uma vítima de tentativa de homicídio procurou a delegacia após ter sido alvejada por dois tiros no ombro por uma winchester.
Segundo o delegado, a vítima teria reconhecido Ledo. “Foi a primeiras pessoas que compareceu a uma delegacia e colocou isso no papel e contou toda a dinâmica.”
Armas e indícios
Entre setembro e outubro, a delegacia havia reunido indícios para a elaboração de três inquéritos. Em 23 de outubro, Ledo foi preso preventivamente. Em novembro, a delegacia levantou informações sobre a localização das armas. “Quando ele foi preso e interrogado pela primeira vez, deu como álibi que no momento em que as mortes ocorreram ele estaria no restaurante do posto de combustível da cidade”, relatou o delegado.
“A partir daí vimos que ele era bem próximo do empresário Marcelo Monteiro de Oliveira, que teria encomendado o assassinato de um adolescente por conta de uma briga de uma mulher.”
O pagamento pela tentativa de assassinato teria sido, segundo a polícia, um revólver 38. Com esses indícios, Jorge pediu a busca e apreensão na casa e no sítio do empresário. “Na chácara dele na zona rural, tinham duas bolsas com os armamentos: uma winchester com luneta e silenciador calibre 22, um revólver 38 e uma espingarda, calibre 12. Ele afirmou que as armas pertenciam ao policial militar.”
O empresário foi preso em flagrante e indiciado pelo porte das armas de uso restrito. Em depoimento à polícia, o comerciante afirma que Marcelo Ledo o procurou para guardar os armamentos.
No dia 31 de dezembro, Ledo foi solto pelo Tribunal de Justiça do Paraná, apesar dos seis mandados de prisão e cinco ações penais. “Isso gerou um grande atraso e prejuízo nas investigações. Depois de solto, uma das vítimas recebeu mensagem de um amigo alertando ‘Bonfim sabe que você prestou depoimento e vai te matar.’” Há relatos de que o policial, inclusive, teria voltado a andar armado pela cidade.
O teste balístico solicitado pela polícia civil no revólver 38, encontrado com o comerciante, revelou a arma foi utilizada para matar João Fonseca dos Santos, em fevereiro de 2017. Com o resultado, na quinta-feira (25), a polícia prendeu Ledo temporariamente no quartel da Polícia Militar, em Curitiba. A previsão é que outras testemunhas continuem a ser ouvidas até o final de fevereiro, entre elas, o prefeito da cidade.
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