Entidades do setor privado se unem para tirar ferrovia do papel: “Até 2025 o Paraná terá a ferrovia que ligará Dourados, no Mato Grosso do Sul, a Paranaguá”, garantem
Apesar da retração na economia, um dado que traz boas perspectivas é o crescimento do setor produtivo do Paraná, com destaque especial para os setores das indústrias automotivas, madeireiras e de celulose, segundo dados compilados pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social – IPARDES.
O levantamento do IBGE mostrou que o estado é o que apresentou maior crescimento industrial em junho, com 28,4%, seguido por Mato Grosso e Goiás.
Para que o setor produtivo do estado continue a apresentar bons números, representantes dos setores são enfáticos: “é muito importante que o próximo governo pense em infraestrutura”, alerta o economista da Federação das Indústrias do Paraná, Marcelo Alves.
À pedido da reportagem do Portal RICMAIS, o grupo de pesquisas “Comunicação Política e Opinião Pública” (CPOP), da Universidade Federal do Paraná, fez o levantamento do termo “infraestrutura”, nos planos de governo dos candidatos ao executivo estadual e constatou a baixa citação, com apenas, 71 aparições. Será que o assunto realmente é irrelevante para o estado? Não é o que dizem os especialistas.
Para o economista da FIEP, a economia industrial caminha melhor que a economia geral em 2018 e em 2019, não deve ser diferente: “o PIB industrial este ano deve fechar em 1,9, enquanto PIB nacional deve fechar em 1,5 e para o próximo ano, a projeção é de crescimento de 2,7%, contra 2,6% para o país”. Ainda de acordo com ele, o Paraná tem um cenário favorável, “13 milhões de desempregados não é um número fácil de engolir. No entanto, no Paraná, temos um cenário ligeiramente positivo. Entre janeiro e julho deste ano, conseguimos gerar um saldo positivo de 32 mil empregos. Somente a indústria de alimentos contratou mais de três mil pessoas e a automotiva teve saldo de 1851 vagas”.
Se por um lado a indústria automotiva é a primeira que sente a crise, por outro, foi a primeira a demonstrar recuperação, “este é um setor forte, principalmente na região metropolitana de Curitiba e também tem polos nas regiões norte e oeste do Paraná. Este setor identificou oportunidades e vem retomando o crescimentos nos últimos meses”, reforça Alves.
Na avaliação dele, quatro questões precisam de uma atenção especial do próximo governante do Paraná: Infraestrutura, educação, melhoria tributária e crédito de fácil acesso, “infraestrutura é um problema em todos os estados do país e aqui não é diferente. Precisamos de duplicações em alguns pontos, precisamos de acessos a algumas regiões, como o sudoeste e, com certeza melhoria de modal para escoamento e transporte de safras. Acredito no modal múltiplo, incluindo ferrovias”, reforça, Sobre a questão tributária, ele ressalta a importância da redução ICMS, por exemplo para tornar a produção do estado mais competitiva diante de outros estados e também para a exportação. Além disso, Marcelo Alves reforça a importância do investimento em educação: “apesar de termos um nível de empregabilidade muito interessante, precisamos de capacitação técnica”, alerta. Para ele, outro ponto muito importante é o crédito facilitado para que o empresário possa retomar o crescimento: “o nível de investimento não está alto. Precisamos que o empresário tenha acesso ao crédito fácil, em boas condições. Isto não quer dizer juro zero, mas que seja facilitado, tanto para a realização de novos investimentos, quanto para a retomada de caixa”, reforça.
Melhorar o escoamento da safra e da produção industrial
Entre os diversos problemas enfrentados em 2018, um deles acendeu o sinal de alerta: infraestrutura. A greve dos caminhoneiros em maio deste ano fez com que todos os brasileiros, de alguma forma, passasse a observar e perceber o problema. Foram litros e litros de leite jogados fora. Alimentos estragando nas estradas. Medicamentos que não chegaram às prateleiras das farmácias. Combustível que chegou a preços exorbitantes.
