Bolsonaro recebe mérito indigenista em cerimônia fechada, depois de críticas à condecoração
BRASÍLIA (Reuters) – O presidente Jair Bolsonaro recebeu nesta sexta-feira (18) a medalha do mérito indigenista, concedida pelo ministro da Justiça, Anderson Torres, em uma cerimônia fechada por sua determinação e que não constava da agenda, depois de duras críticas à concessão da comenda por parte de lideranças indígenas e personalidades da área.
Um dos maiores sertanistas do país, ex-presidente da Fundação Nacional do Índio, Sidney Possuelo devolveu a medalha que havia recebido em 1987 ao saber que o presidente seria agraciado. Responsável pela demarcação da Terra Yanomami, constantemente criticada por Bolsonaro porque seria grande demais, Possuelo enviou a comenda com uma carta ao ministro da Justiça.
“Entendo, senhor ministro, que a concessão do Mérito Indigenista ao senhor Jair Bolsonaro é uma flagrante, descomunal, ostensiva contradição em relação a tudo que vivi e a todas as convicções cultivadas por homens da estatura dos irmãos Villas Boas”,
escreveu Possuelo na carta em que devolveu a medalha ao ministério.
O sertanista disse ainda que recebeu com “surpresa e natural espanto” a notícia da medalha para Bolsonaro e lembrou que o presidente, quando deputado, afirmou que a “cavalaria brasileira foi incompetente” por não ter dizimado todos os índios no país, como teria feito a norte-americana.
A deputada federal Joenia Wapichana (Rede-RR), única representante indígena no Parlamento, entrou com um projeto de decreto legislativo na Câmara para tentar anular a condecoração de Bolsonaro.
“É uma atrocidade homenagear um presidente que se opôs descaradamente aos indígenas”,
disse a deputada.
Da mesma forma, a bancada do PSOL também apresentou um decreto.
“Jair Bolsonaro recebeu a medalha do mérito indigenista a mando de si próprio. Logo ele, que trabalha dia e noite para destroçar as terras e os direitos dos povos indígenas, incentivando garimpeiros e grileiros”, disse Sâmia Bomfim, líder do partido na Câmara.
Na cerimônia, Bolsonaro foi elogiado pelo presidente da Funai, Marcelo Xavier, que também foi condecorado, e pelo ministro da Justiça.
“É leviano, extremamente leviano quem diz que há desmonte das ações em defesa dos direitos dos povos indígenas. Foi feito muito mais que no passado”, afirmou o ministro, defendendo ações de retiradas de garimpeiros de terras indígenas e contra desmatamento.
No entanto, um levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) mostra que as invasões de terras indígenas aumentou 137% apenas nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro. O assassinato de líderes indígenas cresceu 67% no mesmo período.
“O que nós sempre quisemos foi fazer com que vocês se sentissem exatamente como nós”, disse Bolsonaro na cerimônia, que pediu ao Ministério da Justiça que fosse fechada.
“Queremos que vocês façam com suas terras o mesmo que fazemos com as nossas”, completou, referindo-se ao projeto de lei enviado ao Congresso pelo governo que autoriza a mineração e a exploração agrícola e outras atividades nas terras indígenas.
Por Lisandra Paraguassu e Anthony Boadle