Soro para hemodiálise: risco de falta e alta de preço preocupam clínicas e especialistas

por Redação RIC.com.br
com informações da Agência Brasil
Publicado em 13 jul 2022, às 09h40.

O risco de faltar soro fisiológico em clínicas e hospitais onde pacientes com insuficiência renal fazem hemodiálise, entre outros estabelecimentos de saúde, gera preocupação em profissionais e gestores públicos em várias partes do país. Durante audiência pública que a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados realizou nesta segunda-feira (12) para tratar do risco de desabastecimento de vários medicamentos, dirigentes da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplantes (Abcdt) e da Associação dos Centros de Nefrologia de Santa Catarina (Ascene) focaram nas dificuldades para adquirir soro fisiológico, cujos preços, segundo eles, aumentaram muito além da inflação.

Representantes do Ministério da Saúde relataram que, recentemente, a pasta também enfrentou problemas para adquirir o produto que seria distribuído para estados e municípios. Segundo o presidente da Ascene, Tarcísio Steffen, a situação vem se agravando desde o fim de 2021 e há meses as entidades vêm cobrando providências urgentes das autoridades públicas federais e estaduais.

“Não há hemodiálise sem um insumo tão básico quanto o soro fisiológico, mas para se ter ideia, a maior parte das clínicas de Santa Catarina – e, segundo relatos, do Brasil – já está diluindo cloreto de potássio com água destilada a fim de fazer as sessões de hemodiálise”, afirmou Steffen, ao exibir cópias da troca de mensagens com fornecedores relatando não ter o produto para pronta entrega. Ele acrescentou que há dificuldades também no fornecimento de água destilada. “Temos que fazer algo. Como gestor, não quero viver o que vimos [a população enfrentar] em Manaus [no início de 2021, quando faltou oxigênio nos hospitais para pacientes com covid-19].”

Alta nos preços do soro

Segundo os representantes da Ascene e da Abcdt, além das dificuldades de comprar soro fisiológico, as clínicas de hemodiálise vêm enfrentando dificuldades para arcar com a alta dos preços do produto. 

Documentos apresentados durante a audiência pública indicam que bolsas de 1.000 mililitros (ml) de soro fisiológico custavam, até o fim de outubro de 2021, por volta de R$ 4,01. Em meados de abril deste ano, o insumo atingiu o preço de R$ 25. Desde então, os preços vêm variando, mas sempre em patamares acima dos R$ 21.

“Aqui temos uma cotação de preços de ontem. [Bolsa de] soro de 1.000 ml: R$ 31,40”, demonstrou Steffen exibindo uma nova mensagem no painel do plenário. “Este aumento absurdo, gerou um problema para as clínicas. Ou vai faltar soro ou vai ficar financeiramente inviável as clínicas continuarem atendendo aos pacientes já em tratamento”, acrescentou o presidente da Ascene, garantindo que, mesmo disposta a pagar os preços atualmente cobrados, a empresa em que trabalha passa por dificuldades para repor as cerca de 12 mil bolsas de soro que utiliza mensalmente.

Já o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Soluções Parenterais (Abrasp), André Francisco Ignácio, negou que os fabricantes nacionais de soros (como são conhecidas as soluções parenterais) tenham reduzido o ritmo de produção.

“Um monitoramento iniciado há 45 dias aponta que todos os fabricantes seguem produzindo com as mesmas capacidades anteriores às queixas. Temos uma situação de normalidade, satisfatória. Não há nenhuma fábrica parada neste momento e as indústrias que tinham paradas de manutenção agendadas para os próximos meses as cancelaram para manter a produção constante neste cenário em que são relatadas dificuldades para encontrar o produto no mercado”,

disse Ignácio.

O executivo da Abrasp, contudo, reconheceu a alta dos preços, embora não nos patamares relatados por Steffen, da Ascene. Segundo Ignácio, isto se deve a várias causas “complexas”, como a desvalorização do real frente ao dólar; o aumento da matéria-prima proveniente do exterior e dificuldades logísticas.

“A alta dos preços passa longe dos valores relatados e se deve, obviamente, à reação da indústria à alta generalizada dos custos de produção – cabendo destacar que o maior custo de um frasco de soro é justamente a embalagem de plástico, um item derivado do petróleo, que aumentou mais de 190% desde o início da pandemia”, argumentou Ignácio ao destacar que as consequências da pandemia explicitaram a necessidade do Brasil “restabelecer seu parque nacional de produção de insumos farmacêuticos.”

“Temos, por exemplo, uma cadeia globalizada de fornecimento de IFA [ingredientes farmacêuticos ativos] concentrada em pouquíssimos países. Alguns estudos, inclusive desta própria Casa [Câmara], concluíram que o principal problema do complexo industrial brasileiro de saúde é a dependência externa. Houve um desmanche da indústria brasileira ligada a medicamentos, principalmente dos insumos. Esta dependência externa gera os dois principais problemas que estamos sentindo hoje: a indisponibilidade de determinadas substâncias e o preço altíssimos de outros itens disponíveis para a compra.”

Diretora do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Ediane de Assis Bastos, acrescentou que a pasta tem enfrentado dificuldades para adquirir, em pregões, de forma centralizada, os estoques de alguns insumos distribuídos aos estados e municípios em caráter emergencial.

“Recentemente, fizemos um pregão para a aquisição do [chamado] kit calamidade e fracassamos na compra de soro”, disse Ediane, confirmando que desde março deste ano, o ministério vem recebendo ofícios de secretarias estaduais de saúde, associações de pacientes e de outras instituições ligadas à área da saúde relatando dificuldades no abastecimento ou mesmo a falta de vários medicamentos.

“Quase todos os ofícios que recebemos relatam a falta de dipirona e de alguns antibióticos. Diante disso, o ministério iniciou uma série de ações de articulação com o setor produtivo e os consumidores para tentarmos identificar as causas destes problemas. Esta situação já acontece desde 2019 e se intensificou em 2020 e 2021, mas para a maioria dos medicamentos adquiridos pelo ministério, já começamos a verificar uma certa normalidade”, garantiu a diretora, ao explicar que parte do problema geral – e não só do soro – foi causada pela alta dos custos de produção.

“Não estava sendo vantajoso para a indústria produzir estes medicamentos, pois os insumos estavam mais caros; os custos para importar estes medicamentos também aumentaram e o valor [de venda] não possibilitava [aos produtores] acompanhar a alta dos custos”, disse Ediane.

A representante do Ministério da Saúde lembrou que, para contornar o problema, o governo federal promulgou, em junho último, a Resolução nº 7 da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed) suspendendo temporariamente os critérios para estabelecimento de preço máximo de seis medicamentos com risco de desabastecimento (sulfato de amicacina; aminofilina; cloridrato de dopamina; dipirona; imunoglobulina e sulfato de magnésio). Além disso, prorrogou a redução do imposto de importação sobre materiais relacionados ao combate à covid-19, como a dipirona e as bolsas de soro fisiológico.

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