A diretora executiva da Vexilom, indústria do setor gráfico, comenta que o cenário para o industrial está voltando a estabilizar: “enquanto alguns segmentos caem, outros ficam em alta e isso consegue nos trazer equilíbrio”, relata. Ela conta que para evitar prejuízo aos clientes durante a paralisação de maio, medidas especiais foram tomadas: “colocamos nossa mercadoria em carros de passeio e algumas despachamos via aérea e deu tudo certo”.
Permitir que as mercadorias, tanto do campo quanto das indústrias cheguem ao destino final é um dos desafios que deve ser enfrentado pelos novos governantes do estado. Investir em infraestrutura e logística tem sido pauta há muitos anos em campanhas políticas, mas em 2018 isto deve ganhar fôlego por conta de todo o cenário vivido durante a paralisação de maio.
No Paraná, o Fórum Permanente Futuro 10 Paraná, desenvolve o estudo do Plano Estadual de Logística e Transporte do Paraná, a PELT 2035. Neste levantamento, 120 propostas de projetos e intervenções serão apresentadas, nos diferentes modais, com o intuito de implementação até 2035.
Para o economista Daniel Port, a greve de maio deste ano está sendo muito explorada politicamente para explicar o fracasso de algumas políticas públicas atrasadas ou comprometidas com alguns setores. “A defasagem da infraestrutura do Brasil advém de erros como investimentos para as Olimpíadas e o Mundial de 2014. O setor precisa ser repensado, com efeito prático. Pensarmos na reformulação dos portos, modernização das rodovias, questão da produção e distribuição da energia.
O cientista político Doacir de Quadros também acredita que o assunto deve pautar a campanha política deste ano: “Todos os candidatos da oposição (Ciro, Álvaro, Alckmin, Boulos, Marina e Haddad) se pronunciaram quanto a criar projetos e medidas para resolver os problemas, levantado durante a greve dos caminhoneiros. Somente o Meireles, que por ser situação aderiu ao discurso que negligencia a importância do tema”, ressalta.
Levantamento da Empresa de Planejamento e Logística do governo federal (EPL) mostra que 65% da carga do país é transportada por meio das rodovias, 15% ferrovias e 11% são transportados por cabotagem (quando um navio se desloca entre portos do mesmo país); 5% por hidrovias; 4% por dutovias; e 0,2% por via aérea.
Gargalos de escoamento, como resolver?
Se por um lado especialistas reforçam a necessidade do fortalecimento de alguns modais como ferroviário e náutico para o escoamento da safra, por outro, especialistas do setor de transportes terrestres afirmam que o setor também precisa de novas políticas e um olhar mais atento dos governantes. Para o especialista em transportes de cargas, Geovane Schenoveber, falta incentivo, mão de obra qualificada, mas o principal desafio para o transporte de cargas hoje é o fator custo: “hoje, com uma carga tributária abusiva, o segmento de transporte é sufocado pelo custo; são impostos abusivos sem nenhum benefício de retorno. Quem transporta sofre com a falta de segurança, estradas precárias, alta carga tributária trabalhista. Tudo isto impacta diretamente no custo”, reforça. O especialista acrescenta ainda que no país, atualmente, para poder operar, “as empresas de transporte são obrigadas a se equiparem com tecnologias caras de monitoramento, rastreamento de cargas, além de taxas de seguro enormes, em muitos casos ainda tendo que dividir o risco com as companhias”. Schenoveber diz que na avaliação dele, hoje, o principal gargalo de escoamento é a desproporção fiscal e econômica.
Para o superintendente do Instituto Tecnológico de Transportes e Infraestrutura da Universidade Federal do Paraná, Professor Eduardo Ratton, em uma análise dos modais e gargalos para escoamento produtivo no estado, quando o assunto é malha rodoviária, os principais problemas se concentram nos valores de pedágios: “são custos exagerados oriundos de contratos mal elaborados há 20 anos, onde o Estado nunca teve a coragem de rever e mesmo de exigir os investimentos programados. Tal situação impacta fortemente os custos logísticos no transporte de cargas por via rodoviária”, comenta.
