Curitiba - Uma quadrilha internacional de agiotas tem aliciado comerciantes da região central de Curitiba. Com promessas de empréstimo facilitado, sem consulta a agentes financeiros, os empresários são atraídos para o esquema que utiliza juros altos e ameaças para aterrorizar os empreendedores.

As informações apuradas nessa reportagem são do produtor da RICtv Pedro Neto. Testemunhas ouvidas pelo jornalistas apontam que o esquema de agiotagem se iniciou nos últimos anos e tem ganho mais força em Curitiba, com a participação de criminosos da Colômbia e Venezuela.
O modus operandi da quadrilha consiste em entregar nos comércios do Centro de Curitiba cartões com dizeres como ‘empréstimo facilitado’, ‘pagamento por dia’ e ‘sem consulta ao SPC ou Serasa’.
Muitos desses comerciantes atraídos pela possibilidade de quitar dívidas do estabelecimento ou até mesmo ampliar o negócio aceitam esse negócio e entram em contato com os agiotas para realizarem o empréstimo.
“Isso começou em 2023, quando eu precisava de dinheiro para comprar equipamentos para o meu estabelecimento. Para fazer investimento, tentei fazer empréstimo no banco, usar o cartão, mas não consegui. Eles apareceram com um cartãozinho, com os dizeres de pagamentos diários, e a gente optou por pegar para fazer esses pagamentos, Em torno de R$ 75 a R$ 100 por dia (valor das parcelas)”, explica um comerciante vítima do esquema, que por motivos de segurança, não será identificado nessa reportagem.
O comerciante detalha que em um primeiro momento, os agiotas buscam estabelecer uma relação de amizade com os empresários, inclusive com oferecimento de valores maiores para o empréstimo. Mas quando há qualquer atraso nos pagamentos se inicia um ciclo de ameaça e violência contra os empreendedores.
“Nos primeiros meses, sim (conseguiu pagar). Mas nos próximos meses eu comecei a me enrolar e não consegui fazer os pagamentos. Começou toda a cobrança diária no estabelecimento, diziam que iam na casa, caso não houvesse pagamento. Todo dia trabalhava com o pessoal na frente do estabelecimento para buscar o dinheiro deles. Aí começou a vir pessoal com arma, ameaçando buscar produtos do comércio ou até mesmo atear fogo no comércio”, complementa o comerciante.
Dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) apontam que os micro e pequenos negócios representam 9 milhões de empresas no país, equivalentes a 27% do PIB brasileiro.
Mesmo assim, é justamente esse setor da economia que tem maior dificuldade para conseguir empréstimos e crédito junto a instituições bancárias. Assim, a quadrilha internacional de agiotas encontrou nessa parcela da população o alvo ideal para praticarem crimes.
“Hoje se você for fazer uma consulta, a maioria do pessoal que busca (empréstimo) é MEI. E o MEI ele não tanto acesso a crédito. Bancos e empresas de crédito acabam barrando esse empréstimos e o MEI acaba fazendo operação com esses caras, porque não precisa fazer consulta ao SPC e ao Serasa. Eles buscam uma saída mais fácil para pagar as contas”, completa o comerciante.
Ameaças e violência da quadrilha impactam na vida pessoal dos comerciantes

As dívidas impagáveis com os agiotas têm causado diversos impactos na vida pessoal de diversos comerciantes de Curitiba.
Um desses casos ganhou notoriedade nacional. Ao ser cobrado e ameaçado constantemente pela quadrilha, o dono de uma bicicletaria no Centro de Curitiba matou um venezuelano, que fazia parte do esquema criminoso e tinha a função de cobrar os empresários.
Em depoimento à Polícia Civil do Paraná (PCPR), uma testemunha do caso detalhou como o esquema de agiotagem da quadrilha levou a situação a esse desfecho.
“Eu vi ele trabalhando, dez, 12, 15 horas por dia, sem comer, para pagar dívidas que não se pagavam. Ele foi vítima de uma máfia que atua em todo Centro de Curitiba, na Região Metropolitana. Tudo que ele ganhava, ia para essa máfia. Eu vi ele por dois sendo diariamente extorquido e ameaçado, me dizendo que talvez não voltasse no fim do dia para casa. Eles chegavam armados, ameaçavam pegar produtos da loja. Ninguém aguentaria tudo que ele aguentou”, explica.
A testemunha ainda apontou que a dívida do dono da bicicletaria estaria na casa dos R$ 20 mil e mesmo trabalhando todos os dias no comércio ele não conseguia quitar esse valor.
O comerciante citado no início dessa reportagem também teve impactos na vida pessoal devido a dívida com os agiotas.
“Várias vezes eles foram na frente de casa. Tiravam foto para mostrar que estavam em casa. Sempre fazendo ameaças para mim e para minha família. Eu estava em um relacionamento de mais de 13 anos e infelizmente nós acabamos separando em decorrência dessas cobranças. Acabei perdendo tudo dentro de casa. Eu vendi praticamente todos os móveis, fiquei só com uma mesa, uma geladeira e uma cama para pagar os caras. Tive que sair do meu apartamento, aluguei uma quitinete e só tinha dinheiro para comer”, revelou.
Colombianos na chefia, venezuelanos na cobrança e falta de ação da polícia
A quadrilha internacional de agiotas tem no topo da estrutura criminosos colombianos, ligados com o tráfico internacional de drogas.
Esses chefes cooptam imigrantes venezuelanos para agirem como cobradores das dívidas. Mas em caso de reincidência na falta de pagamentos, são agiotas colombianos que entram em cena.
Os agiotas oferecem empréstimos com valores que variam de R$ 800 a R$ 40 mil, com pagamentos diários parcelados, mas com juros de até 40% em caso de atraso.
Em caso de reincidência no atraso das dívidas, os agiotas chegam a cobrar uma parcela a mais ou até mesmo 20% do valor total do empréstimo. Alguns comerciantes chegam a dever mais de R$ 100 mil ao grupo criminoso.
Segundo relatos de comerciantes, os venezuelanos são mais cordiais, alguns até se compadecem da situação. Por isso, os colombianos entram em cena para realizar ameaças e violências contra os empresários que não pagam as dívidas.
Essa cadeia criminal foi denunciada ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), ligado ao Ministério Público do Paraná (MP-PR), mas o GAECO não deu seguimento às investigações, ao alegar que não haviam vítimas suficientes para se identificaram e denunciarem o esquema de agiotagem.
“Eu me senti humilhado. A única esperança que a gente tem é a força pública e quando eles viram as costas para você, você se sente humilhado e largado”, finaliza um dos comerciantes lesados pela quadrilha.
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