A comunicação familiar
As lacunas verbais
A comunicação familiar, muitas vezes é avaliada como ausente, sendo essa ausência sinalizada como o principal problema das famílias, numa referência às lacunas verbais entre os membros familiares. Pressupõe-se que os silêncios, a falta de proximidade e a restrita troca de conversa seriam evidências de falta de comunicação. Mas, será que apenas deixar de falar significa deixar de comunicar?
Não é possível deixar de comunicar
Estudos* sobre a comunicação humana apontam que a ausência de comunicação verbal não é equivalente à falta de comunicação. Os especialistas dizem que não é possível deixar de comunicar. Pois em qualquer relação humana sempre há algum tipo de comunicação em andamento, que é uma variante de elementos comunicacionais que ultrapassa em muito a fala verbal.
A variante de elementos comunicacionais
Essa inclui toda uma metacomunicação, que acompanha tanto o verbal como o não verbal, como os gestos, o tom de voz, os comportamentos e as atitudes. Até mesmo os distanciamentos, as ausências e o silêncio comunicam. Inclusive há silêncios que gritam mais alto do que certas falas. Podem comunicar ao outro, diante de quem é exercido o silêncio, que não é digno da troca de conversa, nem mesmo da presença ou de qualquer intenção de se relacionar.
A comunicação familiar
A partir desse entendimento, percebe-se que a comunicação humana ultrapassa as verbalizações e sempre está, massivamente, presente em qualquer relação humana.
A COMUNICAÇÃO HUMANA ENVOLVE TODA UMA CONDUTA, UMA POSTURA, QUE FARTAMENTE COMUNICA E INEVITAVELMENTE AFETA A RELAÇÃO CONTEXTUAL EM QUE PESSOAS INTERAGEM.
Para a comunicação familiar, algumas famílias e casais adotam posturas de afastamento, como estratégia de evitação de conflito. Certas pessoas até mesmo dizem: “eu não gosto de briga, então eu não falo nada ou simplesmente caio fora”. No entanto, a conduta de “não falar nada”, e simplesmente “cair fora”, pode comunicar ostensivamente que as pessoas com as quais se convive não são dignas do investimento de energia para a resolução de incômodos e desconfortos relacionais.
NÃO CONVERSAR COM O CÔNJUGE, COM OS PAIS, COM OS FILHOS E DEMAIS FAMILIARES PODE COMUNICAR MUITA COISA. por exemplo, PODE COMUNICAR FALTA DE AMOR, INDIFERENÇA, NARCISISMO OU MESMO INABILIDADE DIALÓGICA, MAS JAMAIS SE CONFIGURA EM AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO.
Portanto, o principal problema das famílias não é a falta de comunicação.
O que falta é o diálogo
O diálogo é um poderoso recurso da comunicação humana que auxilia a desvendar os elementos subjetivos presentes na conduta, esses que, por vezes, se apresentam contraditórios ao exposto verbalmente. O diálogo também se mostra como um recurso milagroso para a comunicação familiar.
O DIÁLOGO SE PROCESSA EM UM FALAR E ESCUTAR EM RECIPROCIDADE.
Mas, não é qualquer tipo de fala e escuta. A fala deve ser assertiva. Nela se tem o direito de dizer o que se sente e o que se pensa, mas deve-se fazê-lo sem ofender o outro. A escuta, por sua vez, precisa ser empática, de forma a levar em consideração as perspectivas do outro também, não somente as suas.
O DIÁLOGO FAVORECE O RESPEITO E O AMOR PARA SE FAZER ACORDOS, DESFAZER MAL-ENTENDIDOS, DISSOLVER MÁGOAS E IMPLEMENTAR REGRAS E LIMITES MAIS JUSTOS PARA A CONVIVÊNCIA FAMILIAR.
O diálogo também nos salva de posturas narcisistas. Nos livra de acharmos que somos uma espécie de “deus”, que tem habilidades para ler pensamentos e sentimentos alheios. Quem acha que é “deus”, geralmente julga já saber tudo sobre o outro, sem nem mesmo escutá-lo.
A conduta que favorece o diálogo
Finalizo aqui com o sábio conselho do professor Dr. Carlos Hernandez (psiquiatra Argentino) para uma postura dialógica: “Do outro nada sei a não ser que ele me conte”. Essa sim, é uma conduta que favorece o diálogo para a comunicação familiar, pois transmite abertura, interesse, respeito, aceitação e amor. Dessa forma, por essa via, pode-se acionar verdadeiros milagres no convívio conjugal e familiar.
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*WATZLAWICK, Paul; BEAVIN, Janet Helmick; JACKSON, Don D. Pragmática da comunicação humana: um estudo dos padrões, patologias e paradoxos da interação. São Paulo: Cultrix, 2007.