Já quando o assunto é frete via ferrovia, o problema também esbarra na questão dos contratos de concessão, que segundo ele, são mal elaborados: “apresentam valores da ordem de 90% dos fretes rodoviários, quando deveriam ser de aproximadamente 50% destes valores”, alerta. Segundo ele, o motivo disso é a falta de fiscalização do governo federal e regulação adequada por parte da ANTT. “Além disso, nem mesmo a manutenção da via é realizada de forma adequada e muitos trechos foram desativados por decisão da Concessionária, sem qualquer objeção do Governo Federal”, reforça.
Segundo ele, “o trecho Curitiba – Paranaguá apresenta-se em seu limite operacional de capacidade, não sendo possível absorver o aumento de demanda. A centenária ferrovia não permite velocidades acima de 17 km/h e as composições possuem limitação do número de vagões – no máximo 60 vagões. A conhecida Ferroeste, trecho entre Guarapuava e Cascavel, apresenta prejuízos operacionais desde sua concepção e o Governo do estado do Paraná insiste em mantê-la, mesmo ciente de sua inviabilidade econômica”.
Já quando falamos em base portuária, Ratton é enfático em dizer que “ Antonina em praticamente nada contribui para a movimentação de longo curso e se atém a poucas cargas de cabotagem”. O especialista alerta também para a importância de ampliação do Porto de Paranaguá: “o Porto de Paranaguá apresenta demandas crescentes de diversos tipos de cargas e, tendo movimentado aproximadamente 50 milhões de toneladas em 2017 atingiu seu limite de capacidade; no entanto, tem-se uma projeção de quase 100 milhões de toneladas para 2030, ou seja, há a necessidade de duplicar sua capacidade de movimentação em 11 anos! Isto será possível? Todos os indicadores de investimentos do passado não permitem concluir sobre tal possibilidade, seja pela falta de agilidade dos atores envolvidos, ou mesmo pela insegurança jurídica causada pela legislação, que ao mesmo tempo em que permite investimentos privados, mas que se submete caso a caso às análises de leigos dos órgãos de controle, que estão inviabilizando o País”, avalia.
E o que podemos esperar das entidades mais impactadas pelos problemas de infraestrutura?
Entidades como Federação das Indústrias do Paraná, Federação das Empresas de Transportes de Cargas do estado (Fetranspar), Federação do Comércio do Paraná (Fecomércio), Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do estado (CREA-PR) entre outras, criaram, em conjunto o Plano Estadual de Logística em Transporte do Paraná – 2035, o PELT, que traça um panorama de obras prioritárias e necessárias para o desenvolvimento do estado. Um documento amplo, bem estruturado e que traça objetivos, que pretendem ser concluídos até 2035.
“Até 2025 o Paraná terá a ferrovia que ligará Dourados, no Mato Grosso do Sul, a Paranaguá”. A afirmação é do coordenador dos conselhos temáticos da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP), João Arthur Mhor. Ele integra o PELT – 2035 e detalhou obras prioritárias e que devem desafiar o próximo governante do Paraná ao portal RIC Mais.
Segundo Mhor, esta obra é um dos grandes desafios para o próximo chefe do executivo estadual: “atrair dinheiro para fazer as obras necessárias, vencer as amarras burocráticas para fazer os projetos ficarem de pé, conseguir os licenciamentos ambientais para as obras”, alerta. Além disso, o coordenador pontua a importância da segurança jurídica para que financiadores se interessem pela obra, “É preciso fazer o projeto bem feito, a longo prazo, sem aquele pensamento retrógrado do ‘não vai sair no meu mandato’. Para criar segurança jurídica é necessário obedecer critérios técnicos, necessário compliance, transparência nos processos”, reforça.
