O artista também interpretou personagens que se tornaram clássicos como o Mendigo filósofo da Praça da Alegria

O ator Jorge Loredo, criador do famoso personagem Zé Bonitinho, morreu na manhã desta quinta-feira (26), no Rio de Janeiro. Loredo tinha quase 90 anos e estava hospitalizado desde o dia 3 de fevereiro no Hospital São Lucas, no Rio. A causa da morte do ator ainda não foi confirmada.

Feio, de voz nasalada e gestos robóticos – nada parecia depreciar a imagem de Zé Bonitinho, o mais famoso e longevo personagem criado e interpretado pelo humorista.

Loredo nasceu sem grandes expectativas de longevidade em Campo Grande, no Rio, no dia 7 de maio de 1925. Aos 12 anos foi diagnosticado com osteomielite na perna esquerda, que lhe provocava uma dor constante e só foi curada na década de 1970. A enfermidade fez de Loredo foi um garoto tímido e introvertido.

Carreira

Quando completou 20 anos, o ator foi internado em um sanatório com diagnóstico de tuberculose. O que para muitos representaria o fim, foi na verdade uma reviravolta na vida do artista. Incentivado por médicos, o jovem Loredo ingressou em um grupo teatral no próprio hospital, onde descobriu sua vocação de ator.

Após receber alta, fez um teste vocacional que identificou uma tendência para “atividades exibicionistas”. Loredo procurou uma escola de teatro e queria interpretar papéis “sérios”, mas sua primeira audição foi para representar o monólogo cômico “Como Pedir uma Moça em Casamento”. Aprovado, não lhe restou outra alternativa a não ser adotar o humorismo como profissão.

Loredo deu vida a personagens que se tornaram clássicos como o Mendigo filósofo da Praça da Alegria, criado no final dos 1950 – era um vaidoso e esnobe clochard que a todos os esmoleres tratava de “meu nobre colega”.

O grande sucesso veio em 1961. Zé Bonitinho marcou definitivamente a carreira do artista. O motivo era o jogo de contradições: apesar de visivelmente um homem feio, com imensos óculos e um bigodinho delgado, Zé Bonitinho justificava o apelido e era o terror da mulherada.

Suas frases de efeito (“Mulher para mim é igual parafuso: é no arrocho”) e os motivos de seu cansaço (“Hoje beijei 999 mulheres e estou com a boca mole”) provocavam inúmeras gargalhadas dos espectadores do programa Noites Cariocas, na antiga TV Rio.

Segundo Loredo, a inspiração veio de um amigo metido a garanhão, chamado Jarbas. “Ele era uma figura, cantava todas as mulheres, parava em frente ao espelho para pentear o bigode. Eu o imitava nas festas e as pessoas se divertiam muito”, explicava.

O personagem agradava também os chamados intelectuais, a ponto de o cineasta Rogério Sganzerla ter se inspirado em Zé Bonitinho para criar as histórias dos filmes “Sem Essa, Aranha” (1970) e “O Abismo” (1978).

Trabalho jurídico

Apesar do sucesso, Jorge Loredo nunca se iludiu com a fama. Durante a semana, trabalhava como advogado, especializado em previdência social. Ele afirmou várias vezes que em 2001 viu sua renda totalmente atrelada ao trabalho jurídico, uma “retaguarda financeira” que já o salvara de situações difíceis.

“A TV é inconstante: hoje você está empregado e famoso, amanhã nem lembram seu nome”, dizia. “Atualmente, quase tudo o que ganho vem do meu escritório. Suspiro aliviado quando lembro que tenho outra profissão.”

O ator não gostava de misturar o personagem Zé Bonitinho com sua carreira de advogado, mas contava que perdera a quantidade de vezes em que flagrou um cliente com vontade de rir só de olhar para ele.

“No meu escritório, adoto uma conduta séria para não confundirem as coisas, e evito falar sobre TV com os clientes. Tenho de passar credibilidade, minhas graças como humorista são um outro negócio”, dizia. “Mas não foram poucas as vezes que clientes se surpreenderam ao me ver e até começaram a rir. Tem gente até que pede foto do Zé Bonitinho autografada depois das audiências.”