Morte de guarda municipal: veja o passo a passo do assassinato em Foz do Iguaçu

por Mônica Ferreira
com supervisão de Giselle Ulbrich
Publicado em 15 jul 2022, às 20h13.

O guarda municipal (GM) Marcelo Aloizio de Arruda, de 50 anos, morreu após ser baleado no último sábado (9) durante sua festa de aniversário – com a temática do Partido dos Trabalhadores (PT), em Foz do Iguaçu, no oeste do Paraná. O policial penal federal Jorge José da Rocha Guaranho, que é apoiador de um político adversário, é suspeito de fazer os disparos.

Festa de aniversário

Conforme descreve o boletim de ocorrência da Polícia Militar (PM), a confraternização acontecia na Associação Esportiva Saúde Física Itaipu. Jorge José da Rocha Guaranho chegou ao local em um Creta, acompanhado por uma mulher e uma criança.

Testemunhas disseram que o homem desceu do carro com uma arma na mão, gritou o nome de outro político e deixou o local. A festa continuou. Mas o suspeito retornou à associação, desta vez sozinho.

Ao perceber a presença do suspeito, a companheira de Marcelo Aloizio – que é policial civil – se identificou e, na sequência, Marcelo relatou que era guarda municipal. O invasor não se intimidou e atirou contra o aniversariante que também estava armado e revidou. Os dois homens foram baleados na discussão.

Socorristas do Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência (Siate) foram acionados e prestaram atendimento às duas vítimas. Marcelo não resistiu aos ferimentos e morreu. Jorge ficou gravemente ferido e foi internado em um hospital de Foz do Iguaçu.

O policial penal federal trabalha na Penitenciária de Catanduvas, no Oeste do Paraná, que fica a cerca de 200 quilômetros de Foz do Iguaçu. As duas armas, do guarda e do policial penal, foram recolhidas e encaminhadas para perícia.

O corpo de Marcelo foi encaminhado para o Instituto Médico Legal (IML) de Foz do Iguaçu.

Despedida para Marcelo Aloizio de Arruda

O velório do tesoureiro do Partido dos Trabalhadores (PT), Marcelo Aloizio de Arruda, aconteceu no domingo (10), na quadra do ginásio de esportes Sebastião Flores, no Centro de Foz do Iguaçu. Amigos e familiares de Marcelo realizaram a última despedida para o trabalhador. O caixão foi coberto por duas bandeiras, uma do PT e outra da Guarda Municipal. 

Na tarde desta segunda-feira (11), aconteceu o enterro da vítima que foi sepultada no Cemitério Municipal Jardim São Paulo, em Foz do Iguaçu. Mais de 200 pessoas acompanharam o enterro.

Investigação

Um dia após o crime, no domingo (10), a delegada Lane Cardoso relatou que a polícia começou as investigações com a suspeita de conflito político, visto que Jorge José da Rocha Guaranho se declarou apoiador de um político.

“A priori é o que estão divulgando [que ocorreu divergência política], mas a gente está investigando, tentando extrair a verdadeira motivação. O que estão divulgando é que houve um conflito político, mas a polícia tem que averiguar”,

disse a delegada.

Lane relatou que é possível que os dois envolvidos se conhecessem, mas afirmou que não há registro de histórico de brigas entre eles.

Na segunda-feira (11) o procurador-geral de Justiça, Gilberto Giacoia, determinou que o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Foz do Iguaçu se unisse às investigações do assassinato de Marcelo Aloizio de Arruda.

Em publicação, o Gaeco afirmou que irá atuar firmemente para prevenir e punir todo e qualquer atentado à liberdade de manifestação, que é um direito assegurado a todos os cidadãos e preceito fundamental para o fortalecimento do regime democrático.

Prisão preventiva

A Justiça decretou a prisão preventiva do agente penitenciário federal, Jorge José da Rocha Guaranho, apontado como autor da morte do guarda municipal, Marcelo Aloizio de Arruda. A informação foi repassada pelo coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Thiago Lisboa, durante coletiva de imprensa na segunda-feira (11).

Ao determinar a prisão preventiva do investigado, o Juízo afirmou que “resta evidenciado que o flagrado coloca em risco a ordem social, se revelando necessária a contenção cautelar para evitar a reiteração criminosa, sendo que as peculiaridades do caso concreto apontam ser imperiosa a manutenção da segregação cautelar, pois pelo que consta dos autos o flagrado, aparentemente por motivos de cunho político, praticou atos extremos de violência contra a vítima, que sequer conhecia, tendo invadido a sua festa de aniversário e após uma discussão inicial deixado o local, retornando cerca de dez minutos depois armado, efetuando na presença de diversos convidados os disparos de arma de fogo, em decorrência dos quais a vítima faleceu”.