“Investidores chineses, japoneses e coreanos demonstraram interesse na construção dos mil quilômetros de ferrovia. Inclusive, um grupo de coreanos esteve no Paraná para fazer as medições”, conta João Arthur. Utilizando aparelhos muito modernos, conseguiram mapear a rota e avaliar a melhor forma de construir e também de obter o melhor retorno do trajeto, que deve contar com 120 vagões. Este modelo, que deve reduzir o custo do transporte em até 30% e retirar até 50% dos caminhões em longas viagens, também é benéfico para o meio ambiente: “esta composição de trem emite, por tonelada transportada, até cinco vezes menos carbono que um caminhão”, comenta o especialista.
Para ele, o que faltou até hoje para tirar o projeto do papel é dinheiro. “É uma obra cara. Deve custar cerca de R$10 bilhões. É um orçamento muito alto para os cofres públicos – tanto estadual, quanto para a União. Então, já desistimos de aguardar esta verba. Partimos para a necessidade de atrair a iniciativa privada. Um estudo foi feito para comprovar a viabilidade. Podemos garantir que nunca estivemos, nos últimos 40 anos, tão próximos da ferrovia no Paraná”. A atual ferrovia do estado foi construída em 1885, com a engenharia da época.
E o desafio rodoviário [até a construção da ferrovia] como resolver?
João Arthur Mohr pontua que, segundo estudos da PELT 2035, há falta de recursos tanto da União quanto do estado: “Ninguém é contra o pedágio. Somos contra o modelo que temos hoje, com preços abusivos”, ressalta.
O Pelt prevê um modelo “inteligente de concessão para a iniciativa privada, sem que seja com pedágio alto. Atualmente, a BR-163 é o pior trecho. É um trecho que não está pedagiado, mas que está sendo feito a duplicação [trecho entre Cascavel e Marmelândia, no oeste do estado]”.
A Federação das Indústrias do Estado do Paraná chamou os principais candidatos ao Palácio Iguaçu para expor o projeto do Pelt. Segundo Mohr, “hoje 80% das cargas movimentadas circulam por rodovias no estado. Você tendo o novo modelo implementado, você gera uma redução de custo fantástica – isso representaria redução pela metade do que é cobrado hoje. Isso faria sobrar um bilhão [de reais] por ano na economia do Paraná”.
O coordenador comentou que o modelo prevê a revisão dos contratos das concessionárias, com redução de custo pela metade e aplicação das obras prioritárias, mapeadas pelos estudos do Pelt.
Além disso, o projeto do Pelt 2035 trata de obras prioritárias para o Porto de Paranaguá e também para aeroportos. Segundo João Arthur, Curitiba está bem atendida, mas a região oeste precisa de melhorias, quando o assunto é aeroporto: “teremos um novo aeroporto oeste, a região merece. O único aeroporto que temos naquele trecho Cascavel, Toledo, fica em Cascavel. É pequeno e isso reduz a concorrência. A pista é curta. Não dá para depender somente daquele terminal. Teremos agora um aeroporto em Pato Branco. Foram feitos investimentos para viabilizar”, relata.
Ele explicou também que a pista do aeroporto de Curitiba precisa de ampliação para ter capacidade de colocar vôos internacionais: “como aqui o ar é mais rarefeito, estamos em certa altitude e isso reduz em 20% a eficiência da pista, não conseguimos seguir direto para Miami, por exemplo, como Porto Alegre. Apesar de termos o mesmo comprimento de pista que eles, aqui não conseguimos decolar com aeronave completamente abastecida, para seguir direto a Miami. Lá o ar é mais denso e melhor o empuxo”, diz.
E o porto?
Para o especialista, “o porto de Paranaguá teve vários avanços. Para o porto funcionar bem ele precisa de cinco coisas: canal de acesso adequado, berço de atracação prontos pra ele [cujas licitações estão sendo encaminhadas]. Oferta de berço para atracar e áreas adequadas para armazenar. O último ponto é a gestão profissionalizada, sem gerência política. Felizmente o Porto de Paranaguá tem andado muito bem”, relata.
De acordo com ele, as obras no porto de Paranaguá estão saindo e isso tem melhorado bastante a capacidade portuária do estado. Com o avanço da ferrovia leste oeste, com tem sido ‘batizada’, teremos muita força de escoamento produtivo.
Por: Fabiana Genestra/RICTV