SÃO PAULO/BRASÍLIA (Reuters) – O governo do presidente Jair Bolsonaro editou medida provisória sobre o mercado de combustíveis que permitirá que produtores ou importadores de etanol hidratado possam comercializá-lo diretamente com os postos, o que deverá beneficiar os consumidores com preços mais baixos, disseram autoridades nesta quarta-feira (11).

A MP permite a dispensa da intermediação de agentes distribuidores na comercialização do etanol usado pelos veículos flex, o que era obrigatório até a edição da medida, potencialmente afetando margens das distribuidoras.

De outro lado, a MP prevê um sistema “dual” de tributação, com o produtor recolhendo todos os impostos federais, “mitigando o risco de sonegação fiscal”, afirmaram em notas os ministérios de Minas e Energia e Agricultura.

A proposta, que ainda permite que o transportador-revendedor-retalhista (TRR) possa comercializar etanol hidratado, também equaliza os tributos federais incidentes no etanol anidro nacional e no importado, “corrigindo a distorção então existente”.

“Ao visar a diminuição do preço para o consumidor final, a MP oferecerá um alívio aos brasileiros e brasileiras em meio à presente conjuntura econômica”, disse a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, em referência a uma alta nos preços dos combustíveis e pressão inflacionária.

“Damos um passo importante em benefício do consumidor…”, acrescentou o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, ao discursar durante a cerimônia de assinatura da MP.

O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), entidade integrada por agentes da distribuição de combustíveis, afirmou que a associação não tem restrição à liberação da venda direta de etanol “desde que com o devido tratamento tributário que preserve a isonomia comercial e concorrencial entre os agentes econômicos, pilares para um mercado eficiente e saudável”.

“A medida trata da tributação do PIS/Cofins (tributos federais), mas o regramento do ICMS (tributo estadual) ainda há que ser acertado pelos Estados da federação”, destacou o IBP.

As medidas entram em vigor a partir do quarto mês subsequente à publicação da MP, visando propiciar aos Estados tempo suficiente para adequação à mudança proposta no tocante ao ICMS.

O Comsefaz, comitê que reúne os secretários estaduais de Fazenda, pontuou em nota que há uma discussão em curso sobre a mudança exigir lei estadual ou simples decreto por parte de cada Estado. Ainda de acordo com o Comsefaz, a venda de etanol diretamente a posto de combustível já estava de certa forma abarcada em convênio de 1997.

Já a União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), que representa as usinas no centro-sul, principal região produtora de etanol, afirmou preliminarmente não ser contra a medida, mas comentou que questões tributárias estavam sendo analisadas.

O ministro de Minas e Energia reiterou, durante o evento, que Estados deveriam colaborar com o processo de alívio de custos dos consumidores, cobrando menores tributos.

Segundo nota da Presidência da República, para não haver renúncia de receitas, o texto prevê que as alíquotas aplicáveis à venda direta de etanol serão aquelas decorrentes da soma das alíquotas atualmente previstas para o produtor ou importador com aquelas que seriam aplicáveis ao distribuidor (Lei 9.718/98).

A MP ainda retira a desoneração tributária na venda de álcool anidro importado adicionado à gasolina pelo distribuidor quando este for importador, hipótese em que não há tributação nessa adição pelas distribuidoras. “Tal proposição tem a finalidade de equalizar a incidência tributária entre o produto nacional e o produto importado”, afirmou o governo.

Fidelidade à bandeira

A MP também trata da tutela regulatória da fidelidade à bandeira nos postos de combustíveis, o que gerou protestos do IBP. Pela medida, os postos que exibem marcas de uma distribuidora poderão passar a comercializar combustíveis de outros fornecedores, desde que informado ao consumidor.

O IBP disse defender a regra atual de funcionamento do mercado de revenda de derivados, que permite a convivência entre o modelo sem exclusividade de marca e o de exclusividade, “o que assegura aos consumidores de combustíveis de todo o país a garantia de que os produtos da marca estampada nos postos tenham origem na distribuidora com a qual o revendedor mantém uma parceria comercial“.

“Este ponto é uma premissa para uma concorrência transparente e justa. Nesse sentido, o Instituto recebe com surpresa a Medida Provisória…”, declarou a associação.

Para o governo, “ao flexibilizar a denominada tutela regulatória da fidelidade à bandeira, preservando o direito do consumidor à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, a medida fomenta novos arranjos de negócios entre os distribuidores de combustíveis e os revendedores varejistas”.

Segundo o governo, a ação foi tomada a partir de deliberação do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e estudos realizados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) com o objetivo de aumentar a concorrência.

Sobre o tema, o Comsefaz afirmou que não haverá mudanças fiscais com a possibilidade de combustíveis de marcas diferentes serem vendidos por um mesmo posto, com as alterações sendo mais comerciais e logísticas do que tributárias.

“Resta saber se os postos tratarão os combustíveis de marcas diferentes nas mesmas bombas ou bombas separadas. Não obstante, a sistemática fiscal não é afetada, apenas a parte comercial”, disse a entidade.

Por Roberto Samora e Lisandra Paraguassu

(Com reportagem adicional de Gabriel Araujo em São Paulo, Marta Nogueira no Rio de Janeiro e Marcela Ayres em Brasília)

11 ago 2021, às 19h28. Atualizado às 20h45.
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