“Vários pontos precisam ser esclarecidos. Qual razão ele esteve no local? Se existia algum motivo específico de ele estar no local. Foi apurado que o autor do fato, é membro de uma associação cuja sede é nas proximidades da região. Existe um hábito dessas pessoas que faziam parte da diretoria da associação, de fazer uma ronda nas proximidades, nós estamos verificando se de fato ele exerce esse cargo e se cabia a ele fazer essa ronda”,

disse o coordenador.

“Outro ponto importante, que vamos investigar, é se havia alguma indicação de que ali ocorria festa temática, música e afins, que vincular ao partido, se existia algo externo, que era possível ver.  Essas são respostas que ainda estamos buscando, a delegada tem trabalhado intensamente para apurar os fatos”, finalizou Thiago Lisboa.

Força-tarefa

A Secretaria de Segurança Pública do Paraná (Sesp) informou que um dia após o crime, foi formada uma força-tarefa para a condução das investigações do homicídio do guarda municipal. A delegada Camila Cecconello, chefe da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), está presidindo o inquérito policial desde a segunda-feira (11).

Uma equipe de investigadores da DHPP de Curitiba foi para Foz do Iguaçu e reforçou os trabalhos para garantir agilidade na apuração dos fatos.

Além da investigação sobre a troca de tiros que terminou com o guarda morto e o agente penal gravemente ferido, o Gaeco solicitou que seja aberto um inquérito separado para investigar as pessoas, que aparecem no vídeo de câmeras de segurança, agredindo o agente federal, já caído no chão.

Testemunhas prestam depoimentos

Até a quinta-feira (14) foram ouvidas 18 pessoas, sobre o inquérito que investiga a morte de Marcelo Arruda. Dentre as testemunhas estão pessoas que participavam da festa, familiares do guarda municipal e do agente penal federal,  Jorge José da Rocha Guaranho.

De acordo com a Sesp, o inquérito tem previsão de ser concluído na próxima terça-feira (19), mas o prazo pode ser adiantado ou atrasado, isso vai depender do andamento das apurações policiais.

A mulher de Marcelo Aloizio de Arruda prestou depoimento à Polícia Civil na terça-feira (12). Pamela Suellen Silva contou que, para relembrar todos os fatos, precisou assistir às imagens de câmera de segurança: “Eu vivi aquilo de novo, aquele momento”, afirmou.

O depoimento durou cerca de uma hora e meia. Em entrevista à equipe da RICtv, Pamela contou que ela e Marcelo não conheciam o suspeito, o agente penitenciário federal Jorge José da Rocha Guaranho, que foi baleado após atirar contra Arruda.

“Eu nem sei quem é ela, nem o Jorge, tanto que a gente foi saber quem era ele ali na porta do hospital. Até então, Marcelo tinha trocado tiro com um desconhecido. Esse conhecimento da pessoa foi posterior ao fato”,

disse Pamela.

Antes da troca de tiros entre Jorge e Marcelo, Pamela aparece conversando com o agente penal, que estava no carro acompanhado da esposa e do filho.

“Não falei nada além do que já sabem, esses são os fatos. Teve trechos assim que realmente, na hora da euforia, do nervosismo, eu não me recordava”,

disse a mulher da vítima.

O promotor de Justiça e coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) em Foz do Iguaçu, Tiago Lisboa, revelou à RICtv que, até o momento, as investigações apontam que o agente penal e a família não eram convidados da festa e não conheciam Marcelo e Pamela.

Ainda segundo a mulher da vítima, o homicídio teve motivação política. “Espero que seja levantada toda informação e seja julgado da forma como o fato aconteceu. Eu acredito que a intenção foi política”, afirmou.

Esposa do suspeito também prestou depoimento

Na terça-feira (12) a esposa de Jorge Guaranho também prestou depoimento. Segundo Tiago Lisboa, ela disse que no dia do crime o marido tinha passado no local da festa para fazer uma ronda, atitude comum feita pelos membros da associação onde ocorria a festa, segundo ela.

O que diz a defesa de Guaranho

Para os advogados de Jorge José da Rocha Guaranho, o confronto armado entre o policial penal e Marcelo Arruda não foi motivado por política.

“Nós temos certeza que não existe intolerância política.  Apesar do Seo Guaranho ter um posicionamento de direita, ele não era uma pessoa extremamente voltada a política. Por isso a motivação política é totalmente descartada. Ele foi lá para fazer a ronda de rotina que era uma coisa habitual dos sócios e diretores, que é um local que acontecem furtos. Ele foi passar lá para fazer uma ronda e aconteceu essa fatalidade”,

disse a advogada Poliana Cardoso.

Segundo os advogados, o guarda municipal teria se irritado com a presença de Jorge, que não era convidado e teria ido lá apenas para fazer uma ronda. E que o confronto só aconteceu porque Marcelo jogou pedregulhos em Jorge.

