
A OAB diz que o procedimento adotado pela diretoria do presídio como ‘punição coletiva’ é irregular
*Do R7
Os cerca de 1.100 presos no CDP-1 (Centro de Detenção Provisória) de Pinheiros, conhecido como Cadeião, em São Paulo, passaram quase 20 dias trancados nas celas sem direito a banho de sol e visitas após a rebelião realizada em 24 de julho.
É o que afirmam os familiares de seis detentos ouvidos pelo R7, presos nos três raios (pavilhões) da unidade (o raio 1 esteve fechado até sexta-feira passada).
A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) diz estar ciente do procedimento adotado pela diretoria do presídio e considera a ação irregular.
“O castigo coletivo é proibido segundo diferentes tratados de direitos humanos ao qual o Brasil é signatário. É preciso individualizar as condutas. Se não é possível apontar ninguém como responsável, ninguém deve ser punido”, comenta Martin de Almeida Sampaio, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP. Para ele, a individualização das faltas é princípio básico do direito constitucional.
— No sistema penal, com a pessoa com liberdade cerceada e constante vigilância do Estado, esse direito básico deveria ainda mais ser observado.
Temendo represálias a si mesmas e a seus familiares presos, as pessoas ouvidas pela reportagem preferem não ser identificadas. Todas confirmam o procedimento, mas divergem se foram 17 ou 20 dias sem acesso ao pátio. Superlotado, a cadeia destinada a receber presos provisórios (que ainda não foram julgados), tem capacidade para 521 pessoas em quatro raios, quase um terço dos 1.348 detentos presos no dia da rebelião. Após o motim, a superlotação foi agravada com a transferência temporária de presos do raio 4 para os três demais (o raio 4 só foi reaberto na sexta passada, dia 11).
‘Nunca durante 20 dias’
A lei 7210/1984, conhecida como Lei de Execução Penal, garante ao diretor do estabelecimento prisional a aplicação de sanções disciplinares. Seu artigo 41 dá à direção autoridade para suspender visitas, contato com o mundo exterior por cartas e publicações, e “proporcionalidade na distribuição do tempo para trabalho, descanso e recreação”.
Para Ariel de Castro Alves, coordenador do Condepe (Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana), é esta “proporcionalidade” que garante aos presos o acesso aos pátios dos presídios. Leonardo Pinho, membro do Conselho Nacional de Direitos Humanos, aponta que essa restrição ao espaço é proibida.
— Uma limitação assim até poderia ser feita de modo pontual, para uma reorganização do presídio, mas nunca durante 20 dias, muito menos para muitas pessoas.
Os advogados Martin Sampaio e Leonardo Pinho ressaltam ainda que até mesmo o RDD (o mais rígido regime disciplinar) garante, pela legislação vigente, duas horas de banho de sol ao detento. “O RDD, que é o castigo máximo, e até brutal, garante isso aos presos até mesmo por saúde. Regimes menos rigorosos deveriam garantir ainda mais”, afirma Sampaio.
Segundo a defesa de um condenado, dias depois da rebelião, 36 presos da unidade foram transferidos para um presídio em Presidente Venceslau, o que, segundo ele, demonstra que haveria identificação de envolvidos na rebelião de 24 de julho e torna questionável a “punição coletiva” observada por familiares de internos do CDP-1 de Pinheiros.
Além de permaneceram trancados 24 horas por dia dentro das celas, os detentos foram proibidos de receber visitas até o dia 12 de agosto, e os envios de alimentos, vestimenta e produtos de limpeza, conhecido como ‘jumbo’, até o dia 9 de agosto. A direção do presídio, por meio da assessoria de imprensa da SAP (Secretaria de Administração Penitenciária), atribui as restrições à reforma feita no presídio após a rebelião. Conforme relatado ao R7 por um detento presente no CDP-1 no dia da rebelião, um buraco foi aberto entre os raios 1 e 4 para fugir das chamas dos colchões.
Leonardo Pinho, no entanto, questiona o período.
— Quanto tempo um pedreiro leva para tapar um buraco? Em Natal, onde houve danos estruturais graves, e a prisão de Alcaçuz permaneceu com um regime similar durante uma semana. Aqui em São Paulo o próprio governador disse que não houve problema nas estruturas, então o que justifica esse período tão longo?
Questionada na quarta-feira (16), a SAP (Secretaria de Estado da Administração Penitenciária) não se posicionou a respeito da questão até a publicação desta reportagem.
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