Ilha do Marajó: tudo que se sabe sobre o caso

por Mariana Gomes
com supervisão de Giselle Ulbrich
Publicado em 22 fev 2024, às 21h54. Atualizado às 22h01.
POST 9 DE 12

O caso de exploração sexual infantil na Ilha do Marajó, no Pará, tomou conta das redes sociais e da preocupação pública. Contudo, o assunto não é novidade no Brasil. A linha do tempo da Ilha do Marajó começa ainda nos anos 2000. Confira tudo o que se sabe sobre a Ilha do Marajó.

2006: Primeira acusação

O primeiro registro sobre as acusações de exploração infantil na região surgiu em 2006. A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados abriu inquérito por conta das acusações. Os documentos da época apontavam o suposto envolvimento de políticos da região no caso da Ilha do Marajó. As meninas do local seriam levadas para se prostituir em Belém e Guiana Francesa.

2010: CPI do Marajó

Em 2010, os abusos que aconteciam na Ilha do Marajó se tornaram tema de comissões locais. Isso levou o senado a realizar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para tratar o assunto.

A CPI discutiu dezenas de denúncias de casos de violência sexual contra crianças e adolescentes no arquipélago. Alguns parlamentares citaram o caso do ex-deputado Luiz Afonso Sefer, acusado de adotar uma criança de 9 anos e estuprá-la. Anos depois, saiu a condenação de 20 anos de prisão a Sefer por estupro de vulnerável.

O senado também falou sobre a “rota da exploração sexual da região”. Ela abrangia os municípios de Gurupá, São Sebastião da Boa Vista, Breves, Curralinho, Muaná e Portel. Essa “rota” seria a de embarcações que passavam pela Ilha do Marajó para Manaus, onde acontecia exploração sexual de crianças.

2017: Reportagem da Record TV

Em 2017, a Record TV fez uma reportagem sobre a exploração infantil na Ilha do Marajó. A matéria mostrava a situação de extrema pobreza do local. Este seria o motivo em que crianças e adolescentes se entregavam à exploraão sexual. Em troca dos abusos, os menores recebiam dinheiro, comida ou até mesmo óleo diesel. 

O óleo diesel é chamado de “ouro negro” na Ilha do Marajó, de tão caro na região. Um registro da reportagem mostrava cinco meninas correndo atrás de um barco cheio de caminhões. Segundo a apuração, os caminhoneiros costumavam oferecer dinheiro e recursos em trocas de favores sexuais.

2022: Damares Alves fala em culto evangélico

O assunto ressurgiu em 8 de outubro de 2022, em meio às eleições. A então ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, se pronunciou sobre a Ilha do Marajó em um culto evangélico. Damares relatou que crianças da Ilha do Marajó tinham seus dentes arrancados para facilitar o sexo oral. Falou ainda que elas se alimentavam de comida pastosa para o intestino “ficar livre” para o sexo anal. 

Contudo, por ter citado Jair Bolsonaro (PL), então Presidente da República e candidato para reeleição, o discurso foi visto como tentativa de auxiliar Bolsonaro a vencer as eleições de 2022. “Bolsonaro disse: ‘nós vamos atrás de todas elas’, e o inferno se levantou contra este homem”, discursou Damares. 

Isso fez com que o Ministério Público Federal ajuizasse uma ação civil pública contra Damares. Segundo a ação, a senadora e a União deveriam indenizar a população do Arquipélago do Marajó (PA), pagando R$5 milhões por danos sociais e morais. O valor seria revertido para projetos sociais da região.

A ação, além de afirmar que a ex-ministra havia gerado danos aos moradores da Ilha do Marajó com a “informação falsa”, também acrescentou que a declaração serviu de palanque político em favor de Bolsonaro.

2023: Pronunciamento de Damares Alves no Plenário

Entretanto, mesmo depois da derrota de Bolsonaro nas urnas em 2022, Damares continuou falando sobre a Ilha do Marajó. Em 26 de setembro de 2023, a senadora se pronunciou sobre o tráfico de crianças na região.

Damares relatou ter recebido mensagens de moradores da região denunciando o desaparecimento de uma criança de dois anos na cidade de Anajás, no dia 19 do mesmo mês. Ela afirmou que havia indícios de que a menina era vítima de tráfico infantil.

A senadora também trouxe dados da ONU e do Conselho Federal de Medicina sobre o assunto. Segundo os órgãos, cerca de 50 mil casos de tráfico infantil ocorreram entre 2019 e setembro de 2023. Além disso, 42 mil desaparecimentos foram registrados no primeiro semestre de 2023.

Damares encerrou sua fala informando que apresentaria um requerimento solicitando que senadores visitassem a Ilha do Marajó. O intuito da visita seria avaliar o programa de enfrentamento à exploração sexual de crianças e adolescentes do governo Lula. “Nós queremos saber como é que está o avanço desse programa, como é que está a proteção das crianças na Ilha do Marajó”, disse Damares.

2023: Programa Cidadania Marajó

O programa citado por Damares é o Cidadania Marajó, implementado em maio de 2023. Segundo o site O Globo, o programa foi implementado pelo governo federal para substituir o projeto de Damares Alves criado durante o governo Bolsonaro, “Abrace o Marajó”.

Em colaboração com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o programa busca promover atividades de escuta, prestação de serviços à população e diagnosticar a necessidade de implantar medidas socioambientais no local. Para denúncias relacionadas à violação de direitos humanos, a pasta utiliza a ouvidoria Disque Direitos Humanos (Disque 100).

2024: Aymeê Rocha e o “Evangelho de Fariseus”

O assunto parecia ter sumido do foco nacional, até o surgimento da música “Evangelho de Fariseus”. Aymeê Rocha, cantora e compositora da canção, se apresentou no reality show gospel Dom Reality com a canção em 16 de fevereiro de 2024.

Entre outros assuntos, a música citou as explorações sexuais de crianças que ocorrem na Ilha do Marajó. “Enquanto isso, no Marajó, o João desapareceu esperando os ceifeiros da Grande Seara”, cantou Aymeê. Ao fim da canção, a paraense revelou que crianças na Ilha do Marajó chegam a se prostituir por R$5 reais para turistas. 

Dias depois da apresentação no Dom Reality, Aymeê revelou em seus stories que se sentia chamada por Deus para compor a música. “Lembro de quando nasceu ‘Evangelho de Fariseus’, eu jogada no chão do meu banheiro, chorando vidas por horas e horas. Um choro amargo”, escreveu.

2024: Apoios e críticas a Aymeê

A visibilidade que Aymeê trouxe sobre o assunto foi acompanhada por críticas. Um exemplo é o pastor Ciro Sanches Zibordi, que chamou a canção de “apenas uma crítica generalizante”. 

Zibordi disse que a música de Aymeê colocava “tudo no mesmo bojo”, o que poderia comprometer a imagem da Igreja no Brasil. Além disso, o pastor acredita que a frase “o reino virou negócio” da música “Evangelho de Fariseus” podia impedir fiéis de dizimarem, o que afetaria o mantimento de comunidades cristãs.

Contudo, diversos famosos saíram em defesa das crianças da Ilha do Marajó. Uma deles foi Juliette, ex-BBB e cantora, publicou sobre o assunto no X, antigo Twitter. “Marajó tem o menor Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil e há um grande esquema de tráfico humano e prostituição infantil na ilha”, publicou. “Nós clamamos aos políticos, autoridades e órgãos públicos, ações e respostas.” 

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