O que diz associação 

Segundo o presidente da associação, Antônio Marcos Borges de Souza, Guaranho não fazia parte da diretoria da Aresf (Associação Recreativa e Esportiva da Segurança Física), onde estava acontecendo a comemoração dos 50 anos do guarda. Ele pediu exoneração do cargo de secretário da diretoria e saiu de sua função em dezembro de 2021. 

“Ele era associado apenas. A princípio não tinha acesso às imagens, se tivesse, seria apenas pelo seu celular. A polícia está periciando o aparelho para ter as respostas”,

disse o presidente da associação Antônio Marcos Borges de Souza.

Na coletiva de segunda-feira (11) Thiago Lisboa, coordenador do Gaeco, informou que a investigação estava apurando o que o agente fazia no local e se fazia parte da diretoria, que tinha como hábito fazer rondas pelo local.

“Vários pontos precisam ser esclarecidos. Qual razão ele esteve no local? Se existia algum motivo específico de ele estar no local. Foi apurado que o autor do fato é membro de uma associação, cuja sede é nas proximidades da região. Existe um hábito dessas pessoas que faziam parte da diretoria da associação de fazer uma ronda nas proximidades, nós estamos verificando se de fato ele exerce esse cargo e se cabia a ele fazer essa ronda”,

disse o coordenador do Gaeco, Thiago Lisboa.

Sigilo nas investigações

O Ministério Público do Paraná, por meio do Gaecco requereu à Justiça a decretação de sigilo no inquérito policial que apura o assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda. O objetivo é evitar interferências externas que possam influenciar nas investigações.

No pedido o Gaeco alega que “o acesso indiscriminado aos autos de terceiros, estranhos ao fato, poderá tumultuar e interferir negativamente nas investigações, sobretudo em razão da existência de diversas diligências investigatórias ainda em curso, além de outras pendentes”. O pedido ainda está sendo analisado pelo judiciário.

Além disso, o Gaeco, que acompanha as investigações por designação do procurador-geral de Justiça, requereu, entre outros itens, que o telefone celular do investigado seja encaminhado ao Instituto de Criminalística para perícia, assim como o aparelho que gravou as imagens das câmeras de segurança no local do crime.

Motivação para o assassinato

A Polícia Civil do Paraná descartou motivação política na morte do guarda municipal. A informação foi divulgada na manhã desta sexta-feira (15) pela delegada-chefe da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), Camila Cecconello, em entrevista coletiva. O inquérito foi concluído na quinta-feira (14).

“Não temos a alegação da subjetividade desse autor. Então, é difícil nós falarmos de um crime de ódio, que ele matou pelo fato da vítima ser petista. Segundo os depoimentos, que é o que nós temos nos autos, ele [o suspeito] voltou porque se sentiu ofendido com a escalada, o acirramento da discussão entre os dois”,

afirmou a delegada.

Segundo a polícia, o agente penitenciário foi indiciado pelo crime de homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e perigo comum. Durante as investigações, foram ouvidas 17 pessoas, entre testemunhas que estavam no local dos fatos e familiares do guarda municipal e do policial penal federal. A polícia também analisou imagens de câmeras.

Conforme a delegada, o indiciado foi até o local da festa de aniversário da vítima, que tinha como temática o Partido dos Trabalhadores (PT), para provocar a vítima. “Nesse primeiro momento, fica muito claro que houve uma provocação e uma discussão em razão das opiniões políticas. Agora, quando ele retorna para casa e resolve voltar [ao local da festa], não há provas nos autos suficientes que indiquem que ele [o suspeito] voltou porque queria cometer um crime de ódio contra uma pessoa de um partido político que não dele”, explicou.

Camila disse também que o depoimento da mulher do policial penal federal alegou que o marido voltou ao local da festa, onde costumeiramente fazia rondas, porque tinha se sentido humilhado, “porque a vítima teria jogado pedras e terra no interior do carro, que teriam acertado a esposa e o filho dele”.

Agora, o inquérito será encaminhado para o Ministério Público do Paraná (MP-PR), que poderá ou não denunciar o indiciado à Justiça. Existe também a possibilidade de que a promotoria peça mais informações e diligências à Polícia Civil.

Estado de saúde do suspeito

De acordo com a Secretaria da Segurança Pública e a Polícia Civil do Paraná, Jorge Guaranho continua internado e respira com ventilação mecânica. Seu estado de saúde é estável e não há previsão de alta da Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

O agente penitenciário foi transferido de hospital na noite de segunda-feira (11). Ele estava no Hospital Municipal de Foz do Iguaçu e foi levado para o Hospital Ministro Costa Cavalcanti, onde permanece internado. A divulgação do estado de saúde do agente, para imprensa, foi bloqueada por familiares e apenas a Sesp está sendo porta-voz. Não há informação sobre o motivo da transferência.

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